O que é a “regra de ouro” que impactou o mercado (e que já ameaça muito o próximo presidente)

Governo está buscando flexibilização dessa regra, uma das principais  para garantir o equilíbrio das contas públicas e que revela um problema muito mais profundo da economia brasileira

Lara Rizério

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SÃO PAULO – O rali do Ibovespa do começo do ano parecia não ter fim – mas algo foi capaz de finalmente conter a euforia do índice: a realidade fiscal no Brasil. A proposta costurada pelo governo Michel Temer de mudança a chamada “regra de ouro” impactou o mercado brasileiro, que estava “surfando” na onda positiva internacional. 

Mas afinal, o que é a “regra de ouro”? Ela é um mecanismo, utilizado também em outros países, usado para equilibrar as contas públicas, formando uma “tríade” com a fixação da meta fiscal e o teto de gastos. A regra de ouro proíbe que o governo faça operações de crédito – empréstimos – para bancar despesas correntes, como é o caso de custeio da máquina pública. 

Os déficits recorrentes e explosivos estão levando à dificuldade para cumprir a regra. Num primeiro momento, para tentar solucionar o problema, o governo pediu ao BNDES a devolução de R$ 180 bilhões de empréstimos repassados pelo Tesouro: contudo, integrantes do banco de fomento vêm apontando dificuldades para uma operação desta magnitude por temor de que ela comprometa a capacidade do banco de realizar empréstimos. 

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O curioso é que Temer busca a flexibilização da “regra de ouro”, que está prevista na Constituição, também para escapar de ser responsabilizado pelo descumprimento da norma. O descumprimento pode levar o presidente e a equipe econômica a cometerem crime de responsabilidade fiscal, passível de impeachment – Temer não estaria tão ameaçado com o impedimento, já que seu mandato termina esse ano, mas poderia ser enquadrado mesmo fora do cargo. Já para o próximo governante, a situação ficaria ainda mais complicada, tornando uma verdadeira “batata quente” logo em seu primeiro ano de governo.

De qualquer forma, para um governo que foi alçado ao poder em meio ao impedimento de Dilma Rousseff por conta das “pedaladas fiscais”, uma mudança nessa regra mostra que a equipe econômica tem registrado muitas dificuldades em promover os ajustes prometidos no começo do governo Temer, em maio de 2016, e que animaram tanto o mercado.

A proposta de flexibilização poderá ser incluída numa espécie de “super PEC” com 27 medidas para retirar as amarras do Orçamento e dar mais liberdade de gestão das despesas e receitas do governo e foi discutida na véspera entre  Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Meirelles, ministro da Fazenda, e Dyogo Oliveira, do Planejamento. Além de dar mais liberdade em um ano eleitoral, claro, evitaria que Temer fosse responsabilizado na reta final do seu governo. 

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A pedido de Maia, a proposta está sendo desenhada pelo deputado Pedro Paulo (PMDB-RJ) e daria liberdade ao governo de não cumprir a regra de ouro por alguns anos. Em troca, há uma série de contrapartidas para se enquadrar na norma, como medidas para reduzir despesas obrigatórias.  

Enquanto isso, informa o Estadão, o ministro Henrique Meirelles defende a ideia de que a mudança na regra de ouro seja feita por medidas autocorretivas, aos moldes da emenda constitucional que criou o teto de gasto. Se não houver o cumprimento da regra, são acionados “gatilhos” com medidas corretivas que permitem que a regra possa ser cumprida depois.

Problema mais profundo

Mas, mais do que a questão de curto prazo e de enquadramento de Temer em crime de responsabilidade, a flexibilização da proposta mostra um problema muito mais profundo para o Brasil: que a situação fiscal do País é muito preocupante. 

O governo calcula que não conseguirá economizar para pagar os juros da dívida pública até 2020, somando sete anos seguidos no vermelho. Para 2019, a previsão é de rombo primário de R$ 139 bilhões para o governo central (governo federal, Banco Central e INSS), seguido de outro de R$ 65 bilhões em 2020.

A urgência na mudança foi explicitada por Rodrigo Maia, que disse na noite de quinta-feira ser “inevitável” flexibilizar a “regra de ouro” das contas públicas porque não será possível cumpri-la em 2019.  Segundo ele, os dados orçamentários mostram “com clareza” que os recursos de investimentos “caíram muito” e os gastos de custeio e pessoal “explodiram”. 

Em entrevista à Bloomberg, Daniel Cunha, estrategista-macro da XP Securities em Nova York, afirmou que Maia está sendo realista e antecipando possível necessidade de se flexibilizar a Regra de Ouro, obrigando o mercado a entrar em contato com a realidade fiscal, que segue preocupante. “A eleição consumirá grande parte, se não todo o foco de 2018. Independente de quem vença, o mercado já tem um encontro marcado com 2019, onde dificilmente as métricas estabelecidas pela Regra de Ouro e pelo teto de gastos serão obedecidas na íntegra. A depender de uma combinação de quem será o próximo presidente e do cenário externo, podemos ter níveis de preços [nos mercados] bem diferentes dos atuais”, afirmou. 

Desta forma, a necessidade de reformas estruturantes é cada vez maior, ao mesmo tempo em que o cenário está cada vez mais desafiador para aprová-las em 2018, ano eleitoral. 

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.