Zona Franca de Manaus 50 anos: as bodas do desejo

O poder público, aquinhoado com robustos recursos, a quem compete resguardar o parâmetro social, é aquele que exige maior vigilância no jogo e na prorrogação burocrática e autoritária  dos papéis.

Equipe InfoMoney

Zona Franca de Manaus vista do alto

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*Alfredo M. R. Lopes é jornalista e escritor

A celebração das bodas de ouro da Zona Franca de Manaus, a modelagem de desenvolvimento regional com mais acertos na história da República, poderia  invocar o marxismo e a psicanálise para animar os ensaios capitalistas desta revolução truncada. Acertos e contradições, avanços e equívocos, um cardápio variado para ilustrar o movimento da história, na folia de trancos, enganos, arranjos e barrancos, que se dá aqui como em todo lugar.

Os avanços se deram na sequência do planejamento genial de uma dupla, Roberto Campos e Arthur Amorim. Este – filho de de um dos Jotas, J. Amorim, os pioneiros comerciantes dos seringais do extrativismo – preferiu ganhar o mundo atrás do conhecimento a seguir a tradição varejista amazônica, que faliu com o Ciclo da Borracha. E aquele, ex-seminarista jesuíta, da escola diplomática da Companhia de Jesus, onde se formou o Papa Francisco, ainda não foi lembrada em justa comemoração. O desenho original do Decreto 288/67 – corrompido pela inépcia dos governantes  – para indústria, comércio/serviços e agricultura, permanece vanguardista.

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Os avanços se devem à obstinação de alguns empreendedores, que viram no modelo ZFM a oportunidade da geração de negócios e acumulação inteligente  da “mais valia”, como convém ao capital. Muitos esquecem, ou padecem de depressão, ou de arrivismo disfarçado, que o modo de produção capitalista não tem pátria nem mãe. Por isso, armam a própria rede na ilharga das lamentações.  O capitalismo – não se iludam os chorões da incompetência –  só desembarca no porto dos bons negócios, para tratar bem a generosa galinha e seus ovos dourados, dentro dos limites jurídicos do lugar.

O poder público, aquinhoado com robustos recursos, a quem compete resguardar o parâmetro social, é aquele que exige maior vigilância no jogo e na prorrogação burocrática e autoritária  dos papéis. Portanto, uma das ações mais arrojadas dos próximos 50 anos é jogar o jogo capitalista, pra superar o jugo medieval do mandonismo político e da corrupção deletéria das agremiações em suas policromias ideológicas. Não adianta o lamento estéril de um Centro de Biotecnologia na Amazônia, que não tem  CNPJ,  se a opinião pública  não invocar as regras do jogo  contra essa insensatez. Desperdício de recursos e de oportunidades tem um nome.

Que vantagens teríamos em jogar o jogo da mais valia em todas as dimensões, explicitando a quem compete o quê,  na disputa pelo desenvolvimento integral? Na visão marxista, o trabalho – não a razão – é quem produz  a consciência. Marx define o homem pelo trabalho. O primeiro fato histórico, que distingue os homens dos animais, não é o fato de pensar, mas o de produzir os seus próprios meios (ou instrumentos) de subsistência, ou seja, satisfação de necessidades. Marx abominaria o assistencialismo e suas implicações demagógicas e eleitoreiras.

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Sua teoria, porém, não faz distinção entre necessidade e desejo, um conceito central na visão freudiana. Na Interpretação dos Sonhos, a explicitação conceitual de sua teoria, está demonstrado que “…o desejo é o âmago de nosso ser”. A libido, neste arcabouço filosófico, surge como a energia, a mais forte da condição humana, que nos empurra a satisfazer impulsos. Para Freud, quem opta pelo muro das lamentações, ou nele encontra prazer,  provavelmente perdeu o impulso de satisfazer o próprio  desejo. “Já vimos esse filme…”.

Cotejar necessidade e desejo, dois impulsos inerentes à condição humana, o realismo materialista de Marx e o desvario libidinoso de Freud, abre espaço Heráclito, um pré-socrático da pesada, que anteviu a angústia existencial da modernidade.  “Tudo flui, tudo está  em movimento constante, nada permanece”, a não ser, até aqui,  o caráter permanente desta sentença.  “não entramos duas vezes no mesmo rio. Quando entro no rio pela segunda vez, nem eu nem o rio somos os mesmos”. Nesta semana, Gilberto Mestrinho,  um  espírito vanguardista, tomado pela energia libidinosa da  transformação social da paisagem amazônica faria 89 anos.

Embora pupilo do trabalhismo esquerdista de Getúlio, e acolhedor do perfil marxista de alguns colaboradores, o Boto Navegador, na companhia de pirararas, uirapurus,  Curupiras e jacarés, se moveu por romper a mesmice da inapetência, apontando cenários de transformação, construindo a seu modo a civilização do desejo, a única energia capaz de criar sem destruir a economia com (e do prazer) de base florestal, a favor das pessoas, sejam gregas, judias ou lusitanas.