ETFs de criptos amargam prejuízo em pior momento desde estreia na B3, mas ainda não perdem cotistas

Com novos fundos chegando ao mercado, desafio está em educar o investidor, evitar a canibalização e afastar guerra de taxas

Katherine Rivas

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Os ETFs de criptomoedas completaram seu primeiro aniversário recentemente. A comemoração, no entanto, não está ocorrendo exatamente da maneira como os investidores gostariam.

Devido à queda generalizada dos ativos digitais nas últimas semanas, nenhum dos fundos de índices de criptomoedas listados até abril na Bolsa brasileira apresenta retorno positivo desde que estreou no mercado.

Segundo dados da Comdinheiro, as quedas acumuladas pelos fundos de índice da categoria vão de cerca de 10% até mais de 68%, considerando o período desde a estreia das carteiras até o pregão de quinta-feira (12).

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Quem comprou cotas do ETF HASH11 – primeiro ETF de criptomoedas listado na B3 – no dia em que começaram a ser negociadas (26 de abril de 2021) viu o valor aplicado despencar 51,13%.

O HASH11 só foi listado após a terceira mudança regulatória da Bolsa. No passado, as primeiras alterações no regulamento de listagem dos ETFs permitiram a criação de fundos de índices de renda fixa e de fundos imobiliários.

Os ETFs de criptomoedas se popularizaram rapidamente entre os investidores, principalmente pessoas físicas. Com apenas nove meses de existência, o HASH11 desbancou o tradicional BOVA11, que replica o índice Ibovespa, tornando-se o segundo maior ETF em número de cotistas na B3. Em um ano, o fundo quintuplicou a sua base de cotistas, chegando a 152.688 investidores.

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Nesse um ano de história, outros ETFs se juntaram ao primeiro. Confira o desempenho de todos eles na tabela abaixo:

ETF Data da estreia  Retorno acumulado desde a estreia
HASH11 26/04/2021 -51,13%
QBTC11 23/06/2021 -10,43%
QETH11 04/08/2021 -29,99%
BITH11 05/08/2021 -30,40%
ETHE11 18/08/2021 -38,38%
QDFI11 08/02/2022 -68,18%
DEFI11 17/02/2022 -51,43%
WEB311 30/03/2022 -51,63%
NFTS11 04/04/2022 -66,00%

Fonte: Comdinheiro. Considera os ETFs de criptomoedas listados na B3 até abril de 2022. Dados de retorno até 12/05/22.

O movimento ladeira abaixo – puxado principalmente pelo cenário macroeconômico, com inflação elevada, juros subindo e a renda fixa oferecendo retornos maiores – acabou levando a algumas gestoras a se comunicar com os seus investidores.

A Hashdex, responsável pela gestão de cinco ETFs de criptoativos, enviou uma carta sobre o momento ruim do mercado. Em alguns trechos do material, obtido pelo InfoMoney, o head de research Carlos Eduardo Gomes e o gestor João Marco Cunha explicaram os motivos que levaram os criptoativos a entrar em uma trajetória de queda “consistente e acentuada”.

Entre os principais, eles destacaram o cenário macroeconômico desafiador, com a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, a expansão dos balanços dos bancos centrais nos últimos anos, o aumento da inflação global, o avanço das taxas de juros e a restrição nas cadeias de suprimentos globais.

“Esse cenário pode levar, momentaneamente, a uma redução da exposição a ativos de risco em busca de ativos considerados mais seguros”, afirmou Gomes. Ele aponta que, desde o início da pandemia, os criptoativos passaram a apresentar uma correlação maior com os mercados tradicionais, por boa parte do seu valor estar atrelado à geração de serviços descentralizados no futuro.

Gomes avalia que é natural que os criptoativos apresentem uma maior correção do que os ativos tradicionais. “Esse fenômeno pode estar sendo potencializado pela entrada de mais investidores institucionais no mercado de criptoativos”, completa.

Além dos fatores macroeconômicos, a gestora atribuiu o período ruim da indústria à derrocada de uma das principais blockchains do ecossistema – a Terra (LUNA) que perdeu mais de 99% do seu valor de mercado em uma semana.

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A gestora QR Asset também enviou um comentário ao InfoMoney. Nele, o diretor de investimentos, Alexandre Ludolf, destacou que os cotistas precisam estar atentos para a diferença de qualidade e entender os regimes de incentivos por trás de cada projeto.

“No caso do projeto Terra/Luna a máxima ‘não existe almoço grátis’ se mostrou verdadeira e o projeto colapsou. Hoje temos um cenário de contágio no mercado, então podemos esperar muita volatilidade até encontrarmos um novo ponto de equilíbrio”, afirmou.

Ludolf também esclareceu que a adoção dos criptoativos permanece em curso, apesar de um cenário desafiador. “Investidores com horizontes de longo prazo podem se aproveitar dos preços deprimidos para conseguir bons pontos de entrada”, apontou. Atualmente a QR Asset é responsável por três ETFs de criptomoedas listados na B3.

