Dilma se arma e parte para o ataque em defesa do mandato

A presidente deu entrevista dura à “Folha”, reuniu aliados para reagrupar a tropa governista e lançou um programa para evitar a disseminação do desemprego. Tudo para tirar o governo da apatia e calar as especulações e os boatos de que sua vida no Palácio do Planalto pode ser abreviada.

José Marcio Mendonça

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A presidente Dilma Rousseff, de viagem marcada hoje para a Europa, de onde só retorna na sexta-feira, agiu ontem em várias frentes para tirar seu governo “das cordas” e retomar a iniciativa do processo político, depois que os boatos e especulações a respeito do fim precoce de seu mandato passaram a assombrar o Palácio do Planalto desde sexta-feira e a oposição deu sinais de que já não acredita que ela fique por lá até 2018 e ainda avisou que está pronta para governar se isto acontecer.

A sua principal ação, contrariando seus hábitos de evitar questionamentos mais duros da imprensa, foi uma entrevista exclusiva ao jornal “Folha de S. Paulo”, publicada hoje. Em conversa com Maria Cristina Frias, Valdo Cruz e Natuza Nery, Dilma, entre outras coisas, desafiou os que a acusam a provarem que ela pegou “um tostão” que seja de dinheiro público e avisou que é uma mulher acostumada à luta e não vai cair.

A presidente declarou também que o PMDB é “ótimo” e não se sente no volume morto, com disse Lula dela há poucos dias. “Não me atemorizam”, alertou, segundo os repórteres com o dedo em riste.

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A presidente falou ainda de economia, disse que prepara novas medidas para ampliar o ajuste fiscal e garantiu que fará “o diabo”para atenuar a recessão. Ela admitiu que o ajuste gera um pouco de desemprego.

Dilma agiu ontem com presteza porque, embora sua defesa tenha sido dirigida diretamente à oposição – a quem chamou de golpista e avisou que vai defender seu mandato com unhas e dentes -, sabe que essas conversas sobre sua saída passavam também (e muito) por parcelas da base aliada e são também tema de confabulações empresariais.

O PT estava/está em pânico. O deputado Devanir Ribeiro, o petista mais lulista do PT, disse que a bancada do partido está acuada. Uma reunião dos petistas federais ontem em Brasília, segundo “O Globo” foi um muro de queixas.  Reportagem do “Valor Econômico” diz que a tese do impeachment ganha adeptos no PMDB.

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A ação mais objetiva da presidente se deu no campo econômico e social, numa tentativa de agradar tanto empresários quanto trabalhadores, ambos assustados com o aumento real dos riscos de desemprego. De surpresa, o governo anunciou o lançamento de um Plano de Proteção do Emprego (PPE) para permitir a redução da jornada de trabalho e de salários em empresas dificuldades, com o próprio governo e os trabalhadores dividindo o prejuízo.

Os salários podem ser diminuídos em até 30%, com o governo compensando os funcionários em 15% dessa redução e eles arcando com os outros 15%. O PPE estava em estudos e debates havia algum tempo, mas ainda não estava finalizado em seus detalhes. Tanto que seu anúncio ontem foi apenas nas linhas gerais, com o envio da Medida Provisória para o Congresso. Segundo analistas, ainda precisará de alguma regulamentação para valer na prática. Os setores que poderão aplicar o PPE serão definidos por um comitê especial, ainda não escolhido.

Em princípio, a medida foi bem recebida. Os trabalhadores consideraram um avanço ao lay-off. O custo do programa não foi informado. A parcela do governo será bancada com dinheiro do Fundo do Amparo ao Trabalhador (FAT), que já anda com seus recursos excessivamente comprometidos. O governo acha que será vantajoso para os cofres públicos, pois gastará menos com a complementação dos 15% do PPE que gastaria com o pagamento do seguro-desemprego em caso de demissões.

Na frente política, a preocupação com o TCU

A outra frente de ataque do Palácio do Planalto foi totalmente no campo político, com ações para reagrupar a tropa aliada, acabar (ou mascarar) divergências, mostrar unidade e, principalmente, defender a presidente de ações que podem realmente criar problemas legais para ela. Uma é o desdobramento das delações na Operação Lava-Jato que podem envolver as campanhas de 2010 e 2014 com dinheiro das falcatruas na Petrobras e gerar processos no TSE e STF contra a própria presidente.

Outra é o processo no TCU de julgamento das contas federais de 2014. O prazo para o governo apresentar a defesa das “pedaladas” consideradas em princípio irregulares pelo relator do processo no Tribunal termina no dia 22 e o governo já detectou que a tendência dos ministros é de não aprovar as contas. O julgamento final é do Congresso e para isto o governo precisa de suas tropas bem calminhas.

O que não se dá no momento – por disputas entre os partidos pelo comando a articulação política (PT e PMDB) e pelo não atendimento das promessas de nomeações e liberação das verbas das emendas parlamentares. O governo vai dar argumentos e verbas para deputados e senadores votarem contra a rejeição das contas presidenciais.

Pela manhã, na reunião do grupo da coordenação política, procurou-se aparar estas arestas, principalmente as queixas do PMDB de que os ministros palacianos petistas (leia-se Aloizio Mercadante) boicotam os acordos acertados pelo articulador oficial Michel Temer com os aliados em troca de votos nos projetos de ajuste fiscal do ministro Joaquim Levy. Esse desacordo, inclusive, é que está levando parte do PMDB a defender abertamente que Temer abandone a função de articulador do governo junto aos partidos e ao Congresso.

