Crise por dentro das instituições

O cenário de crescente instabilidade institucional conspira contra a manutenção da paz social a longo prazo

Francisco Petros

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Há cada vez menos “formadores de opinião” estão a pregar que não há crise institucional no Brasil e que “as instituições funcionam”. Está claro que estamos diante de uma confusa crise das instituições do Estado. Todavia, é preciso que qualifiquemos essa crise atual sob pena de permanecermos com entendimento parcial que, de um lado, impede a reflexão mais apurada sobre o futuro e, de outro, impossibilita ação mais equilibrada em busca de um avanço positivo para o país.

O primeiro aspecto que desejo lançar à reflexão diz respeito à capacidade do Estado de formular normas que organizem a vida política, econômica e social do Brasil. Creio que nesse aspecto o Estado brasileiro persiste, por meio de suas divisões funcionais (o Legislativo, o Executivo e o Judiciário), com capacidade de demonstrar a sua “superioridade normativa”. Não à toa pôde o governo aprovar reformas, tal qual a trabalhista, e agilizar a máquina legislativa para ajustar fiscalmente o Erário. Há inclusive quem louve Michel Temer e seus asseclas como providos de certa e notória “sabedoria política”, outrora tão saudável ao cumprimento dos fins construtivos por meios nem sempre muito republicanos. Aqui não vem ao caso questionar a essas “ilações” para usarmos palavra da moda.

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Essa constatação aparentemente saudável sobre o “imperativo” estatal na criação normativa tropeça em delicado tema que, a meu ver, necessita de maior exploração e detalhamento: a capacidade de impor normas por parte do Estado está crescentemente atentando contra a manutenção da liberdade e a igualdade no longo prazo. Com efeito, a estabilidade das regras e o ajustamento da sociedade e/ou indivíduos quando não cumpridores daquilo que estabelece o ordenamento jurídico está em crescente e perigoso risco. Ou seja, o Estado detentor do Poder soberano ao estabelecer regras acaba implicando a sociedade em crescentes anomalias e ausência de funcionalidade de tais normas. A parte saudável do Estado está sendo carcomida pelo conteúdo anômalo das normas e decisões estatais. O meio destrói o fim. Vejamos.

Cito inicialmente a continuada distorção dos “pesos e contrapesos”, bem como a funcionalidade dos organismos do Estado. A desmoralização do instituto jurídico das delações (“colaborações com a Justiça”) por parte do Judiciário, a construção de perigosa jurisprudência do STF relativa ao aprisionamento de criminosos com elevado poder de organização e influência social, a capacidade de nomeação de atores políticos ligados à atividade criminosa para órgãos de controle, como no caso do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, o questionamento político-jurídico de normas como a “Lei da Ficha Limpa”, a “compra de votos” no Congresso Nacional para a aprovação de medidas, etc. são alguns exemplos evidentes de que a direção social e política que o Estado imprime via a sua soberania jurídica está sob elevado risco.

Alguém poderia argumentar que o que é aqui apontado empiricamente (os fatos) sempre aconteceram. Verdade. Todavia, a estabilidade na relação de poder do Estado no que tange à sua superioridade normativa e a direção que as normas impõem à sociedade nunca estiveram na história brasileira sob tanto risco.

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Normalmente, a distorção na equação “soberania normativa versus ação diretiva” do Estado resulta em crises de enorme potencial destrutivos. Na Europa durante a primeira metade do século XX podemos encontrar os exemplos mais gritantes dos efeitos dessa distorção, destacadamente a República de Weimar, cuja constituição progressista e moderna jamais foi revogada, mesmo quando imperou o nazismo que montava fábricas para matar homens e mulheres.

A ausência de estabilidade jurídica ao sistema político agora leva a incerteza sobre a manutenção da liberdade e da estabilidade social no médio prazo. Note-se que os desequilíbrios do momento são apenas o “aperitivo” do perigo vindouro. Os rompantes criminosos nos morros da Cidade Maravilhosa e o entra-e-sai dos políticos das penitenciárias são apenas prenúncios de instabilidade mais aguda à frente.

Em meio à crise por dentro das instituições teremos em 2018 o pleito eleitoral quase que geral. Elegeremos do Presidente da República até os deputados estaduais. O que se pode verificar nas pesquisas eleitorais é que há imenso “vazio político” no denominado centro partidário. O eleitor brasileiro já demonstrou em inúmeras eleições que o seu voto sempre é destinado ao centro, à busca da estabilidade social, política e econômica. Sempre que o eleitor encontrou promessas de estabilidade contra visões de “rupturas” a opção sempre foi a favor da moderação. Ocorre que o povo sempre foi mais sábio que os políticos, esses sim os que radicalizaram de lado a lado em muitas ocasiões– Collor é o melhor exemplo.

Lula somente alcançou o Poder quando emitiu sinais de aggiornamento e moderação, figurativamente o “Lula paz e amor”. Senão, o governo não teria lhe ocorrido.

Pois bem: no cenário atual de crescente instabilidade institucional que, por detrás de calma aparente no curto prazo, conspira contra a manutenção da paz social no longo prazo será necessário que o centro político “vá ao povo” com discurso firme contra os desmandos e a irresponsabilidade dos atores políticos. Que pregue a ordem na campanha e a imponha no governo. Fazer alianças partidárias, ganhar tempo de TV, fazer aliados na Federação, lançar programas de governo em gabinetes, manter-se acanhado, longe do povo, perante os grandes temas nacionais são estratégias muito limitadas para momento tão desafiador. A “pequena política” nunca foi tão minúscula. (Difícil os políticos tradicionais acreditarem, eu sei!)

Feita a campanha será necessário não trair o povo. O risco de descontrole é real, justificado e, por enquanto, pouco debatido publicamente. A crise é por dentro das instituições, algo menos aparente, mas muito mais profundo.