Governo dá a última cartada para tentar evitar a rejeição das contas de 2014 pelo TCU

O plano é afastar o relator Augusto Nardes e conter uma possível alimentação do movimento pelo impeachment de Dilma. A semana será decisiva para se saber o efeito prático da reforma ministerial anunciada na sexta-feira no mundo político-partidário..

José Marcio Mendonça

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A presidente Dilma Rousseff joga a última cartada para tentar evitar a rejeição das contas governamentais de 2014 pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em sessão marcada para quarta-feira, depois de uma série de adiamentos a pedido do próprio governo para que pudesse apresentar melhores explicações sobre as chamadas “pedaladas fiscais”, as manobras contábeis que o relator das contas, Augusto Nardes, considera irregulares.

A manobra é a argüição de suspeição do relator Nardes, cujo parecer final, sugerindo a rejeição das contas, foi apresentado na semana passada e cujo teor foi divulgado pelos jornais. Segundo o ministro-chefe da Advocacia-Geral da União, Luis Inácio Adams, o ministro Nardes infringiu a Lei Orgânica da Magistratura ao emitir pré-julgamento relacionado à análise das contas presidenciais.

O governo escalou ontem, em plena paz do domingo, três ministros – além de Adams, José Eduardo Cardozo (Justiça) e Nelson Barbosa (Planejamento) – para anunciar a decisão e ainda defender as práticas contábeis adotadas no passado e objeto do julgamento agora. Esta ação pode protelar o julgamento, pois fica na dependência do plenário do Tribunal decidir ou não pela manutenção de Nardes. Em caso de afastamento, o processo começa da estaca zero, com outro relator.

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Analistas do próprio governo, citados na coluna “Painel”, na “Folha de S. Paulo” admitem que o governo fez uma aposta perigosa: os ministros do TCU podem considerar a ofensiva contra Nardes como uma tentativa de intimidação do Tribunal.

O governo demonstra que está muito mais preocupado que demonstrava até agora com o parecer do TCU. A decisão dos ministos sozinha não tem validade para determinar a abertura de um processo contra a presidente, necessita de ser votada e aprovada pelo Congresso Nacional. O Tribunal é um órgão de assessoramento do Legislativo.

Porém, o risco que o governo corre, a partir de uma rejeição das contas, é grande. Apesar dos acertos com os aliados nos últimos dias, que culminou na sexta-feira com a reforma ministerial (da qual saíram fortalecidos o PMDB e o ex-presidente Lula) e mais alguns ajustes administrativos, o governo não tem absoluta segurança de que garantiu os votos necessários para barrar o impeachment. E o parecer contrário alimenta a pressão pró-afastamento.

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Porteira fechada
Em princípio, com exceções pouco significativas, os partidos da base parlamentar governista e seus caciques ficaram satisfeitos com a divisão de cargos feitos pelo presidente. Nem o corte de ministérios e mais algumas secretarias e 3000 cargos pareceu doloroso.

Do lado de fora, as medidas de saneamento, embora restritas, foram recebidas como demonstração de boas intenções e bem acatadas. O governo ganhou mais um voto de confiança que já se refletiu no movimento dos mercados na sexta-feira, depois do anúncio do pacote ministerial e deve continuar reverberando positivamente hoje, salvo alguma surpresa.

Porém, do lado do mundo partidário, que é o que importa mais imediatamente, pois é ali que se jogará não apenas a batalha do impeachment como também a do restante do ajuste fiscal que ainda precisa ser aprovado, há ainda dúvidas sobre se o arranjo da “nova base” vai ser objetivo na prática.

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E a incógnita maior continua a de sempre – o irriquieto e insaciável PMDB. No papel, o partido recebeu uma fatia mais gorda do governo como nunca teve em seus melhores momentos petistas. Não só ampliou sua cota para sete ministérios, menos dois apenas que o PT, como ganhou uma pasta de grande peso político-eleitoral-social, a da Saúde.

 No bolo, ficará administrando um orçamento maior que os petistas administrarão, conforme mostrou reportagem de “O Estado de S. Paulo” no domingo. Triplicou o valor de suas verbas.

Não é pouco para um partido, que depois de anos como coadjuvante dos governos de plantão em Brasília, sonha de verdade em chegar à presidência em 2018. E para isso, na estrutura viciada e carcomida das eleições brasileiras, os tentáculos da máquina pública são sempre de grande valia. O sonho do PMDB hoje é ampliar sua capilaridade nos municípios para alavancar uma candidatura presidencial competitiva na sucessão de Dilma.

