Esquizofrenia econômico-tributária

Os investimentos feitos nas pequenas e médias indústrias ou distribuidoras (atacadistas e varejistas), em que a burocracia tende a ser menor, passarão a ser tributados, quando da distribuição dos dividendos

Equipe InfoMoney

Publicidade

Edison Carlos Fernandes, doutor em Direito pela PUC/SP, professor do Núcleo de Direito Tributário do CEU Escola de Direito e da FGV Direito SP (GVlaw), sócio do Fernandes Figueiredo, Françoso e Petros Advogados

Um dos grandes e pioneiros teóricos da regulamentação dos tributos no Brasil, Alfredo Augusto Becker, disse que em Pindorama vivemos o “Carnaval tributário” – título do livro publicado no final da década de 1980. Considerando a atual conjuntura tributária brasileira, tendo a achar que a análise do mestre não serve mais aos nossos dias. Na verdade, o que vivemos mesmo é o manicômio tributário, já cantado em terras estrangeiras.

Há quem diga que passamos por uma das piores crises econômicas da história brasileira, se não efetivamente a pior. O investimento e o consumo precisam, com urgência, sair do marasmo em que estão, o que acontecerá somente com credibilidade, isto é, a volta da confiança, tanto do consumidor quanto do empresário. Em outras palavras, a retomada do crescimento econômico pressupõe relação de confiança, especialmente no que diz respeito à condução da política econômica.

Masterclass

As Ações mais Promissoras da Bolsa

Baixe uma lista de 10 ações de Small Caps que, na opinião dos especialistas, possuem potencial de valorização para os próximos meses e anos, e assista a uma aula gratuita

E-mail inválido!

Ao informar os dados, você concorda com a nossa Política de Privacidade.

O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, já deixou isso claro: vai perseguir o crescimento econômico, mas sem se valer de mecanismos liberais – seja lá o que ele quis dizer com isso. Então, deveríamos confiar na intenção do senhor ministro? Não no que se refere à tributação.

Hoje, falar em alteração dos tributos no Brasil implica, necessariamente, considerar a volta da CPMF, no entanto, quero me ater a outra questão, que tem ficado em segundo plano. Faço referência à iniciativa para tributar os dividendos, atualmente isentos, pagos pelas empresas como remuneração do capital investido pelos sócios. E não se está falando em todo e qualquer dividendo, mas somente aqueles distribuídos pelas empresas que venham a optar pelo lucro presumido, quais seja, as pequenas e médias – com faturamento anual inferior a 78 milhões de reais.

Quer receber as principais notícias de política diariamente no seu e-mail? Assine gratuitamente a newsletter do Na Real!

Continua depois da publicidade

Mantida inalterada a estrutura tributária do País, a pretensão de se tributar dividendo é escandalosamente sem sentido. O investimento produtivo seria repelido, tal como deve ser o mosquito da Zika, porque, em alguns casos, poderia vir a ser um dos retornos mais arriscados e tributados da economia brasileira. Claro que é possível encontrar, na tributação dos dividendos, uma alternativa para aumento da arrecadação e para o exercício da justiça fiscal, porém, essa deve ser apenas uma parte da ampla discussão tributária que deve ser feita no Brasil.

Está aí o primeiro sinal da esquizofrenia econômico-tributária.

Por outro lado, a fórmula mirabolante proposta para a tributação dos dividendos distribuídos pelas empresas optantes pelo lucro presumido tem ainda menos sentido. O objetivo dessa proposta, que chegou a ser incluída no projeto de lei de conversão da Medida Provisória 694, parece ser combater o que se convencionou chamar de “pejotização”, isto é, remunerar a pessoa física por meio da intermediação de uma empresa (pessoa jurídica), parecida com a conduta do jogador Neymar Jr., que está sendo questionada pela Receita Federal. Acontece que essa proposta abandona os projetos de lei que visam regulamentar exclusivamente a “pejotização”, para criar um problema para as pequenas e médias empresas, com destaque para aquelas que se dedicam à indústria e ao comércio – no que, praticamente, não se verifica o fenômeno da “pejotização”.

Em outras palavras, os investimentos feitos nas pequenas e médias indústrias ou distribuidoras (atacadistas e varejistas), em que a burocracia tende a ser menor, passarão a ser tributados, quando da distribuição dos dividendos. Os industriais e comerciantes serão equiparados aos seus empregados no quesito tributação, mantendo a gritante diferença de riscos assumidos por cada um. A medida que teria um foco específico (“pejorização”) vai prejudicar, de um lado, o investimento produtivo e, de outros, caso esse aumento seja repassado nos preços, também o consumo (além de ter impacto na inflação). Está aí o segundo sinal da esquizofrenia econômico-tributária.