Como Bolsonaro (e não Lula) tornou-se hoje o maior adversário do PSDB nas eleições?

Risco de fragmentação à direita e à esquerda provoca disputas anteriores à própria polarização entre tucanos e petistas

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Apesar do histórico eleitoral recente condicionar as análises sobre a disputa presidencial em uma possível reedição do tradicional duelo entre PT e PSDB em um segundo turno, o quadro nebuloso do atual pleito revela outras disputas precedentes, importantes na consolidação das candidaturas desses partidos. Hoje, o risco de fragmentação para a direita e para a esquerda são muito maiores do que nas últimas corridas ao Palácio do Planalto, o que pode ameaçar a hegemonia das duas siglas que protagonizaram a batalha política em nível nacional.

Em entrevista concedida à jornalista Mônica Bergamo, do jornal Folha de S.Paulo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva reiterou aposta na polarização entre petistas e tucanos nesta eleição presidencial. Segundo ele, “pela direita, ninguém será presidente sem o apoio dos tucanos. Pela esquerda, ninguém será presidente sem o PT”. O líder nas pesquisas, que cada vez mais corre riscos de ser impedido de participar da disputa devido ao enquadramento na Lei da Ficha Limpa, acredita que “a disputa deverá ser outra vez entre tucanos e PT”.

Contudo, parece que há outras preocupações para os dois partidos antes de uma possível reedição da polarização nas disputas nacionais. Atualmente, diversos analistas apontam para os riscos de uma multiplicidade de candidaturas na centro-direita pró-reformas econômicas. Embora as novas regras eleitorais ajudem a diminuir os incentivos para a apresentação de uma ampla gama de nomes, a inexistência de uma candidatura consolidada neste campo estimula o teste de muitos que sonham chegar à presidência da República. Se na centro-direita não há nomes que mostrem solidez nas pesquisas de intenção de voto, a hora é agora para novos testes. E isso pode se arrastar por mais tempo.

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Do lado da esquerda, a maior possibilidade de Lula não disputar as eleições gera uma janela de oportunidade para outros candidatos tentarem furar a hegemonia dos últimos anos. Aos poucos, o mesmo risco de fragmentação também começa a se manifestar deste outro lado do jogo. Tudo isso revela que, antes da repetição da polarização que se tornou tradicional nas últimas eleições presidenciais, PT e PSDB terão de consolidar candidaturas, o que, ao contrário de em outros momentos, ainda não está posto.

Pela esquerda, convém lembrar outro ponto da entrevista de Lula à Folha de S.Paulo. Enquanto surgem especulações sobre uma ainda remota possibilidade de o PT abrir mão de uma candidatura própria para apoiar outro partido, o ex-presidente deu alfinetadas em seu ex-ministro Ciro Gomes, que deverá participar da disputa pelo PDT. “Eu não ando vendo o que o Ciro tá falando porque ele anda falando demais. O Ciro ou vai para a direita ou não pode brigar com o PT. Eu fico fascinado de ver como uma pessoa inteligente como o Ciro fala tão mal do PT. Não consigo entender. Vamos ser francos: pela direita, ninguém será presidente sem o apoio dos tucanos. Pela esquerda, ninguém será presidente sem o PT”, disse o petista. O candidato pedetista sabe que suas chances de ir ao segundo turno crescem sem Lula na disputa. Os dois disputam votos na esquerda. Ou seja, em certa maneira, Ciro Gomes pode roubar uma fatia do eleitorado petista.

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À direita, o cenário pode parecer mais dramático neste momento sob o ponto de vista da fragmentação. Hoje, o deputado federal Jair Bolsonaro lidera com folga as pesquisas eleitorais na ausência de Lula. Alckmin pontua abaixo dos 10%, assim como qualquer nome da centro-direita hoje considerado (Henrique Meirelles, Rodrigo Maia ou o próprio presidente Michel Temer). Enquanto o governador de São Paulo não empolga minimamente o eleitorado, o fantasma da fragmentação continuará assombrando sua candidatura. Ou seja, antes de querer polarizar com o ex-presidente, embora essa estratégia possa ajudar no crescimento eleitoral (como ocorreu com Bolsonaro, de certa maneira), o tucano precisará resolver as coisas em seu campo político.

Conforme mostrou o Instituto Paraná Pesquisas em levantamento divulgado nesta semana, considerando a margem de erro de 2 pontos percentuais para cima ou para baixo, a corrida presidencial em São Paulo tem um empate técnico entre Jair Bolsonaro e Geraldo Alckmin. Enquanto o deputado federal pontua entre 22,3% e 23,5%, a depender do cenário considerado, o governador tem de 20,1% a 23,2% dos votos em seu próprio colégio eleitoral. Na prática, o que a pesquisa mostra é que o tucano perdeu eleitores mais à direita para o ex-capitão do Exército. E este não é um diagnóstico novo.

Nesta semana, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso questionou o fato de Bolsonaro tentar se associar a uma imagem de “liberal” após escolher o economista Paulo Guedes para montar seu programa econômico. “É muito difícil que alguém se apresente como putamente reacionário — que não é liberal, é reacionário — ganhe”, afirmou durante seminário organizado pelo jornal O Estado de S. Paulo. Para ele, o deputado federal não possui alinhamento ao pensamento liberal, e “simboliza o autoritarismo em função do medo que tem aqui” e “aparece como uma força de quem quer ordem”. “Não sei se até tem pensamento”, complementou o tucano. O parlamentar respondeu em sua conta no Twitter: “FHC é tão obstinado pela liberação das drogas que teve seu cérebro, se que ainda tem, deslocado para o intestino grosso”.

Para o analista de cenários Leopoldo Vieira, da Idealpolitik, o tucano busca manter o deputado na extrema direita, dificultando sua marcha ao centro, em direção a outras faixas do eleitorado de Alckmin. “FHC agirou o espantalho do extremismo para seduzir posições à esquerda do centro e alavancar o sentimento de ‘todos contra o mal maior'”, afirmou. Ele acredita ainda que a resposta dada por Bolsonaro também atende uma estratégia eleitoral efetiva.

“Para ambos, a disputa entre si compensa. O xis da questão é em proveito de quem FHC se posiciona desta maneira. No de Alckmin, com sua recente retórica privatizadora extensiva, é que não é. E pode-se dizer qualquer coisa do patrono da estabilidade da moeda, mas tê-lo jogando contra é mais uma corrente atada ao calcanhar do governador de SP em sua tentativa de decolar e ser competitivo de verdade”, avaliou.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.