O que esperar do governo Michel Temer na área tributária?

Governo que se inicia após intensa divisão social e desgastante processo de impedimento não arriscará comprometer a sua aceitação com medidas que desagradem a opinião pública - por isso, reforma tributária, criação do IVA Federal ou mesmo a recriação da CPMF não deverão estar na pauta do novo Governo

Equipe InfoMoney

Publicidade

* TACIO LACERDA GAMA é professor de direito tributário dos cursos de graduação, mestrado e doutorado da PUC-SP, Presidente do Instituto de Aplicação do Tributo – IAT e sócio do Lacerda Gama Advogados Associados.

Nada de novo e significativo deverá ser proposto pelo governo Temer na área tributária. Um Governo que se inicia após intensa divisão social e desgastante processo de impedimento não arriscará comprometer a sua aceitação com medidas que desagradem a opinião pública. Por isso, reforma tributária, criação do IVA Federal ou mesmo a recriação da CPMF não deverão estar na pauta do novo Governo. Da mesma forma, a transformação ideológica por que passará o comando do País deixará de lado, temporariamente, temas polêmicos como tributação de dividendos, combate à “pejotização”, criação de tributos sobre grandes fortunas e dever de declaração do planejamento tributário. Essas questões deverão aguardar um momento mais favorável. 

O novo Presidente, por outro lado, precisará dar boas notícias à população. Por isso, projetos setoriais que estimulem o desenvolvimento de atividades produtivas, sem promover diretamente renúncia de receitas, poderão se muito bem-vindos. Por conta dessa necessidade, será possível a aprovação de medidas que hoje tramitam no Congresso Nacional. Um bom exemplo dessas medidas é o projeto que cria a Sociedade Anônima futebolística, voltado à profissionalização do futebol. Nesse caso, há um estímulo ao fim do amadorismo empresarial do futebol, que passaria a ser atividade desenvolvida por empresas privadas, que pagam tributo, em substituição ao formato de entidades sem fins lucrativos que existe hoje. Esse é um exemplo de boa notícia, com fomento da atividade econômica, sem renúncia de receita.  

Masterclass

As Ações mais Promissoras da Bolsa

Baixe uma lista de 10 ações de Small Caps que, na opinião dos especialistas, possuem potencial de valorização para os próximos meses e anos, e assista a uma aula gratuita

E-mail inválido!

Ao informar os dados, você concorda com a nossa Política de Privacidade.

Que fique claro: a timidez estratégica na área tributária de grande visibilidade não significa inércia na área financeira. O foco do novo Governo será o gasto e não a receita. Os principais movimentos nesse sentido já estão em curso. Basta ver o já anunciado e esperado corte de gastos correntes, a aprovação da DRU, com alíquota 50% superior àquela que vinha sendo admitida pelo Congresso Nacional, e a PEC dos gastos públicos. Deixando de ser interino, o Governo terá mais condições de usar o apoio do Congresso para implementar uma agenda mais rigorosa de ajuste orçamentário. Acredito, porém, que isso será feito com mais intensidade longe dos olhares diretos da opinião pública.

Destaco outras quatro razões para que o novo Governo não aumente tributos: i. Apoio político recebido do setor produtivo, diretamente ou por meio de partidos como Democratas e PSDB, que refutam o aumento da carga tributária, defendendo redução de gastos públicos; ii. Recessão e baixíssimo crescimento econômico que poderiam ser ainda mais agravados com aumento de custos de produção; iii. Fontes de receita não recorrentes que podem ser geradas com a privatização de ativos; e iv. Oportunidade de demonstrar escolhas equivocadas do Governo anterior e tirar proveito político disso. Com esses fatores em mente, a retórica do possível aumento de tributos ficaria como um bode na sala que, uma vez retirado, traria, por si só, enorme alívio para a sociedade brasileira e quebraria a péssima tradição de mandar para o contribuinte a conta da irresponsabilidade fiscal.

A ausência de grandes transformações legislativas deverá ser acompanhada pela atividade tributária administrativa e jurisdicional. A Receita Federal seguirá ainda mais implacável, por conta da necessidade de arrecadar. Um ponto a favor do contribuinte, a ser comemorado, diga-se de passagem, é a autonomia que o conjunto das circunstâncias trará aos julgadores administrativos e, com mais vigor, ao Supremo Tribunal Federal. Qualquer sombra de influência decorrente das indicações feitas no passado recente que já não estivesse superada, a partir do novo Governo estará afastada. O STF ficará, na prática e na teoria, mais autônomo do que nunca.

Continua depois da publicidade

Algumas medidas financeiras, contudo, são dolorosas e deverão ser tomadas agora. Falo das reformas da previdência e da PEC que limita gastos públicos ao índice de inflação do ano anterior. Aqui, a perda de direitos, ou de expectativas, será desafio suficientemente relevante para concentrar todos os esforços do Governo, assim como sua capacidade para enfrentar a opinião pública. E esse esforço se justifica. Os potenciais resultados positivos para a economia do País, com reversão da expectativa negativa que existe hoje sobre o Brasil, asseguraria a retomada de crescimento e as bases para que ele seja sustentável no futuro de médio e longo prazo.

Essas ideias, ressalto, são apostas na coerência e no senso de oportunidade do novo Governo. Incoerências, porém, não são raras. E o novo Governo não foi econômico em idas e vindas até agora. A concessão do reajuste do funcionalismo com a mudança de ideia logo após a olimpíada foi um exemplo de que decisões podem mudar ao sabor das circunstâncias.  Que o fim das negociações para o início do novo governo seja também o fim das surpresas ruins e o retorno das boas expectativas.