Lula tenta ajudar, mas nova ação da PF envenena ainda mais o ambiente político

Ex-presidente esteve em Brasília para um “toque de reunir” com Dilma e os ministros. O mundo político, porém, entrou em pânico e de novo negou ajuda à presidente em medidas cruciais na área econômica

José Marcio Mendonça

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SÃO PAULO – Depois de mais de um mês sem se encontrar pessoalmente com a presidente Dilma Rousseff (e, segundo informações confiáveis, sem se falarem por qualquer meio) o ex-presidente Lula, convidado pela pupila, desembarcou em Brasília para tentar colocar o governo em ordem. Lula já tinha expressado em várias ocasiões sua insatisfação com a forma como Dilma (e o governo) agiam e se comunicavam.

A reorganização das tropas oficiais é considerada essencial para tirar Dilma do “volume morto” (expressão dele, Lula) no qual se encontra. A presidente fez tentativas na semana passada, antes do embarcar para a Europa – os resultados, porém, foram tênues. Lula, na ausência da presidente, também se esforçou para organizar uma “ordem” unida, conversando em Brasília com as bancadas do PT na Câmara e no Senado e com os caciques do PMDB – também inutilmente.

Mesmo depois disso, o governo continuou passando por “perrengues” no Congresso Nacional e com os aliados. Diante do agravamento da situação, tanto a política quanto a econômica, Lula fez outra investida ontem. Conversou com a presidente e ministros petistas por quatro horas no Palácio da Alvorada e encontrou-se também com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Distribui conselhos, quase ordens segundo algumas informações vazadas para a imprensa. 

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Repetiu o que já vinha falando reservadamente: Dilma tem de sair da agenda negativa “ajuste fiscal-Lava-Jato”, comunicar-se mais com empresários, com os movimentos sociais e com os políticos, viajar pelo Brasil e inaugurar, inaugurar… Levy tem de comunicar ao público as medidas pós-ajuste. Lula agiu, segundo uma maldosa língua governista no Congresso, dessas que ainda conseguem manter o humor diante de tantas adversidades, como um “co-presidente”.

Por coincidência ou não, à noite, em São Paulo, num evento promovido pelo PT estadual, a grande palavra de ordem foi “Lula 2018”. 

Brasília em tensão máxima
O problema é que Lula chegou à capital no momento em que a Polícia Federal desencadeava em seis estados e no Distrito Federal mais um desdobramento da Operação Lava-Jato, subintitulada “Politeia”, de busca e apreensão em casa de políticos e agregados, atingindo em cheio o ex-presidente Fernando Collor, outros políticos, ex-ministros e adidos. O mundo político em geral e o Senado em particular entraram em polvorosa. 

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Lula mesmo sentiu na hora o cheiro de queimado. Conforme reportagem de “O Estado de S. Paulo”, o ex-presidente advertiu seus interlocutores no Palácio da Alvorada que eles devem se preparar, pois “a situação vai ficar pior”. Diz o jornal que Lula não escondeu sua irritação com a PF. O Senado, a começar pelo presidente da Casa, senador Renan Calheiros, foi ao extremo de ataques à Polícia Federal e ao procurador Rodrigo Janot.

O temor é que venham, em breve, a “Politeia 2”, a “Politeia 3” … contra outros núcleos políticos. No PMDB assusta-se com a possibilidade de ser ele a bola da vez. Dois de seus expoentes, os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Eduardo Cunha, já foram citados em delações premiadas de empresários e executivos das empreiteiras. Ambos há muito culpam o Palácio do Planalto pela divulgação desses fatos – razão pela qual já dificultam a vida do governo no Congresso. 

E ontem, depois do episódio, voltaram a mostrar sua irritação com o Palácio do Planalto, negando-se a colaborar com os pedidos do ministro Joaquim Levy e os apelos da própria Dilma para apressar a definir projetos essenciais para a complementação do ajuste fiscal.

Renan Calheiros não aceitou votar antes do recesso (ou seja, deixou para agosto ou mais tarde) a votação da “reoneração” da folha de pagamentos e da nova proposta de unificação do ICMS. Eduardo Cunha, por seu turno, avisou que a Câmara não aceitará assinar embaixo das negociações de Levy com o Senado na questão no novo ICMS e quer ser ouvida – ou nada. 

No caso do ICMS, para complicar, as divergências não são somente de teor “político”. Há insatisfações também quanto a conteúdo da proposta. Tanto parlamentares quanto alguns governadores querem que a proposta de Levy contenha, por exemplo, garantias sobre os recursos que vão bancar as perdas estaduais com a unificação da alíquota de seu principal imposto.

