Os segredos do Tape Reading: “não me interessa se a bolsa sobe ou cai, eu quero volatilidade”

Com 20 anos de experiência de mercado, Cleber Rocha trocou a análise técnica pela leitura de fluxo para se adequar à nova realidade do mercado

Thiago Salomão

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SÃO PAULO – Desconhecido por muitos até ano passado, o “Tape Reading” já deixou de ser uma novidade do mercado financeiro e tem se firmado cada vez mais como a 3ª via para o investidor que não quer seguir as tradicionais análises gráfica ou análise fundamentalista. E se você tem ainda tem dúvidas – ou resistências – sobre conhecer o mundo da “leitura do fluxo de ordens”, a história do “ex-grafista” Cleber Rocha pode te encorajar a entrar nesse novo mundo.

Rocha opera no mercado desde 1996, quando trabalhava no pregão do viva-voz – ele foi inclusive um dos primeiros operadores a negociar os minicontratos futuros de Ibovespa. Em 2007, depois da troca dos “pits” de negociação pelo ambiente virtual, Rocha, que é analista técnico certificado pela Apimec, não estava conseguindo se adaptar ao novo mercado. Foi aí que ele migrou para o Tape Reading. “Eu não tinha mais consistência operacional. Se eu não tivesse mudado meu perfil, já estaria fora do mercado”, disse o trader em entrevista ao InfoMoney.

Hoje ele é o especialista em contratos de Ibovespa Futuro (que na prática é o contrato que representa o Ibovespa “à vista” acrescido da taxa de juros do período) da XP Investimentos. Durante a entrevista, Rocha – que irá ministrar um curso online de formação para tape reading neste fim de semana – aponta quais os caminhos para o investidor ingressar no mundo do Tape Reading e por que ele acredita que a leitura de fluxo irá substituir a análise técnica no longo prazo “A tendência é o leitor de fita superar o leitor de gráfico”. 

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Veja abaixo os principais destaques da entrevista. Para saber mais sobre tape reading, veja o quadro ao final da matéria:

InfoMoney – Desde quando você está no mercado?

Cleber Rocha – Estou desde 1996 no mercado. Vivi o pregão do viva-voz. Comecei auxiliar, passei a ser operador e depois a girar capital de carteira.

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IM – Hoje em dia, no mundo virtual, é mais fácil operar via tape reading do que na época do viva-voz?

CR – Até 2007 você tinha o “olho no olho”, se atentava em sinais corporais como a entonação da voz e como o outro trader falava. Hoje em dia, o mercado dá oportunidade para todos. Ele é mais transparente e de muito mais fácil acesso. A desvantagem é que no passado você tinha um parceiro sempre ao seu lado que te ajudava nas operações. Hoje, você opera por conta própria. 

 Outra vantagem hoje em dia é que temos uma base teórica enorme na internet para te ajudar. Tem material de qualidade sobre livro de ofertas, o que antes era quase inexistente. Mas é preciso ir com calma. Eu mesmo demorei muito para virar trader.

IM – Como foi a sua adaptação ao “novo” tape reading?

CR – Foi difícil. O mercado mudou por causa da entrada dos algoritmos no Brasil e eu tive que praticamente reaprender sobre tape reading. Isso foi em 2010. Se eu não mudasse, eu não iria conseguir acompanhar essa mudança e não teria consistência. Nessa época, muitos traders que não conseguiram se adequar saíram do mercado. Eu só entrei no ritmo de novo em meados de 2014. É um aprendizado constante e até hoje eu aprendo.

IM – Embora seja uma escola distinta das duas tradicionais, o “tape reading” possui mais traços semelhantes com a análise técnica do que com a análise fundamentalista. Você, que é analista técnico certificado, poderia explicar qual a principal diferença entre a análise gráfica e o tape reading?

CR – Na análise gráfica, você precisa esperar por uma confirmação para tomar uma decisão de investimento – seja essa confirmação um repique, ou um rompimento de suporte/resistência, formação de pivô etc. Já no tape reading, você opera o presente, na hora, no ato. A cada confirmação que a análise técnica traz, o tape reading te dá várias entradas e saídas em operações. 

IM – E por que você trocou a análise técnica pelo tape reading? 

CR – Porque eu não tinha mais consistência operacional. Se eu não tivesse mudado meu perfil, eu estaria fora do mercado, como muitas pessoas da época do “viva-voz” que não conseguiram se encaixar às mudanças da Bolsa.

IM – Quem opera via tape reading convive diariamente com os “robô traders”, que são os algoritmos programados para fazer várias operações em centésimos de segundos. Como conviver com eles?

