Dólar dispara 20% e tem maior alta trimestral desde 2011 entre ajuste fiscal e EUA

Moeda teve metade da sua alta apenas em março, com a deterioração das projeções econômicas, tensões políticas podendo afetar ajustes do governo e expectativa por alta de juros nos EUA

Rodrigo Tolotti

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SÃO PAULO – Parece que faz muito tempo, mas até o início de março, o dólar comercial ainda não tinha superado os R$ 3,00 em 2015, mesmo com praticamente todos os especialistas indicando que a moeda iria ficar acima deste patamar neste ano, provavelmente no primeiro semestre ainda. Após encerrar 2014 em R$ 2,6587 na venda, a divisa já disparou 20% em três meses, registrando no primeiro trimestre seu melhor desempenho ante o real desde 2011.

Nesta última sessão do trimestre, o dia ficou marcado pelo discurso do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que mostrou comprometimento com o ajuste fiscal e trouxe ânimo ao mercado, e, mais cedo, pela formação da Ptax. O dólar fechou com queda de 1,26%, a R$ 3,1897 na compra e R$ 3,1909 na venda.

Após abrir com forte alta, a moeda virou durante a manhã enquanto grandes agentes puxavam a cotação para baixo na tentativa de levar a Ptax (taxa de câmbio calculada pelo BC e que serve de referência para a liquidação dos contratos futuros e outros derivativos) para baixo. Nas operações de venda de swap cambial, os investidores que compram esses contratos ganham a variação cambial do período, e por isso, o interesse de comprarem o dólar a uma taxa baixa.

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Durante a tarde, o que colaborou para a manutenção do dólar em queda ante o real foi o discurso de Levy no Senado, com o ministro mostrando urgência para encontrar soluções sobre o ajuste fiscal, o que animou o mercado. Em audiência na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos), Levy destacou o custo alto de o Brasil perder o grau de investimento, e, por isso, tem se esforçado nas relações com o Senado para aprovar as medidas de ajuste fiscal e rever a aprovação do projeto de lei que prevê a mudança de indexador dos Estados e municípios, o que poderia afetar o cumprimento da meta de superávit primário de 1,2% do PIB para este ano. 

Ao sair do encontro, Levy disse que está confiante em relação a um acordo para renegociação da dívida dos estados, cujo votação do projeto de lei estava prevista para hoje. O ministro ainda destacou que, sem o equilíbrio fiscal, os juros no Brasil “não vão descer”.

O fim do dólar abaixo de R$ 3,00
Desde o resultado das eleições, a expectativa era que o dólar iria subir com força em 2015 já que com Dilma se mantendo no poder a economia iria continuar a se deteriorar. Mesmo assim, a moeda relutou em iniciar o movimento de alta, enquanto o mercado dava credibilidade para os primeiros discursos de Joaquim Levy como ministro da Fazenda, o que ajudava a manter um certo otimismo entre os investidores e segurava a divisa em níveis próximos a R$ 2,70.

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No radar, dois eventos deixavam os investidores apreensivos: a alta de juros nos EUA e o programa de intervenções diárias do Banco Central brasileiro. As projeções dos analistas sempre foram de que o BC não iria manter os leilões diários de swap, um dos mecanismos da autoridade brasileira que ajudou a segurar a alta do dólar nos últimos tempos, e de que o Federal Reserve iria elevar os juros ainda este ano, o que promete disparar a cotação da moeda norte-americana em todo o mundo.

Em relação ao BC, a notícia finalmente veio na semana passada e nesta terça-feira ocorreu o último leilão ainda dentro do programa, que deixa de existir a partir de amanhã. Enquanto isso, o Fed ainda não deu uma sinalização clara, mas afirmou que as chances dos juros serem elevados ainda este ano nos EUA são grandes. Atualmente, as projeções se dividem entre uma alta já em junho ou apenas em setembro.

A arrancada
Se por pelo menos um mês o dólar se manteve longe dos R$ 3,00, em fevereiro a moeda começou a subir com força, seguindo as projeções dos especialistas. A cada pregão, a divisa quebrava seu maior nível em 10 anos, diante de uma piora dos dados econômicos e aumento dos riscos sobre o ajuste fiscal programado pelo governo. Enquanto isso, ganhava força a expectativa de um anúncio sobre a alta de juros nos EUA, o que levou o dólar a renovar máxima ante diversas moedas pelo mundo.

Especialistas apontam que chegou o momento do dólar “encontrar seu patamar justo” e que esse valor seria pelo menos de R$ 3,10 – variando para cada analista. Com isso, o País conseguiria ajustar um pouco as suas contas e estimular a indústria nacional, mesmo que isso gere uma maior pressão inflacionária – que seria controlada por meio de novas altas na Selic.

Em meio a uma piora do sentimento sobre a economia, o ministro Joaquim Levy deixou claro em diversas entrevistas que o governo não tem intenção de controlar o dólar, o que ajudou a dar liberdade para a moeda seguir avançando, até que no dia 5 de março a divisa fechou pela primeira vez acima de dos R$ 3,00.

Desde então, a manutenção do clima pessimista com a economia, combinado com um aumento da tensão política, fez o dólar subir com muito mais força do que os mais pessimistas podiam imaginar. Para se ter uma ideia, entre dia 5 de março e dia 19, a moeda disparou 10%, atingindo sua máxima desde 2003, aos R$ 3,30. No dia 11, a LCA Consultores afirmou que a alta era exagerada, e até semana passada, ainda acreditava que o dólar segue com espaço para cair.

O maior risco agora está sobre os medos que envolvem o ajuste fiscal do governo. Com Dilma sem apoio no Congresso, muitos dos projetos que ajudariam a enxugar os gastos do governo estão encontrando dificuldades na Câmara e no Senado, o que tem deixado o mercado temeroso sobre a realização e a efetividade destes ajustes.

“A discussão sobre a conjuntura macroeconômica e os cenários para o futuro próximo se deslocaram, recentemente, dos indicadores de atividade econômica e inflação para a arena política”, explicam os analistas da LCA. “A crise política é grave […] e pressiona o risco Brasil à medida que coloca em sério risco as medidas de ajuste fiscal das quais depende o ajuste da contas públicas”, disseram em relatório na última semana.

Para os próximos meses, ainda há muitas diferenças nas projeções, mas é praticamente unânime que no fim do ano o dólar estará acima de R$ 3,00, porém, no curto prazo, há quem aposte na moeda podendo voltar até para próximo de R$ 2,90Na mais recente pesquisa Focus do Banco Central – que compila a opinião de diversos especialistas – a perspectiva para o dólar subiu para R$ 3,20 no fim deste ano. Para 2016, os economistas consultados projetam a moeda a R$ 3,23.

Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.