Por que o Lula de 2018 não será nada parecido ao “pró-mercado” de 2002 – e sua carta sinalizará isso

Nada será como antes na relação entre o ex-presidente Lula e o mercado 

Lara Rizério

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SÃO PAULO – Falta pouco menos de um mês para 2018 começar, mas o mercado já tem um grande temor para o ano que vem: a possível volta do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Palácio do Planalto. 

Afinal, mesmo condenado em primeira instância pelo juiz Sérgio Moro, já há algumas teses de que ele possa concorrer mesmo se a sentença for confirmada pelo TRF de Porto Alegre. Soma-se a isso o fato de que ele vem liderando as últimas pesquisas eleitorais mesmo com diversos processos nas costas. A última pesquisa Datafolha mostrou que o  candidato petista obtém 34% e 37% dos votos em distintos cenários, bem à frente de Jair Bolsonaro, que também gera certa desconfiança dos mercados, apesar dos recentes acenos ao mercado (confira clicando aqui). 

Porém, é o petista aparece praticamente como “pesadelo” dos investidores, principalmente por suas falas um tanto exacerbadas em que defende a revogação das medidas de ajuste fiscal do atual governo Michel Temer e que usaria até mesmo os recursos das reservas internacionais para reanimar a economia brasileira.

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Neste sentido, pesquisa divulgada no fim de novembro pela XP Investimentos com investidores institucionais apontou que um cenário com Lula eleito presidente seria o pior para os mercados, com a bolsa em forte queda e o dólar em disparada (veja mais clicando aqui)

Lula 2003 X Lula 2019

Se por um lado, se havia quem visse o copo meio vazio, havia também aqueles que avistavam o copo meio cheio. Afinal, se lembrarmos de 2002, haveria sim motivos para o mercado ter esperança. Naquele ano, Lula era visto com grande temor pelos mercados, o que levou a uma forte baixa da bolsa e fez o dólar chegar aos R$ 4. Porém, conforme a sua candidatura começou a ganhar musculatura, o então candidato buscou aproximação com os mercados através da “Carta ao Povo Brasileiro”, em que mostrou uma faceta mais moderada do ex-sindicalista e acenou para o mercado. 

Os jornais do fim de semana, inclusive, destacaram que o ex-presidente está em busca de fazer uma nova carta aos brasileiros. Porém, ao contrário de 2002, não há motivos para ela ser tão bem vista pelos investidores. 

Sim, Lula quer fugir do rótulo de populista e reafirmar seu compromisso com a responsabilidade fiscal. Mas o seu maior foco será para a classe média, fatia do eleitorado que precisa ser reconquistada por ele após o forte desgaste em meio à crise econômica observada durante o governo Dilma Rousseff e também por conta da Operação Lava Jato.

Assim, os sinais que ele deve emitir para o ano que vem devem ser um tanto contraditórios. Se por um lado, ele aponta que o mercado faz “terrorismo” com a sua candidatura por outro, o foco maior “no povo” deve reforçar os temores dos investidores. Conforme destacou o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, estão em estudo a revogação das medidas elaboradas pelo governo Temer e que tanto animaram os mercados desde que o impeachment de Dilma foi concretizado. Assim, não há como o “mercado se animar”. 

Com o petista tentando se voltar para a sua base e conter o desgaste, o cientista político da Tendências Consultoria, Rafael Cortez, ressalta: “há diferenças importante do Lula de 2002 com o de hoje. Ele pode até ter os mesmos atributos de eleitorais de antes, mas o momento político e os desafios de governança são bastante distintos”.

Desta forma, sendo imperativo reconquistar a sua base aliada, mesmo ele publicando uma carta moderada, caso ela mostre oposição às políticas do governo, será taxada como “radical”. Para o analista político, a única forma de Lula sinalizar para uma agenda mais pró-mercado seria apoiar as atuais políticas do governo, o que não irá acontecer. Conquistar os investidores, aliás, não será uma prioridade para o ex-presidente já que, como o próprio diz, o “mercado não vota”.

“A sinalização pró-mercado que ele dará será relembrar o passado, o quanto o seu governo anterior foi bom para o mercado. Mas os investidores olham para o futuro e veem que as mesmas condições não estão postas”, avalia Cortez.

De qualquer forma, um fator determinante para definir se a estratégia de Lula dará ou não certo virá do próprio governo – ou seja, se o timing da recuperação da economia se dará de forma suficiente expressiva para que a classe média compre o discurso do ex-presidente ou se a população verá com melhores olhos um candidato governista. 

Paralisia se Lula for eleito, mas riscos continuam sem ele…

A forte desconfiança acontece em momento em que as movimentações que Lula um dia fez no passado são mais complicadas de serem feitas, o que deve ser evidenciado com ainda força se ele for eleito para ocupar a presidência em 2019, aponta Cortez. Caso consiga reverter a decisão contra ele em segunda instância e seja alçado presidente ano que vem, a sua eleição deverá gerar uma forte polarização política.

Além disso, se a reforma da previdência não passar no atual governo, ele chegaria ao poder com uma agenda bastante pesada para 2019 – e que acentuaria cada vez mais a “contradição” de Lula. 

Isso porque, ou ele teria que fazer a sua própria reforma da previdência (levando ao chamado “estelionato eleitoral”) ou ele teria que reverter a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) do teto de gastos. A PEC do teto não seria algo que o governo simplesmente não poderia não cumprir e, caso seja “estourada”, geraria expressivas restrições orçamentárias. Uma alternativa seria revogá-la, o que aumentaria e muito a aversão ao risco do mercado.

Além disso, ambas as propostas (ou para serem aprovadas ou revogadas) teriam que contar com uma maciça aprovação do Congresso de 308 votos, o que seria particularmente complicado em um cenário em que o PT deve sair com uma base menor e teria que fazer aliança com outros partidos que não sejam do espectro de esquerda para governar. Com muitas pontes queimadas, Lula pode encontrar dificuldades para conseguir apoio caso vire novamente presidente. 

Isso leva a mais uma “contradição” do ex-presidente. Se no curto prazo, a estratégia do “pior melhor” para o governo Temer seria a mais positiva, incluindo a não aprovação de reformas, para o médio prazo, seria mais positivo que o atual governo aprove as medidas de ajuste fiscal, para que a agenda legislativa para 2019 não ficasse ainda mais conturbada. Assim, Lula não teria que passar por uma reforma da previdência após ter ido contra ela durante a campanha. 

Mesmo sem Lula…

Lula apresenta o maior risco, o mercado sinaliza. Contudo, será que o cenário é sem riscos sem ele? Para Cortez, não. Afinal, há uma questão importante sobre se haverá ou não uma fragmentação no centro com Geraldo Alckmin, Henrique Meirelles, Rodrigo Maia, entre outros nomes que possam vir a surgir, gerando uma canibalização do voto. 

Mesma na ausência do Lula, haveria uma volatilidade em meio a esses nomes dissonantes, o que se assemelharia a um quadro parecido à eleição municipal do Rio de Janeiro em 2016 (com Marcelo Freixo e Marcelo Crivella), com o centro fragmentado e a esquerda e a direita sendo representadas no segundo turno, afirma Cortez. Ele ressalta, contudo, que esse mesmo risco  de fragmentação pode ocorrer na esquerda caso Lula não se candidate. 

Com Lula ou sem Lula, prepare-se: a volatilidade deve dar o tom dos mercados em 2018. 

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.