Sem fuga de investidores, por enquanto

Apesar do cenário desafiador, nenhum dos nove ETFs de criptomoedas sofreu perdas expressivas de investidores até o mês passado. Segundo o último boletim mensal da B3, praticamente todos os ETFs da categoria ganharam novos cotistas entre março e abril. Apenas o QETH11, da gestora QR Asset – que replica o desempenho da criptomoeda Ethereum – teve redução de cotistas, mas apenas 33.

Ludolf, da QR Asset, afirmou ao InfoMoney que este movimento de poucos resgates se deve ao amadurecimento da indústria de ETFs de criptomoedas. Na visão dele, o investidor brasileiro começou a entender as fortalezas e vantagens dos fundos de índices focados em cripto em relação aos investimentos não regulados.

“Apesar do cenário não estar benigno, a gente vê o preço caindo e todas as questões macroeconômicas, e os ETFs de criptomoedas foram uma das poucas classes de ativos que aumentaram em número de investidores”, destaca.

Roberta Antunes, chefe de expansão na Hashdex, comenta que a sensação é de que as pessoas não estão se mexendo no mercado – ninguém entra e ninguém sai. O que mudou foi o entendimento do investidor sobre o que é a tecnologia dos criptoativos.

“Não acho que o que vai trazer as pessoas para o mercado de criptomoedas seja o seu momento ou as variações macro, e, sim, a educação sobre a tecnologia”, avalia. Segundo Roberta, a evolução dos ETFs está atrelada ao fato de os investidores entenderem para que servem e que, em algum momento, as criptos vão gerar valor.

Ela admite uma certa dificuldade de atrair o investidor em um cenário de aversão ao risco – muito embora, justo agora, existam ativos descontados. Ela compara o momento atual a uma Black Friday.

Se nas lojas os consumidores não perdem uma liquidação, no mercado de ETFs de criptomoedas a realidade é diferente. “Estamos em uma Black Friday de cripto, os fundamentos não mudaram, a adoção da tecnologia só aumenta, mas não conseguimos convencer as pessoas de continuar investindo. Elas estão receosas”, aponta.

As teses que mais atraem investidores

Dentre os dez ETFs listados atualmente na B3, as teses de investimentos – e outras características, como as taxas de administração – são variadas. Confira a lista de fundos já disponíveis abaixo:

ETF Taxa de administração Captação Líquida em 2022 Patrimônio Líquido (PL)
HASH11 1,30%                 R$ 173.803.261,76     R$ 1.338.231.618,11
BITH11 0,70%                 R$ 122.929.467,79        R$ 196.618.721,72
CRPT11 0,75%                  R$ 65.031.200,00          R$ 51.922.848,95
DEFI11 1,30%                   R$ 52.812.566,26           R$ 22.514.152,32
QDFI11 0,90%                   R$ 50.972.710,57          R$ 22.622.071,43
ETHE11 0,70%                   R$ 39.831.603,75         R$ 100.747.565,23
NFTS11 0,75%                  R$ 20.044.638,57             R$ 6.794.425,20
QBTC11 0,75%                    R$ 3.905.270,09         R$ 143.136.370,02
WEB311 1,30%                             –           R$ 16.821.662,35
QETH11 0,75%                  R$ 309.647,20         R$ 110.441.902,54

Fonte: Teva Índices. Captação líquida entre os dias 04/01/2022 e 12/05/2022. PL no dia 12/05/2022.

Atualmente, a Hashdex é responsável pela gestão de cinco ETFs de criptomoedas.

O HASH11 concentra 78% dos cotistas da Hashdex. A razão, segundo Roberta Antunes, é que o fundo nasceu para garantir uma exposição geral ao mercado de criptomoedas, uma espécie de índice S&P 500 do universo cripto. Com a evolução do mercado, foram surgindo teses setoriais.

O ETHE11, com exposição a Ethereum, ganhou destaque e, em abril de 2022, reunia 13.570 cotistas. Já o ETF de Bitcoin (BITH11) tinha 12.938 cotistas no mesmo mês. Ambos chegaram à Bolsa em agosto de 2021. Dada a alta concentração de Bitcoin no HASH11, diz Roberta, os investidores não encontravam sentido para se expor apenas ao BITH11.

Neste ano, a gestora lançou teses setoriais, com um ETF de finanças descentralizadas (DEFI11) e outro de contratos inteligentes (WEBB3). Hoje, eles possuem 3.729 e 1.590 cotistas respectivamente. São ETFs, segundo Roberta, que devem se beneficiar no longo prazo, embora no curto ainda sofrem com a aversão ao risco.

As esperanças de repetir um sucesso semelhante ao do HASH11 recaem agora sobre um novo ETF, que será o sexto da Hashdex, focado em metaverso. O META11 está previsto para estrear em junho. “Fiquei surpresa pela demanda, o META11 tem um apelo popular”, destaca.