Aparentemente resolvida a questão, Temer, que nos últimos dias andou silencioso, deu uma entrevista no próprio Palácio do Planalto para negar qualquer divergência – até mesmo a questão do decantado boicote – e garantir que continuará cumprindo a missão que Dilma pediu a ele para assumir.

À noite, sem que constasse da agenda, convocada às pressas, a presidente fez uma reunião do Conselho Político do governo (presidentes e líderes do partidos aliados no Congresso) para também ajustar o discurso e tirar pedregulhos do caminho.

Segundo os jornais, Dilma apresentou a defesa das “pedaladas fiscais”, hoje talvez a maior preocupação do Palácio do Planalto. Os argumentos jurídicos e econômicos para que os líderes defendam o governo caso as contas sejam consideradas irregulares pelo TCU foram apresentados pelos ministros Nelson Barbosa (Planejamento) e Luís Adams (Advocacia-Geral da União).

Na busca total da pax aliada, ao final da noite, a presidente, junto com Michel Temer, teve uma reunião reservada com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, a maior pedra no sapato governista no Congresso. Cunha havia desembarcado à tarde na capital dizendo que o boicote contra Temer era fato, embora já tivesse sido negado pelo vice pela manhã.

Agora, é ver se as contas espetadas por Temer começarão mesmo a ser pagas. Sem o “Diário Oficial” e com o governo enfrentando dificuldades na economia, a fidelidade aliada tem limites – e preços.

 Outros destaques dos

jornais do dia

– POUPANÇA CAI MAIS UMA VEZ – O brasileiro sacou R$ 6,3 bilhões a mais do que depositou na caderneta de poupança no mês passado. É o pior resultado da aplicação financeira mais popular do país em meses de junho, desde o começo da série histórica em 1995, por causa de uma combinação de fatores: queda da renda por causa da inflação, aumento do desemprego e alta dos juros. Houve mais retiradas do que aportes em todos os seis primeiros meses de 2015. No semestre, os saques ultrapassaram os depósitos em R$ 38,5 bilhões, recorde também desde o início da série histórica. Até então, o ano com o pior desempenho da aplicação foi o de 2003, quando as retiradas foram R$ 10,4 bilhões maiores que os saques no total dos 12 meses.

– FMI PRONTO PARA AJUDAR A GRÉCIA – A diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, em um lacônico comunicado a respeito do referendo de domingo na Grécia, no qual a população, por ampla maioria, decidiu não aceitar novas medidas de austeridade exigidas pelos credores reunidos na chamada troika — Comissão Europeia, Banco Central Europeu e o próprio FMI, informou que ela e o Fundo Monetário estão “prontos para ajudar a Grécia”, se forem solicitados. Lagarde não entrou em detalhe sobre o tipo de assistência possível. Por seu lado, Os líderes da França e da Alemanha, François Hollande e Ângela Merkel, disseram ao governo da Grécia que a porta continua aberta para negociações com os credores, mas pediram que o país faça propostas rapidamente para alcançar um acordo que libere recursos financeiros em troca de reformas econômicas.

– FINANCIAMENTO PRIVADO DE CAMPANHAS – Pesquisa do Instituto Datafolha mostra que 74% dos brasileiros são contra o financiamento de campanha por empresas privadas. Outros 16% são a favor e 10% não sabem. Segundo o mesmo levantamento, 79% dos entrevistados acreditam que as doações de empresas estimulam a corrupção. A pesquisa foi encomendada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), defensora do fim do financiamento empresarial. Quanto maior a escolaridade, maior a defesa do fim desse tipo de financiamento: 80% entre os que têm curso superior, 77% no grupo com ensino médio, e 68% entre aqueles apenas com o fundamental. Em relação à renda familiar, o grupo que mais se opõe ao financiamento empresarial é aquele que recebe entre cinco e dez salários mínimos: 82%. Os homens (78%) querem mais o fim do financiamento empresarial que as mulheres (70%).

– PRODUÇÃO DE VEÍCULOS EM QUEDA – A produção de veículos no Brasil caiu 18,5% no primeiro semestre deste ano, em relação a igual período do ano passado, e as vendas encolheram 20,7% Nos seis primeiros meses deste ano, as montadoras fabricaram 1,277 milhão de unidades, número que indica um resultado ainda pior do que o projetado para a Anfavea para este ano, que era chegar a 2,58 milhões de veículos fabricados, 17,8% menos do que em 2014. No mês de junho, a produção caiu 14,8% frente a igual mês do ano passado. As vendas, por sua vez, caíram 19,4%, para 212,5 mil unidades. Na comparação com maio, houve retração de 12,5% na produção de carros comerciais leves, caminhões e ônibus novos, com queda em todas as linhas. Já as vendas encolheram 0,1%, somando um total de 212,5 mil unidades.

 

E MAIS:

– “[depois do Judiciário] Senado põe em discussão aumento do Ministério Público” (Estadão)

– “Bradesco e Satander fazem oferta pelo HSBC [Itaú teria ficado de fora]” (Estadão)

– “PMDB do Senado quer fim de exceções em desonerações” (Valor)

– “Equipe [econômica] teme que correção do FGTS afeta crédito à habitação” (Valor)

LEITURAS SUGERIDAS

1.      Ilan Goldfajn – “Qual é o diagnóstico?” (diz que sem um boa dieta –redução de custos – o Brasil não conseguirá crescer de forma sustentável. O processo será penoso) – Estadão/Globo

2.      Bernardo Mello Franco – “Dilma está atrasada” (comenta a entrevista da presidente à “Folha” e diz que ela finalmente entendeu que está com a cabeça a prêmio) – Folha

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