Mudança nos financiamentos foi feita sob medida contra PT, avaliam especialistas

Com a possível decisão de o Congresso aprovar doações empresariais feitas diretamente a partidos para campanhas, cresce a necessidade de o partido rever suas posições e acirram-se conflitos internos

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – A decisão do plenário da Câmara dos Deputados de aprovar, na última quarta-feira (27), a efetivação do financiamento privado de campanhas com doações de pessoas físicas e jurídicas para os partidos políticos pode trazer mais mudanças sobre o sistema político do que se imaginaria em um primeiro momento. Caso passe em primeiro turno no Senado, no segundo turno em ambas as casas e seja sancionado pela presidente da República, Dilma Rousseff, o projeto pode trazer sérias dores de cabeça ao PT.

Isso porque, no mês passado, o partido ensaiou voo solo em direção a uma reforma política interna ao anunciar que seus diretórios nacional, estaduais e municipais não receberiam mais doações de empresas privadas. A partir daquele momento, a sigla determinou que o financiamento privado somente seria aceito se fosse feito diretamente aos candidatos. Entretanto, a possível aprovação da emenda impossibilitaria essa opção. Em termos práticos, se os os diretórios decidiram não aceitar mais verbas de grupos privados e a emenda à PEC da reforma política em votação determina que apenas os partidos podem recebê-las, o partido já não poderia mais contar com empresas. Não haveria formas de efetuar doações nos padrões estabelecidos pela lei e pela sigla.

“A regra aprovada parece sob medida contra o PT”, afirmou Lincoln Secco, professor livre docente de História Contemporânea da Universidade de São Paulo e autor do livro “A História do PT” (acompanhe entrevista feita com Lincoln Secco no início do mês). Em sua avaliação, a emenda faz o partido ter que rever posições durante o V Congresso, a ser realizado em Salvador (BA) entre os dias 11 e 13 de junho. “É impossível um grande partido fazer campanha sem recursos de empresas enquanto os outros têm”, argumentou Secco. Trata-se de uma derrota tanto do ponto de vista do cotidiano do fazer política como do lado ideológico, uma vez que o fim do financiamento privado de campanha é uma bandeira clássica entre os petistas.

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Apesar da necessidade de o partido eventualmente recuar da decisão contrária às doações de empresas feitas diretamente a seus diretórios, Ricardo Ribeiro, analista político da MCM Consultores, projeta grandes conflitos entre as correntes internas da sigla. “Tem um problema que é a pressão da base petista que trata de financiamento. Não vai ser fácil reverter essa decisão. Pode haver conflito entre candidatos e filiados”, argumentou. Agora que conquistou um passo importante em direção a uma bandeira histórica, alas mais à esquerda dentro do PT dificilmente aceitariam retroceder. Enquanto isso, políticos mais pragmáticos podem ver suas campanhas praticamente inviabilizadas devido à perda de competitividade com o fim de uma importante fonte de receitas.

Para ilustrar as dificuldades de se fazer uma campanha sem verba privada, Secco lembra que a única vez em que a maioria da arrecadação do partido ocorreu em 1989, ainda com participação das empresas – porém, significativamente menor. “Era outro momento de nossa história política. Acredito que o Partido vá recuar afirmando que continuará lutando pelo fim do financiamento empresarial para todos. Talvez o V Congresso nem delibere e deixe isso para o diretório nacional decidir no próximo ano”, especulou o historiador. Isso já poderia trazer efeitos negativos para o partido quanto às eleições municipais de 2016. Em relação à possível candidatura de Lula em 2018, os especialistas dizem que ainda é cedo para se fazer qualquer prognóstico, no entanto, é pouco provável que ela seja inviabilizada apenas por questão de financiamento.

No mesmo sentido, Ribeiro analisa que muitas mudanças na prática de campanhas mudou ao longo desses 26 anos, sobretudo no que diz respeito aos preços. “As campanhas de todo mundo ficaram mais caras”, observou o analista político. Além disso, as técnicas de arrecadação por doações de pessoas físicas tornaram-se obsoletas na medida em que se investiu pouco nelas. Ficou mais eficiente arrecadar via verba empresarial. “Seria necessário um esforço muito grande para restabelecer esse mecanismo no PT. O custo teria que ser limitado. Sinceramente, não sei como eles vão sair dessa”, concluiu Ricardo Ribeiro.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.