O que o julgamento do caso da “desaposentação” diz sobre a atuação do STF?

Apesar de se tratar de uma controvérsia em termos jurídicos, o caso possuía potencial de impacto também no ambiente político

Equipe InfoMoney

Plenário do STF

Publicidade

* Rubens Glezer e Lívia Gil Guimarães, pesquisadora e coordenador do Supremo em Pauta da FGV Direito SP

O julgamento do STF sobre o processo de “desaposentação” serviu para estabelecer diretrizes cruciais a respeito do modelo previdenciário brasileiro, bem como indicar a possibilidade de uma nova tendência na pauta do Tribunal.

Sobre o caso, foi rejeitada a tese de que a pessoa que decide voltar ao mercado de trabalho após já ter se aposentado, não poderá ter o benefício revisto. O Supremo decidiu que caberia o Poder Legislativo realizar uma modificação dessa natureza.

Masterclass

As Ações mais Promissoras da Bolsa

Baixe uma lista de 10 ações de Small Caps que, na opinião dos especialistas, possuem potencial de valorização para os próximos meses e anos, e assista a uma aula gratuita

E-mail inválido!

Ao informar os dados, você concorda com a nossa Política de Privacidade.

Apesar de se tratar de uma controvérsia em termos jurídicos, o caso possuía potencial de impacto também no ambiente político. Como se trata de um recurso com “repercussão geral”, a decisão orienta e vincula todos os demais casos que correm ou venham a ingressar no Judiciário, algo que se torna ainda mais relevante quando se considera que a ação tinha o potencial de gerar prejuízos de diversos bilhões à Previdência Pública, em caso de reconhecimento da tese de “desaposentação”.

Ironicamente, ações ajuizadas em 2003, cujo julgamento foi iniciado em 2010 e interrompido diversas vezes foi retomado apenas um dia após a aprovação na Câmara dos Deputados da PEC 241/2016 (que visa estabelecer um teto dos gastos públicos por meio de vinculação à taxa inflacionária). Sob o argumento de que os cidadãos esperam uma resposta do Judiciário há tempo excessivo, manteve-se o julgamento a despeito do contexto no qual Executivo e Legislativo se envolvem em articulações complexas e representantes dos três Poderes se envolvem em desentendimentos com ampla repercussão na mídia.

Em razão da complexidade jurídica do tema, o Supremo pôde decidir com votos que se mantiveram majoritariamente distantes dessas questões políticas, mas cujo resultado endossou a proposta governamental de contenção de gastos públicos; ainda que houvesse o risco do resultado oposto. Por trás de argumentos sobre interpretação das leis previdenciárias, há um também um ambiente político denso no Supremo Tribunal Federal. Ainda não há clareza suficiente para compreender como a política de selecionar os casos que serão julgados se relaciona com o atual ambiente de crise política e econômica.

Continua depois da publicidade

Cabe à Presidência do STF escolher quais casos serão julgados no Plenário e quais aguardarão indeterminadamente por uma definição. Em meio a centenas de milhares de processos sobre os mais diversos temas, a seleção da pauta de julgamento é uma escolha política.

Sendo assim, no conturbado contexto brasileiro e diante da sua exposição cada vez maior à opinião pública, fica cada vez mais difícil para o Supremo Tribunal Federal assumir uma imagem de neutralidade política. O sucesso desse discurso, no qual o Judiciário é apenas um prestador de serviços aos cidadãos, depende da consistência e coerência com que for composta a pauta de julgamento até o final do mandato da Ministra Cármen Lúcia. Uma consistência que exige resolver processos complexos, a despeito de qualquer consequência política-econômica. Possivelmente, essa será a tendência dos próximos meses, com casos de dívidas dos estados, expurgos inflacionários dos planos econômicos e ações penais contra parlamentares. Um novo momento para o Supremo (?).