Eleição municipal e caldo de galinha

O entusiasmo com a substituição do governo Dilma Rousseff não contaminou o próprio governo que ainda não conseguiu dar um sentido de “emergência” às mudanças que o país necessita.

Francisco Petros

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Não é possível transportar a análise sobre eleições municipais para a esfera federal sem que se use múltiplos e complexos “filtros” os quais tornam o processo analítico inconclusivo ou inútil às decisões empresariais e pessoais. Todavia, não faltam visionários dispostos ao exercício de previsões e inferências. A pressão demandada pelo distinto público para que “se fale alguma coisa” obriga “o” ou “a” profeta a se pronunciar nas rádios, TVs e mídias eletrônicas. A notícia é escambada por todos os lados.

Os motivos para que as eleições municipais não permitam profundas conclusões sobre o cenário da política nacional são vários, destacadamente: (i) a população das cidades analisa o trabalho do prefeito como associado diretamente ao seu cotidiano direto, fato este natural; (ii) o perfil ideológico dos candidatos à prefeito tem menor peso na medida em que se afere questões mais tecnocráticas e dependentes de competências específicas (administração da saúde, dos transportes, o manuseio do lixo, a ocupação do espaço urbano, etc.); (iii) o partido do candidato tem menor importância se ele for reconhecido como administrador eficiente, honesto, etc.; (iv) a utilização da máquina pública, mesmo que possível e existente, é mais visível ao eleitor eos riscos de sua utilização são mais elevados para quem se arrisca na tarefa.

Nas capitais de algumas grandes cidades, a saber, São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Belo Horizonte o jogo da política nacional pode contaminar o processo eleitoral local e vice versa. Todavia, não se trata de influência preponderante, mas inserida em múltiplos fatores políticos e, digamos, “pragmáticos”.

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Considerando os fatores acima considerados, pode-se ser afirmativo em alguns temas, mesmo que nos faltem elementos estatísticos que sustentem tais conclusões com mais solidez. Vejamos.

1) A redução do poder do PT, sobretudo nas capitais, foi evidente por força da rejeição ao envolvimento do partido com práticas como a corrupção e o favorecimento descabido. Talvez esta seja a marca “mais nacional” dessa eleição;

2) O PMDB continua a ser o partido dos grotões e/ou das oligarquias. De ponta a ponta no país vê-se a presença do partido nas pequenas e médias cidades e nas cidades grandes sob o guarda-chuva de alguns oligarcas que negociaram alianças;

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3) A crise econômica retirou dos atuais prefeitos a chance de “mostrar serviço” à última hora, com obras e realizações que permitissem a atração de hordas eleitorais;

4) As campanhas mais pobres por força da nova legislação eleitoral contribuíram para menor mentalização de nomes e siglas por parte do eleitor. Esta é uma das razões para a pulverização ainda maior das composições das câmaras municipais. A fragmentação política tornou-se ainda mais acentuada;

5) As grandes siglas partidárias perderam muito espaço, mas dentre as pequenas siglas, nenhuma se destaca como “novidade”. Especificamente a Rede fracassou fragorosamente;

6) Marina Silva persiste como “grande ilusão” do país: tem densidade eleitoral nas pesquisas, mas é apenas um ícone, sem liderança, programa ou vigor pessoal;

7) Geraldo Alckmin, governador de São Paulo, sai fortalecido. Resta saber se sairá das fronteiras bandeirantes e ganhará tônus federal. Isso depende mais dele que da vitória momentânea na prefeitura de São Paulo;

8) Eduardo Paes fracassou a despeito da espetacularização dos Jogos Olímpicos em torno de si mesmo;

9) A pobreza dos orçamentos de campanhas e a redução da colheita de votos dos grandes partidos será a razão maior para a mudança da forma de financiamento de campanhas a ser estabelecida pelo Congresso no futuro. Para os grandes partidos nada como ter o “poder econômico”a financiá-los;

10) A melhor política de um político é dizer que não é político. Exemplo: João Dória.

Enfim, a recomendação possível de ser dada para aqueles que observam a cena brasileira com o objetivo de tomar pequenas e grandes decisões é de que não se deve alterar as variáveis relevantes do cenário econômico por enquanto.

Nesse sentido vale a pena revisitar tais variáveis. Vamos a elas.

1) O governo permanece relativamente estagnado nas iniciativas da área econômica à espera da conclusão das eleições municipais;

2) As medidas a serem adotadas, sobretudo quanto as áreas trabalhista e previdenciária requerem vasto apoio congressual. Nesse sentido, as dificuldades momentâneas fruto da conjuntura eleitoral não cessarão em vista dos interesses envolvidos nos temas;

3) A popularidade do governo Temer permanece sofrível e, assim, a capacidade necessária à articulação é engrandecida, sendo que o Congresso permanece “liderando” as iniciativas;

4) Os atores políticos de dentro da aliança de poder (PMDB, PSDB, DEM, PSD, etc.) que sustenta o governo estão em franco embate, silencioso ou não, em vista da eleição presidencial de 2018;

5) No curto prazo o governo terá duas notícias positivas: (i) a inflação deve cair muito no curto prazo e (ii) há concreta perspectiva de que a curva de juros futuros venha também a declinar;

6) O cenário externo não é positivo, mas ainda é “neutro” para o país. Com efeito: a taxa de câmbio deve se manter pouco volátil, sem altas ou quedas expressivas;

7) A atividade econômica está em recuperação, todavia, sem generalização pelos mais importantes setores microeconômicos;

8) O desemprego fica alto, mas fica onde está;

Como se vê, permanece o cenário já delineado nesse espaço: lenta recuperação à espera de medidas estruturais. Entretanto, não há como se negar que o entusiasmo com a substituição do governo Dilma Rousseff não contaminou o próprio governo que ainda não conseguiu dar um sentido de “emergência” às mudanças que o país necessita.

Vamos continuar trabalhando com um cenário menos arriscado, mas a hora ainda é de “caldo de galinha”. Infelizmente.