Dilma adota novo pacote de “bondades”, mas traça estratégia para reagir a Temer

Apesar dos sinais de que está nos estertores, presidente ainda age freneticamente para tentar se manter

José Marcio Mendonça

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SÃO PAULO – O Brasil vive hoje com “dois governos”. A “República do Jaburu” e “República do Planalto e da Alvorada”. Um ainda em perspectiva, mas com cada vez mas indicações de que sua hora de poder está próxima, e que já age para consolidar esta possibilidade e para começar a trabalhar o mais rapidamente possível.

E outro que, apesar dos sinais contrários de que está mesmo nos estertores, diante da tendência do Senado de aprovar o impeachment da presidente Dilma Rousseff, age ainda freneticamente para tentar se manter de pé. E, em última instância, para dificultar a vida do substituto pelo menos enquanto ele for ainda apenas o interino, naqueles 180 dias (no máximo) entre a admissão do impedimento pelos senadores e o julgamento final das acusações contra a presidente.

A “perspectiva de poder”, o vice-presidente Michel Temer, continua articulando a formação de seu ministério, a consolidação de sua base parlamentar e já preparando terreno prático para adotar medidas emergenciais na área econômica, o grande desafio dele (e de Dilma, se ela continuar).

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Ontem, depois de conversar com o presidente do PSDB, senador Aécio Neves, Temer conseguiu acertar a participação definitiva e efetiva dos tucanos em seu governo. Aécio já conversou com o senador José Serra e hoje estará em São Paulo para fechar a posição do PSDB com os dois outros caciques, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o governador Geraldo Alckmin.

Os detalhes dos acertos ficarão conhecidos na sexta-feira. Porém Temer tirou do ar uma das nuvens que preocupavam os tucanos: comprometeu-se, segundo o jornal “O Estado de S. Paulo”, a apoiar uma emenda constitucional com o fim da reeleição. Os tucanos não estavam dispostos a ajudar Temer para depois vê-lo como concorrente em 2018, caso venha a ter sucesso.

Contudo, Temer já começa a enfrentar dificuldades internas. Os aliados do chamado “novo centrão”, partidos de porte médio para abaixo, continuam pressionando para receber parcelas de poder. Sem contar o apetite do próprio PMDB e outros gargalos. Ontem ele teve de “desconvidar” seu futuro ministro da Justiça, o advogado Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, depois de uma entrevista à “Folha de S. Paulo” em que reiterou críticas à Operação Lava-Jato.

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Não há mais nenhuma dúvida de que Henrique Meirelles será o ministro da Fazenda. Com essa definição, Temer corre agora para desarmar algumas bombas que ameaçam a gestão econômica. Ontem, ele conversou com o presidente do Senado e do Congresso, Renan Calheiros, para que seja colocada em pauta, com urgência, a mudança da meta fiscal deste ano.

Se não conseguir transformar a meta de superávit em déficit primário até o dia 22 de maio, o governo será obrigado a fazer um novo brutal corte no Orçamento que pode paralisar boa parte das atividades administrativas, atingindo até algumas áreas essenciais. O ministro Nelson Barbosa, mesmo com sinais de que já está praticamente fora da Esplanada dos Ministérios, age na mesma direção.

No campo das contas públicas, Temer (e Dilma) ganhou um alívio temporário ontem: o STF adiou por 60 dias, com a recomendação de que as partes procurem entrar num acordo, a definição sobre a forma de cálculo dos juros das dívidas dos governos estaduais com o Tesouro Nacional.

Se prevalecer o que o próprio Supremo definiu em liminares concedidas a 11 Estados, cálculo por juros simples e não juros compostos, o governo federal teria um rombo adicional em suas contas de mais de R$ 330 bilhões em alguns anos, mais de R$ 30 bi este ano. De todo modo, nesses 60 dias as liminares permanecem em vigor e os estados já estão pagando menos ao governo federal. As perdas do Tesouro estão estimadas em R$ 3 bilhões mensais. 

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Governo vai raspar a gaveta de projetos
Isto não eximirá Temer, segundo os economistas, de preparar um ajuste duro nas contas públicas – e cortes no próprio governo para dar o exemplo. Para compensar o que é sempre medido, na ótica da política eleitoral e partidária pela régua do “impopular”, o vice Temer estuda medidas que sejam socialmente atraentes.

