Mercado precifica alta de juros com reforma da Previdência desfigurada

"Os traders estão enxergando que a reforma que está passando é a que dá para passar, o que está longe de ser a perfeita", observou Pablo Spyer, diretor da mesa de trade da Mirae Asset Wealth Management

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Um movimento curioso dos mercados chamou atenção na última terça-feira (25). No mercado de renda variável, o Ibovespa encerrou o pregão na máxima do dia, embalado pelo otimismo internacional nas expectativas pelo anúncios de reformas fiscais pelo governo Donald Trump nos Estados Unidos — onde o índice composto de Nasdaq atingiu a máxima histórica — e pela aprovação com folga do projeto de reforma trabalhista em comissão especial na Câmara dos Deputados. Já do lado da renda fixa, os DIs longos dispararam, com os contratos com vencimento em janeiro de 2021 (DIF21) avançaram 12 pontos-base, a 10,04%. Os contratos curtos também subiram, mas em um movimento bem mais contido: os DIs com vencimento em janeiro de 2018 (DIF18) avançaram 3 pontos, a 9,53%. Normalmente, a correlação entre Ibovespa e juros futuros é inversa (quando um sobe, o outro costuma cair).

Às 9h34 (horário de Brasília) desta quarta-feira, os contratos de juros futuros DIF21 subiam 12 pontos-base, a 10,16%, ao passo que os papéis DIF18 avançavam 2 pontos-base, a 9,54%.

“Os traders estão enxergando que a [versão da] reforma [da Previdência] que está passando é a que dá para passar, o que está longe de ser a perfeita”, observou Pablo Spyer, diretor da mesa de trade da Mirae Asset Wealth Management. Com uma reforma abaixo do que o mercado entende como ideal, há riscos de as mudanças não serem suficientes para alterar a perspectiva do crescimento das despesas públicas. E os investidores de renda fixa já estão de olho nesta possibilidade — elevada com a decisão da cúpula do PSB por fechar questão contra as reformas do governo Michel Temer, apesar dos efeitos práticos ainda questionáveis.

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“Os juros terão que subir [no longo prazo]. Infelizmente, essa é a visão do mercado”, explicou Spyer. Entretanto, no curto prazo ele chama atenção para o mercado precificando um novo corte de 100 pontos-base na Selic. “A economia está muito fraco, a inflação está zero por conta do desemprego. Está claro que os juros vão cair. As apostas para corte de 125 pontos seguem em 40%”, ao passo que as chances de redução em 100 pontos-base ficaram em 60%. Na segunda-feira, essa proporção estava em 45%/55%.

Do lado da bolsa, o dia começou em queda, com os mercados preocupados com o risco de contágio da oposição do PSB. No entanto, ao longo do dia, percebeu-se que o próprio partido estava dividido — o que ficou evidente na votação da reforma trabalhista em comissão especial. Com uma votação de 27 a favor e 10 contra, o governo conseguiu demonstrar força na comissão, com poucas dissidências na base, o que indicava governabilidade e alguma tração para avançar na reforma previdenciária.

No sentido oposto, durante a noite, o governo sofreu uma importante derrota no plenário durante a votação de um dos destaques do projeto que trata do socorro a Estados em situação de insolvência. O texto previa aumento de 11% para, pelo menos, 14% na contribuição previdenciária de servidores estaduais, mas os deputados retiraram tal exigência do projeto. Para que o texto original fosse mantido, eram necessários 257 votos. O governo conseguiu apenas 241 votos, ao passo que a oposição conseguiu apoio de 185 parlamentares — lembrando que, formalmente, tal bancada conta apenas com 100 deputados, o que mostra que houve elevado nível de infidelidade.

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Relator do projeto que estabelecia as contrapartidas aos Estados no programa de socorro, o deputado Pedro Paulo (PMDB-RJ) disse que o texto original não foi desfigurado, mas reconheceu um cenário difícil ao governo: “A Previdência deu um sinal de que o assunto é delicado e tem que ter atenção especial”. A votação indicou dificuldade do governo em conseguir mobilizar a própria base para aprovar um tema relacionado com a Previdência. Tal situação já é observada por parcela dos investidores, sobretudo no caso do mercado de juros futuros, como observou Spyer.

A preocupação com a reforma da Previdência é o principal driver observado pelos gestores da Verde Asset. Em entrevista exclusiva ao InfoMoney, Luiz Parreiras manifestou incômodo com o que ele chamou de apatia do mercado com a diluição da proposta original encaminhada pelo governo ao Congresso. “Os preços até agora não refletem essa piora. Mas tem um número mágico — que não sei qual é — que será o ‘grão de areia’ que fará o mercado dizer ‘nossa, agora ficou difícil!’ É esse o jogo que está começando a ficar perigoso”, disse (confira a entrevista na íntegra). 

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.