Querem o fundo a ser criado com “fundos” reais. Sugerem, até mesmo, para não serem surpreendidos depois por “manobras fiscais” que as mudanças sejam inscritas na Constituição. No caso, segundo cálculos do Congresso citados pelo “Valor Econômico” o governo poderia nadar em dinheiro: a arrecadação total com a repatriação ficaria entre R$ 100 bilhões e R$ 150 bilhões.

O Palácio do Planalto até teria colhido alguns frutos com a “Politeia”: o Tribunal de Contas da União (TCU), que ameaça reprovar as contas de Dilma de 2014, também entrou no samba. Um dos investigados é um advogado, filho do presidente do órgão, Aroldo Cedraz, rapaz que, segundo suspeitas, evoluiu profissionalmente por ter o pai tribunal. Foi citado ainda no imbróglio o ministro Raimundo Carreiro. 

No entanto, o ambiente político ficou mais envenenado para a presidente no Congresso por causa da dupla Calheiros/Cunha.

Outros destaques dos jornais do dia 

– COLIGAÇÕES PARTIDÁRIAS MAIS DIFÍCEIS – Apesar de ter mantido na votação da reforma política a possibilidade de coligações nas eleições, a Câmara aprovou duas mudanças no projeto que desencorajam a formação desses blocos de união de partidos. A primeira delas permite às legendas que não estejam coligadas lançarem um número maior de candidatos e a segunda determina que só seja contabilizado o tempo de propaganda gratuita dos seis maiores partidos da coligação. Os deputados aprovaram ainda uma emenda que isenta os dirigentes partidários de responsabilizações no caso de ausência de prestação de contas ou de rejeição das contas. A alteração diz que a sanção nesses casos será aplicada “exclusivamente à esfera partidária responsável pela irregularidade”, sem tornar inadimplentes os respectivos responsáveis partidários. A mesma emenda diz que não será suspenso o registro do partido responsabilizado pela Justiça Eleitoral por falta de prestação de contas ou sua desaprovação total ou parcial.

– INADIMPLÊNCIA CRESCE – A desaceleração da economia, o encarecimento do crédito e o avanço da inflação, reduzindo o poder de compra, estão aumentando a dificuldade para o consumidor pagar suas contas em dia. Dados do SPC Brasil mostram que, nos seis primeiros meses de 2015, o número de consumidores com contas atrasadas e registrados nos cadastros de inadimplência aumentou 4,60%. É o pior resultado semestral dos últimos três anos. Segundo o relatório, a quantidade de dívidas no período acumula alta de 6,65%, sendo que as dívidas com atraso de até 90 dias subiram 19,30% e as pendências entre 91 a 180 dias cresceram 24,74%. A quantidade de dívidas do setor de Água e Luz registrou variação de 11,83% no semestre. Se considerarmos só junho, a alta foi de 15,61% frente ao mesmo mês de 2014 e de 8,05% em relação a maio — bem acima da média de -0,86% e o maior aumento entre todos os setores no mês. 

– A QUEDA NAS VENDAS DO COMÉRCIO – O comércio varejista restrito (excluídos veículos e material de construção) mergulhou de vez no vermelho em maio, com uma queda de 0,9% nas vendas. Esse desempenho levou a uma virada no resultado acumulado em doze meses. Até abril, o comércio registrava uma alta de 0,4%. Agora, apresenta uma queda de 0,5% – o primeiro resultado negativo em mais de 11 anos. Os dados revelam a piora de setores que dependem da renda dos trabalhadores, entre eles os supermercados, onde os consumidores chegam com listas de compras cada vez menores. No comércio varejista ampliado a queda foi de 1,8%. 

E MAIS:

– “Potências fecham acordo com o Irã e país volta ao circuito diplomático” (Estadão/Folha/Globo)

– “Lançamento de imóveis na cidade de São Paulo recuam 18,6%” (Estadão)

– “Novas concessões devem ter pedágio mais alto” (Estadão)

– “Leilão de portos terá taxa de retorno de 10%” (Folha)

– “PIB chinês surpreende e cresce 7% no segundo trimestre” (Estadão/Folha)

– “Petrobras estuda privatizar até 80% dos seus gasodutos” (Folha)

– “Novo PIS pode onerar serviços” (Globo)

– “Governo vai leiloar a folha de servidores” (Valor)

– “Dnit repassa duplicação da BR-163 em Mato Grosso à Odebrecht” (Valor)

LEITURAS SUGERIDAS

1. Editorial – “Crise moral” (critica os argumentos dos ministros para defender as “pedaladas fiscais”) – Estadão 

2. Celso Ming – “Mal na foto, mal no filme” (comenta a queda na atividade do comércio varejista em maio e diz que esse quadro tende a persistir) – Estadão

3. Bernardo Mello Franco – “Tempos sombrios” (comenta as reações iradas do Senado à nova ação da PT na seqüência da operação Lava-Jato) – Folha