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A dúvida do PMDB e que começará a ser dissipada esta semana é se ele levou de fato o poder ou apenas no papel. Ou seja, se vai controlar de verdade os ministérios – nomeando os ocupantes dos principais postos, a começar pela secretaria-Executiva e os órgãos mais influentes – ou terá apenas o simbólico ministro.

A isso se chama ter o ministério de “porteira fechada” no jargão político da capital. E o PMDB nunca teve tal dádiva nos governos petistas. Nem ele nem nenhum aliado. E esta sempre foi a razão das queixas constantes dos outros partidos contra o PT – a fome dos petistas.

Um exemplo é o Ministério das Minas e Energia. Desde que a própria Dilma saiu de lá para substituir José Dirceu na Casa Civil, ele foi alocado ao PMDB. Mas a partir da secretaria-Executiva até a Eletrobrás e suas subsidiárias, os nomes de seus ocupantes eram apontados pela própria Dilma ou então só passavam depois do aval dela.

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O PMDB, depois que descobriu sua real importância no jogo do impeachment, quer a porteira fechadinha. Se não for assim, o risco que o governo corre é ampliar a dissidência que já existe no partido, de tamanho insuficiente no momento, mas que pode passar a incomodar. O PMDB ainda não tirou totalmente o pé do barco oposicionista.

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De olho em Levy
Uma medida desse ambiente pode ser dada amanhã: o presidente do Senado, Renan Calheiros, marcou para terça-feira a votação dos vetos presidenciais que ainda estão pendentes, entre eles o do aumento do judiciário e o da correção do das aposentadorias e pensões do INSS pelo mesmo índice de ajuste do salário-mínimo.

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A intenção é liquidar logo essas pendências, mantendo os vetos, para dar uma demonstração de que o governo tem força parlamentar e tanto a presidente quanto o Congresso mantém firme o compromisso com a preservação da saúde das contas públicas.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, no entanto, embora tenha recebido seu quinhão no novo ministério, está manobrando para adiar a votação de amanhã e assim manter a presidente Dilma sob pressão. Com isso e mais a prerrogativa de autorizar ou não a abertura de um processo de impeachment, Cunha espera manter “amigos solidários” com suas agruras na Operação Lava-Jato e o risco da cassação do próprio mandato. Entre eles Dilma, Lula e o PT.

Para complicar a situação da presidente, os jornais do fim de semana traziam informações, de fontes não identificadas, obviamente, que o PT e o ex-presidente Lula ainda querem mais um espaço no novo ministério: o objetivo seria, agora, afastar o ministro Joaquim Levy e detonar sua política fiscal.

Segundo o repórter Raymundo Costa, no “Valor Econômico” de hoje, a situação de Levy ficou parecida com a de Aloizio Mercadante na fase final da discussão da reforma ministerial.

Não por coincidência, a recém-lançada Frente Brasil Popular, que reúne mais de 20 entidades – entre elas a CUT, o MST e a UNE -, promoveu em várias cidades do país, no sábado, manifestações públicas em defesa da Petrobrás, da democracia e contra o ajuste fiscal. A adesão foi baixíssima, mas outros eventos idênticos estão sendo programados.

Outros destaques dos

jornais do dia

– “Pobreza extrema afetará 10% da população do mundo” (Globo)

– “Inflação pode ultrapassar teto em 2016, dizem analistas” (Estadão)

– “Aeronáutica reduz em até 100 metros altura de prédios na área de aeroportos” (Estadão)

– “Infraero terá parcerias nos aeroportos” (Valor)– “TCU aponta irregularidade em acordo entre empresas e ANTT” (Valor)

– “Desembolsos do Minha Casa Minha Vida caem 21% em 2015” (Valor)

– “Nordeste eleva impostos para reforçar caixa em 2016” (Valor)

LEITURAS SUGERIDAS

  1. Claudio Adilson Gonçalez – “Presidente precisa tomar as rédeas do ajuste fiscal” (diz que resta ao governo lançar mão de medidas amargas, mas no incêndio não se vê a qualidade da água que vai apagar o fogo) – Estadão
  2. Editorial – “Ladeira abaixo” (diz que erros de Dilma e corrupção derrubam o Brasil em ranking de competitividade, mas deficiências notadas são mais amplas e enraizadas) – Folha
  3. Ângela Bittencourt – “Dilma ganha sobrevida e Levy o desafio de crescer” (diz que reforma ministerial ajuda presidente a afastar o impeachment, mas aumenta pressão sobre política econômica) – Valor
  4. Editorial – “Perdas com swaps crescem e viram uma questão fiscal” (diz que sob qualquer ótica os números são vultosos: as perdas acumuladas até agosto equivalem a 2% do PIB) – Valor