Conceito de bolha ainda é novo, o que dificulta identificá-la, diz especialista

Colunista acredita que as pessoas devam encarar com mais humildade a possibilidade de bolhas

Leonardo Pires Uller

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SÃO PAULO – Bolha de ações,  de títulos, bolha de ouro, uma nova bolha no mercado imobiliário, bolha da Bitcoin, uma bolha das mídias sociais e muitas outras. Nos EUA muitos especialistas discutem, atualmente, uma série de possíveis bolhas em diversos mercados. Contudo, a palavra “bolha” sequer existia em textos de economia há 20 anos.

Por isso, o analista e colunista do site Motley Fool, Morgan Housel,  questiona como algo que nem se falava antes dos anos 1990 subitamente se infiltrou em toda a economia global. Segundo ele, o fato de o tema não ter sido abordado durante este período é parte do problema. O conceito de bolha é tão novo que sua definição ainda não está perto de um consenso. Sem essa definição, qualquer pessoa pode pessoalmente apontar qualquer coisa que quiser como uma bolha e fazer um argumento convincente a respeito.

Robert Shiller, um dos ganhadores do prêmio Nobel de Economia desse ano por seu estudo sobre bolhas, fez uma lista com os principais sintomas de uma bolha:

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– Um período de rápido aumento de preços;

– Pessoas contam umas às outras histórias que tentam justificar as razões da bolha;

– Pessoas contam umas às outras histórias da quantidade de dinheiro que estão fazendo;

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– Pessoas sentem inveja e se arrependem por não terem participado;

– A mídia está envolvida.

Mas, da mesma forma que algumas pessoas dizem que doenças mentais são diagnosticadas com exagero, muitos mercados financeiros podem se encaixar nessa lista sem ser uma bolha.

O colunista cita a Microsoft como exemplo. No início dos anos 1990, seus papéis eram negociados a um valor de US$ 0,89, após um desdobramento.

Um tempo de rápido crescimento de preços? Sim. Ações aumentaram de valor oito vezes de 1985 a 1990. Histórias para justificar a razão da bolha? Sim. “Superchips proclamam uma revolução”, escreveu o The New York Times em 1984. Histórias sobre o quanto de dinheiro as pessoas estavam fazendo? Sim, a revista Fortune escreveu uma matéria em 1986 com a manchete “O negócio que rendeu US$ 350 milhões a Bill Gates”.

Inveja por não participar? Sim. Um de cada cinco empregados da Microsoft era milionário em 1992, “muitos antes dos 30”, segundo um artigo de jornal. É possível imaginar como os novo empregados se sentiam. Envolvimento da mídia? Sim. O computador pessoal foi escolhido a pessoa do ano pela revista Time em 1982.

Todos os critérios de Shiller foram preenchidos. Mas as ações da Microsoft no começo dos anos 1990 não era uma bolha. Ao contrário, era uma barganha incrível. Qualquer um que comprou uma ação da empresa em 1990 teve um retorno desde então na cada de 4900%, contra 730% do S&P 500. O que parecia uma bolha era literalmente o oposto disso.

O mesmo aconteceu com diversas empresas em um passado recente: Amazon, Google, Netflix e Apple são alguns dos exemplos. No entanto, ao mesmo tempo, todos sabem que bolhas existem, como as empresas tecnológicas em 2000 que foi simplesmente irracional.

No entanto, isso é visto em retrospectiva. E, nessa perspectiva, tudo parece óbvio, mas na época não era tão claro assim, afirma o colunista. Eugene Fama, economista da Universidade de Chicago que ganhou o prêmio com Shiller, afirma que uma bolha simplesmente não pode ser prevista e, com isso, as pessoas não podem dizer que elas existem.

Para Morgan Housel, existem dois grandes problemas no debate sobre bolhas. O primeiro é que mesmo que se identifique uma bolha, é difícil saber o que fazer com elas. A maioria das pessoas que procuram bolhas não está satisfeitas em apenas evitá-las e tentam apostar contra elas. Mas isso pode ser mais perigoso do que cair nela.

Segundo: dados econômicos em tempo real geralmente são substancialmente revisados. Os dados podem dar uma informação que parece uma bolha em um dia e passar uma imagem completamente diferente no dia seguinte, com a revisão de números. O que também é verdade para relatórios financeiros de companhias e estudos acadêmicos.

Qualquer pessoa que acompanhe a economia deve ter uma mente aberta e flexível. Mas aqueles que têm certeza que algo é (ou não) uma bolha costumam fazer o oposto. Eles se convencem e tratam argumentos contrários ao seu diagnóstico inicial como uma batalha contra seu lado.

Se a história das bolhas ensina alguma coisa às pessoas é que elas devem ser humildes. Muitos comentaram sobre Shiller e Fama dividirem o mesmo prêmio, uma vez que eles possuem crenças opostas. Mas ambos possuem um denominador comum: eles dois defendem a humildade. Fama não acredita que seja possível prever bolhas. Shiller acredita que sim, mas não acredita que seja possível saber quando elas vão estourar. O que as pessoas precisam, segundo o colunista, é mais desse tipo de pensamento.