Criticado, Temer avisa: ministro denunciado ou réu vai embora

Presidente adota esse critério preocupado com a interpretação corrente que seu governo participa ainda que indiretamente dos movimentos para conter a Operação Lava-Jato. Posição de Temer foi recebida com ceticismo.

José Marcio Mendonça

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Diz-se que a história se repete como farsa. A política brasileira nasce farsa e se repete indefinidamente tragicômica

Depois de um monitoramento nas redes sociais, nas quais descobriu que o governo estava sendo severamente criticado por algumas de suas últimas ações – como, entre outras, ter dado o cargo de ministro a Moreira Franco e apoiado a indicação de Edison Lobão para a presidência da Comissão e Constituição e Justiça do Senado -, passando a impressão de que apóia o movimento mais ou menos generalizado do mundo político de “estancar a sangria” da Operação Lava-Jato, o presidente Michel Temer fez um inesperado pronunciamento ontem para marcar a posição de seu governo e a sua pessoal diante da questão.

Temer estabeleceu que os ministros que forem denunciados ou se transformarem em réus, e não apenas citados em delações premiadas, serão afastados no governo. Os primeiros, temporariamente, enquanto as investigações prosseguem. Os réus, definitivamente. Enquanto isso, ficam como estão. Foi uma tentativa clara de dar uma satisfação à opinião pública – e sair da defensiva em que se encontra e também de se afastar pessoalmente dos movimentos “mata Lava-Jato”.

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Porém, a não ser entre os aliados fieis no mundo político, cuja trama para criar obstáculos à operação Lava-Jato e similares está avançando, a declaração não entusiasmou, não fez sucesso. A emenda não saiu pior que o soneto, porém o soneto não soou bem. Por algumas razões:

(1) o presidente fez questão de dizer explicitamente que essas providências se limitam às questões da Lava-Jato. E de outras operação, como a Zelotes e similares, como fica?

(2) sabe-se que esses processos demoram tempos para chegar a uma das condições que Temer impôs para afastar ministro, em média muito mais de um ano. Ou seja, vai continuar trabalhando com ministros sob suspeita e, portanto, mal vistos junto à opinião público, lista que já incluiu alguns nomes de sua inteira confiança, como o próprio Moreira e Eliseu Padilha, e líderes no Congresso – e que pode crescer quando as delações premiadas da Odebrecht começarem a ser liberadas.

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Segundo as primeiras análises de ontem em Brasília, Temer não colocou uma barreira entre ele e seu governo e os grupos de “citados” nas delações da Operação Lava-Jato, botou o governo um pouquinho mais dentro da história. A interpretação é que Temer está “blindando” seus auxiliares, embora ele tenha dito expressamente que não quer e não vai blindar ninguém.

Além do mais, o critério anunciado ontem é novo: os ex-ministros Romero Jucá e Henrique Alves não são réus da Lava-Jato, mas quando seus nomes surgiram em vazamentos, foram sumariamente afastados do Ministério do Planejamento e do Turismo, respectivamente.

CENSURA ÀS INFORMAÇÕES DO

TELEFONE DE MARCELA TEMER

Também está sendo muito criticada a posição adotada pelo presidente em relação à divulgação de trechos de conversas da mulher dele, Marcela Temer, hackeados por um indivíduo que está já inclusive preso e sentenciado. O presidente conseguiu decisão da Justiça Federal impedindo a “Folha de S. Paulo” e “O Globo” de divulgarem essas trocas de mensagens.

Além do equívoco em si, pois passa a clara impressão de “censura” quando algo pode incomodar, levanta a suspeita de que há coisas a esconder nessa história. Numa das conversas já divulgadas, o chantagista diz a Marcela que tem informações que podem comprometer Temer. Em casos assim, o melhor remédio é a transparência.

Tanto na questão do telefone hackeado como na dos ministros citados em delações premiadas, o governo Temer parece estar optando pela opacidade, coisa ruim em qualquer governo democrático e ainda mais, no caso, dirigido por um constitucionalista de renome.

O mundo jurídico está condenando o veto. E voltou à cena o episódio do ex-presidente Lula querendo expulsar do Brasil o correspondente do “The New York Times” por ter escrito uma reportagem dizendo que ele gostava de consumir álcool acima do tido como socialmente normal. Na ocasião, Lula chegou a tomar essa decisão, mas aconselhado pelo então ministro da Justiça, Marcio Thomaz Bastos, e pelo assessor de imprensa, Ricardo Kotscho, voltou atrás.

O RIO, SEM DINHEIRO NA HORA

E COM REFORÇO DO EXÉRCITO

No campo mais chão dos problemas do dia a dia, o governo sofre um revés ontem com a decisão do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, de dar um mês de prazo para se definir sobre a legalidade da ajuda do governo federal ao estado do Rio de Janeiro. Criou-se um problema agudo para o governador Luis Fernando Pezão e para o próprio governo federal.

O governador tem dito que o Rio está no limite, com o funcionalismo com o salário atrasado e em estado de pré-convulsão, que a ajuda discutida há algumas semanas na verdade era para ontem, ou seja, que o momento é delicadíssimo, o dinheiro providencial de Brasília já era aguardado há pelo menos um mês. Agora, não sai tão cedo.

O Rio vai agüentar esperar que a Assembléia Legislativa aprove as medidas mais urgentes do acordo ou que o Congresso Nacional aprove novas regras para empréstimos aos estados?

O fantasma do Espírito Santo voltou a rondar as terras fluminenses. Tanto que o governo federal autorizou o envio de tropas para ajudar a patrulhar a capital, a pretexto de que estamos já praticamente no Carnaval, quando a cidade tem uma enorme e sempre bem vinda afluência de turistas nacionais e estrangeiros.

O governador, contudo, mostra, a real utilidade do Exército na cidade: diz que usará as tropas federais para proteger as ruas e a Assembléia Legislativa, que tem sido atacada por manifestantes servidores públicos contra as medidas que o estado se compromete a adotar para ter ajuda de Brasília.

Destaques dos

jornais do dia

– “Mercado prevê inflação abaixo da meta de 4,5% pela primeira vez em 8 anos” (Globo)

– “Demanda de crédito aumenta 5% em janeiro” (Valor)

– “Temer quer mudar regulamentação do direito de greve – quer regras duras” (Valor/Estado)

– “Processo conta chapa Dilma-Temer não pode ser infinito, diz relato no TSE” (Globo)

– “Espírito Santo começa a demitir PMs do motim” (Globo)

– “Casos de propina da Odebrecht afetam eleições do Equador” (Folha)

LEITURAS SUGERIDAS

1. Editorial – “Interesse público” (diz que a censura descabida a texto sobre a tentativa de extorsão sofrida por Marcela Temer afronta direito à informação com argumento equívoco) – Folha

2. Claudia Magalhães Eloy – “Muda o governo, seguem os equívocos” (diz que medidas recentes adotados pelo governo mostram que no front habitacional não evoluímos – regredimos) – Valor

3. Editorial – “Temer impõe limites” (diz que esclarecimentos presidenciais sobre ministros devolvem à população um pouco de tranqüilidade a respeito da relação do governo federal com as denúncias de corrupção) – Estado

4. Eloísa Machado de Almeida – “Um gesto de proteção” (diz que lendo as letras miúdas, o anúncio de Temer se parece mais com uma tentativa de proteger ministros delatados do que um gesto de intolerância com a improbidade) – Estado