É o que está contido na proposta “Travessia Social” em fase final de discussão. Não deve sair muito do óbvio: revisão do Bolsa Família para permitir um aumento de no mínimo 5% na atual prestação e em outras rendas sociais, elevação dos recursos para o Minha Casa Vida Minha Vida (com novas facilidades, mais focado em habitações para baixa renda), revigoramento do Pronatec e criação de um programa de certificação de capacidades para o trabalhador.

Implícita está a promessa de não abandonar nenhum dos atuais programas sociais – no máximo “focá-los” e aperfeiçoá-los. Um dos argumentos dos auxiliares de Temer nesta área é que há muitos desperdício em alguns programas e que apenas a sua revisão levará à sobra de dinheiro para ampliar o que for necessário e até sustentar novos.

Os jornais estão carregados de informações sobre políticas em estudo pelos assessores de Temer a serem propostas no curso e no médio prazo: bônus de desempenho para professores do país (“Folha de S. Paulo”) idade mínima para aposentadoria (“O Globo), independência do Banco Central (“O Estado de S. Paulo e “Valor Econômico”).

A presidente Dilma Rousseff, na sua luta cada vez mais açodada para tentar evitar que o Senado aprove a admissibilidade do pedido de impeachment, também avança com um “pacote de bondades” nas suas políticas sociais. Dilma (Lula um pouco menos, parece já conformado com o que está se desenhando no Senado) acredita que com isso poderá atrair os sindicais e movimentos sociais para atos em defesa de seu mandato capazes de impressionar (e pressionar) ainda os senadores.

A linha é a mesma de Temer: aumento do Bolsa Família, mais recursos para o Minha Casa Minha Vida, alteração do 2,5 salários mínimos para 3,5 SM a exigência de renda familiar para candidatos às bolsas do Fies, prorrogação da permanência dos médicos estrangeiros no Brasil, homologação de mais terras indígenas, mais desapropriações de terras para reforma agrária, lançamento de um Plano de Safra Agrícola Familiar de R$ 30 bilhões. A ordem é os ministros rasparem suas gavetas de projetos. Dilma quer fazer antes as boas para deixar apenas as “amargas” para Temer.

Ao mesmo tempo, Dilma e Lula traçam a estratégia para dificultar a vida do governo provisório de Michel Temer, caso o impeachment seja admitido pelos senadores (provavelmente no dia 11 de maio) e a presidente seja interinamente afastada por 180 dias. Lula e Dilma acreditam que, se Temer não der certo imediatamente, ela terá chances de voltar – o Senado não aprovaria seu afastamento definitivo nas circunstâncias de um Temer também impopular.

Por isso, Dilma determinou a seus ministros de mais confiança e aos ministros petistas em particular, que não colaborem com Temer e seus indicados. A ordem é deixar a turma do vice-presidente à míngua de informações, deixá-los no escuro sobre a real situação da administração, das contas públicas, do dia a dia de Brasília. A alegação é de que não se vai respaldar “um governo ilegítimo”. “Não vamos entregar tudo de mão beijada”, disse um petista com trânsito no Palácio do Planalto segundo o “Valor Econômico”.

Lula e Dilma também ainda não desistiram também de propor eleições presidenciais este ano ainda, as novas “diretas-já” em caso de derrota no impeachment.

Outros destaques dos

jornais do dia

– “Banco Central mantém taxa de juros em 14,25%” (Estado/Globo/Folha/Valor)

– “Mercado espera queda mais rápida dos juros” (Valor)

– “FMI vê Brasil como fator de risco para América Latina” (Valor)

– “Cunha manobra de novo e coloca aliado na CCJ” (Estado)

– “Novas regras para distrato de imóveis exigem atenção no contrato” (Globo)

LEITURAS SUGERIDAS

Editorial – “Decência e competência” (diz que Temer será compreendido e aplaudido se orientar a orientação de seu governo por rígidos critérios) – Estado

Editorial – “Gesso trabalhista” (diz que mesmo sem laços com sindicatos, eventual governo Temer terá dificuldades para promover reformas cruciais, com a da Previdência e a trabalhista) – Folha

Laura Carvalho – “O mar está para monstros” (diz que a opção por políticas recessivas agrava a crise, aumenta a intolerância e enfraquece a democracia) – Folha

Ribamar Oliveira – “Ilusão que Temer não pode vender” (diz que não basta reequilibrar as contas – é necessário produzir superávit primário específico e continuado que coloque a dívida pública em trajetória sustentável) – Valor

Maria Cristina Fernandes – “As vivandeiras do Jaburu” (diz que tucanos são oferecidos ao governo Temer a preço de ocasião) – Valor