O META11 vai replicar o índice CF Digital Culture Composite Index e investir em dez ativos considerados promissores no metaverso. Na cesta há tokens como Decentraland (MANA), The Sandbox (SAND), Axie Infinity (AXS), Enjin (ENJ), Chiliz (CHZ) e Audius (AUDIO).

Investidores preferem produtos “tradicionais”

Em cenários de aversão ao risco, como o atual, os investidores parecem se sentir mais confortáveis com teses “tradicionais” do mundo cripto, e menos com as temáticas.

Ludolf, da QR Asset, destaca que este movimento também aconteceu nos três ETFs da gestora, focados em Bitcoin, Ethereum e finanças descentralizadas.

O principal ETF da gestora é o de Bitcoin (QBTC11), que reunia 39.028 mil cotistas até abril. Segundo Ludolf, o fundo conseguiu se destacar frente ao BITH11 por conta de uma taxa de administração mais barata no lançamento – movimento que levou o concorrente a reduzir os custos depois – além de ter sido pensado sob a ótica do investidor institucional, travando o preço do Bitcoin.

Pesa também o conhecimento do investidor e dos assessores de investimentos na hora da procura. Ele relata que a maioria está mais familiarizada com o Bitcoin do que com Ethereum ou finanças descentralizadas. O risco também impacta na hora da escolha. Em contrapartida, entre investidores institucionais, a preferência tem sido maior pelo ETF de Ethereum.

Em um cenário macroeconômico desafiador, Ludolf apontou que a gestora está favorecendo Bitcoin e Ethereum em detrimento de projetos de menor capitalização e tecnologias ainda não provadas, que podem ter maiores dificuldades nos próximos meses.

“Agora é hora de concentrar a alocação em projetos perenes e sólidos que resolvem problemas reais”, destaca. Embora reconheça que finanças descentralizadas é uma tese promissora, ele destaca que no curto prazo o segmento tem sofrido com os problemas recentes nas stablecoins.

A gestora ainda observa outros segmentos para lançamentos, quando o mercado se recuperar. Teses relacionadas a metaverso, Web3 e a possibilidade de ter ETFs de gestão ativa integram os planos da gestora.

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Amadurecimento dos investidores

O que passa pela cabeça dos investidores de ETFs de criptomoedas diante das perdas recentes? Sueli dos Santos, que começou a investir no HASH11 em novembro do ano passado, conta que sentiu um certo receio com a queda de mais de 50% do fundo. Contudo, o fato de ter comprado poucas cotas e de ter um objetivo de investimento de longo prazo lhe permitiram manter a calma.

“Na verdade, com o recuo, dá até vontade de comprar mais. Eu vejo a queda do HASH11 como uma oportunidade”, afirmou.

Já o investidor Lucas Reis tem mais experiência no mercado de criptoativos e um perfil de investidor mais arrojado. Ele afirma que quando comprou o HASH11, na estreia, estava pronto para as oscilações futuras do mercado. “O que me deixa pouco tranquilo é a falta de dinheiro para aproveitar esta situação e comprar mais cotas”, destaca.

Lucas também avalia que faltam opções para diversificar em criptomoedas nos ETFs da B3. Ele ainda não encontrou ETFs para um perfil de risco maior e aponta que faltam mais alternativas baratas para o investidor iniciante.

Falta de dinheiro novo e canibalização: os desafios dos ETFs de cripto

O relato do investidor Lucas revela um dos desafios dos ETFs de criptomoedas: a indisponibilidade de dinheiro dos investidores no curto prazo pode acabar canibalizando o segmento, avalia Ludolf, da QR Asset.

Ele acredita que o mercado de ETFs de criptomoedas parece ter ficado saturado. A canibalização acabaria tirando recursos de um ETF para aportes em outro. “Investidores do nosso ETF de Ethereum saíram e compraram o nosso ETF de finanças descentralizadas”, explica.

Com novos concorrentes chegando à indústria, Ludolf acredita que este será o grande teste do mercado: encontrar novo dinheiro, e não investidores que pulam de ETF em ETF.

A chegada de novos fundos também pode provocar uma guerra de taxas. Em abril deste ano, a gestora Investo acabou entrando na indústria cripto, com o lançamento do ETF NFTS11, que reúne criptomoedas do setor de mídia e entretenimento das plataformas do metaverso. Aparentemente, pode não ser o único ETF cripto da gestora.

“Nosso plano é simplificar o acesso ao investidor para todas as classes de ativos, incluindo mais alternativas de investimento em cripto”, apontou Cauê Mançanares, CEO da Investo, ao InfoMoney.

Na quinta-feira (12), a gestora Vitreo, lançou o ETF CRPT11, que oferece exposição a uma cesta com 20 criptomoedas de maior valor de mercado. O ETF segue o índice Teva Criptomoedas Top20 e tem uma estratégia muito semelhante a do HASH11.

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Katherine Rivas

Repórter de investimentos no InfoMoney, acompanha ETFs, BDRs, dividendos e previdência privada.