Para Supremo, caixa 1 em campanha eleitoral também pode ser crime

Para a Corte não basta a doação estar registrada na prestação de contas, a origem do dinheiro também tipifica um possível crime e pode ser considerada lavagem de dinheiro. Soterra muitos argumentos das defesas, tais "como não pedi caixa 2", "registrei tudo"...

José Marcio Mendonça

Plenário do STF

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Foi um dia carregado de notícias, boas e ruins no campo da política e da economia. Desde o PIB negativo de 3,6% em 2016, apontando para dificuldades maiores que as esperadas pelo governo para a retomada em boa velocidade e com sustentação da atividade econômica no país até o noticiário de delações premiadas da Lava-Jato, com a espantosa revelação de que somente da Odebrecht gastou nos últimos anos US$ 3,4 bilhões (cerca de R$ 10 bi) em pagamentos de propinas no Brasil e no Exterior.

Nada, porém, foi mais relevante, ontem que a decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) de acatar uma representação da Procuradoria-Geral da República e tornar o senador peemedebista Waldir Raupp réu na Lava-Jato. O fato, em si, não surpreende, tanto pelo envolvido, citado já em outros casos, como pela abertura do processo, coisa que deve se tornar corriqueira a partir das denúncias que o procurador Rodrigo Janot prepara a partir das delações premiadas dos 77 executivos da Odebrecht, provavelmente a partir desta semana, em avalanches.

O importante é o teor da decisão em si. Os recursos recebidos por Raupp da empreiteira Queiros Galvão, no valor de R$ 500 mil, para sua campanha à reeleição em 2010, estão devidamente registrados em sua prestação de contas, isto é, entraram como caixa 1. Contudo, os ministros do STF consideraram também a origem de dinheiro, rastreado nas investigações, e entenderam que tem origem em corrupção na Petrobras, e ainda que significou o pagamento a Raupp por um “serviço prestado” aos interesses da empreiteira – e validou a denúncia. O Supremo acatou a tese da procuradoria de que doação eleitoral pode ser também uma forma de lavagem de dinheiro.

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Ou seja, caixa 1 também pode ser irregularidade e que alegações de que não se sabia da origem do dinheiro doado não são argumentos de defesa. O que pode soterrar as teses dos defensores de muitos políticos com a corda no pescoço. Coisas como: “todas as doações estão registradas nas prestações de conta à Justiça Eleitoral”, “eu não sabia de onde saía o dinheiro”, “não pedi dinheiro vai caixa 2” nem sempre vão colar. As reações no Congresso forma imediatas, de “repúdio” e “perplexidade” – e com alguma ironia de quem está levando mais um susto.

GOVERNO ARMA BOAS NOTICIAS, MAS

NÃO CONSEGUE TIRAR O PIB DAS MANCHETES

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Os cerimonialistas e marqueteiros governamentais marcaram para ontem dois eventos no Palácio do Planalto para o presidente Michel Temer mostrar que seu governo está ativo, sem se abater com os ventos da Lava-Jato e que tais e que tem uma agenda positiva a ser cumprida. Coincidentemente, no mesmo dia em que estava prevista a divulgação do PIB de 2016 pelo IBGE, um número que já se sabia de antemão viria tisnado de um pesado vermelhão. Era uma tentativa de rivalizar, na mídia, com essa má noticia. E, como  no script, Temer recebeu a solidariedade dos membros do Conselhão às suas propostas e anunciou a segunda fase do PPI, com investimentos de R$ 45 bilhões.

O presidente discursou duas vezes, falando das realizações de sua gestão até agora e defendendo as propostas de reformas, especialmente com ênfase na da Previdência Social. Ainda pôde falar uma terceira vez na posse dos novos ministros da Justiça e das Relações Exteriores. Lembrou os tempos de Lula, que com grande gosto e estilo palanqueiro, chegava a falar para diversas platéias até 4 vezes num único dia.

Todavia, pelo que se viu nos meios eletrônicos durante a terça-feira e se pode verificar nos meios impressos hoje, o esforço foi relativamente vão. O PIB negativo foi o destaque, principalmente porque seus números desmembrados indicam que a recuperação da economia não virá com o otimismo que o governo apregoa. Temer na semana passada chegou a dizer que no fim de 2017 a economia nacional estará crescendo ao ritmo de 2,8% e em 2018 subirá mais de 3%. Meirelles fala em ritmo de expansão de 3,2% no fim do ano.

Não é a sinalização da numeralha do IBGE. Esta “batalha da comunicação” o governo parece ter pedido também. Ainda por cima, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, anunciou que o governo pode aumentar impostos para garantir a meta fiscal.

Por fim, o presidente por pouco não passou por um vexame em outro evento festivo como é normalmente a posse de ministro. De repente, o novo titular da chancelaria, o tucano paulista Aloysio Nunes, descobriu que a Câmara de Comércio Exterior (Camex), órgão essencial na execução da política de comercial, entre a saída do antecessor José Serra e sua posse, havia sido transferida, na surdina, para o Ministério do Desenvolvimento. Ameaçou não tomar posse e Temer teve se recuar. O episódio mostra as vacilações do governo, as pequenas disputas de poder e como as decisões costumam ser tomadas em Brasília, desgastes desnecessários para quem precisa melhorar sua imagem.

Destaques dos

jornais do dia

– “Pior recessão da história faz renda média do brasileiro diminuir 9,1%” (Folha)

– “PIB cai no 4º trimestre e deixa herança negativa para 2017” (Valor)

– “Investimento teve o pior resultado em 20 anos” (Estado/Valor)

– “Para analistas, retomada econômica tende a ser lenta” (Folha)

– “Meirelles: imposto pode subir para garantir meta” (Globo)

– “BNDES deve renegocia R$ 25 bilhões de dívidas dos estados sem aval na União” (Valor)

– “Exportação puxa alta da produção de veículos em janeiro” (Estado)

– “Novo plano de concessão só tem 38% de investimento novo” (Folha/Globo/Valor)

– “Imposto mais simples: Temer iniciará reforma tributária” (Globo)

– “Odebrecht pagou US$ 3,4 bilhões de forma ilícita, diz delator” (Folha/Estado)

– “TSE marca acareação entre Marcelo Odebrecht e subordinados” (Folha/Globo/Estado)

– “Supremo decide torna Waldir Raupp réu na Lava-Jato” (Folha)

– “WikiLeaks diz que Estados Unidos espionam computadores, celulares e até TVs” (Folha/Estado)

LEITURAS SUGERIDAS

1.    Editorial – “Recessão histórica” (diz que empobrecimento recente do país tem poucos paralelos no passado e resistência às reformas pode custar mais uma década perdida) – Folha

2.    Vinícius Torres Freire – “Viagem ao fundo do abismo sórdido” (diz que a recessão 2015-16 foi a desgraça mais intensa do país, obra de um conluio entre elite, PT e agregados) – Valor