CR – Quando eu comecei a estudar tape reading, eu nem podia ouvir a palavra robô; hoje, ele é meu aliado, principalmente como liquidez. Você pega por exemplo o mini índice do Ibovespa Futuro, que tem muita volatilidade em poucos lotes: os robôs operam de 20 a 30 pontos; se você não é paciente para esperar o momento certo, você não consegue operar.

IM – Quais as principais dicas que você daria para quem quer seguir o Tape Reading?

CR – Três dicas fundamentais: 1º Programe-se: você precisa estar bem planejado financeiramente para operar; pessoas com problemas financeiros costumam ficar com o psicológico afetado na hora de operar; 2º Curva de aprendizado: um trader leva entre um a dois anos para conseguir absorver o que o tape reading tem a nos ensinar, por isso é preciso ter paciência e encarar esse mercado com uma visão empreendedora de negócio; 3º Reserva Financeira: tenha entre R$ 20 e R$ 30 mil; você não vai perder isso tudo, mas você precisa ter esse colchão.

Virar scalper é uma “faculdade barata”, mas depende muito de você.

IM – E quais as características de quem opera via tape reading?

CR – Não tem medo de errar, consegue pensar rápido e possui auto confiança. Você precisa saber admitir o erro rapidamente para assim mudar de opinião e direção. Aquela pessoa que “não cria raiz” naquilo que deu errado vai se dar muito bem no mercado.

IM – Como definir uma “meta” para um scalper?

CR – A meta tem que ser financeira e o valor depende de cada investidor e do objetivo de cada um. Quando você bater a sua meta, pare de operar. Isso evita que você “devolva” os ganhos de um dia de pregão ao mercado, já que após bater a meta alguns aspectos emocionais podem acabar influenciando negativamente em suas operações (ex: excesso de confiança, menor disciplina em pontos de saída e viradas de direção etc).

Mas isso é relativo: se você sentir que o mercado está muito bom para operar mesmo após bater seu objetivo, continue. Para chegar a essa decisão, no entanto, é preciso ter experiência.

IM – Como você vê o tape reading no Brasil?

CR – Tem muito a ser explorado, mas está em fase crescente! O tape reading tem uma grande vantagem hoje no Brasil por causa do altíssimo grau especulativo que o mercado brasileiro ganhou. Então a consistência está a favor do tape reading. A tendência é o leitor de fita superar o leitor de gráfico.

IM – Para encerrar: como você resumiria o que é tape reading em uma frase? 

CR – Seria essa: não me interessa se o mercado vai subir ou cair, o que eu quero é pegar um pedaço desse movimento.

GLOSSÁRIO INFOMONEY: TAPE READING

O que é tape reading?
O Tape Reading consiste em identificar na análise do fluxo de ordens do mercado para onde o dinheiro está indo – e pegar carona com esta tendência. São operações de curtíssimo prazo (algumas duram poucos segundos) e que exigem máximo de dedicação do trader tanto na fase de aprendizado quanto no dia a dia de pregão, isso sem contar a necessidade de equilíbrio emocional e disposição a risco. Em contrapartida, os resultados tendem a dar inveja para qualquer aspirante a Warren Buffett ou diretor de empresa. 

Tape Reading hoje x Viva-voz
Podemos dizer que o Tape Reading é a versão atualizada daquela forma de operar no pregão presencial da Bovespa, quando vários “brokers” ficavam reunidos o dia todo emitindo aos berros ordens de compra e de venda por aqueles telefones gigantescos. Naquele tempo, outros aspectos além do preço eram levados em conta, como a alteração de voz ou gestos bruscos dos outros operadores, mas hoje com tudo informatizado e com a entrada dos “robôs”, a leitura de fluxo fica única e exclusivamente focada nos preços, já que os aspectos emocionais não são mais visíveis.

6 DICAS FUNDAMENTAIS PARA QUEM QUER ENTRAR NO TAPE READING:
1º: Tenha disciplina: além do tempo de estudo, o Tape Reading exigirá que você assuma os stop losses de forma rápida, pois ele é muito dinâmico. Não existe torcida no Tape Reading: se sua estratégia deu certo ou errado, você perceberá na hora. O stop loss precisa ser uma lei na sua estratégia.

2º: Opere focado no seu objetivo, e não só para ganhar dinheiro: trace metas bem claras de lucros e de perdas e seja fiel a elas. O mercado nem sempre estará a seu favor, então não busque ser vencedor todos os dias, saia sempre que a maré estiver contra você e não tenha pressa em ganhar. Lembre-se: amanhã sempre terá um novo pregão.

3º: Antes de ganhar dinheiro, busque aprender: respeite o tempo de tela, tenha sempre disciplina para não se vislumbrar com os dias de vitória e mantenha o foco na sua estratégia e em seus objetivos. Busque sempre aprender neste mercado, o lucro será consequência disso. Então, não tenha pressa.

4º: Infraestrutura: além de uma plataforma lhe traga as informações necessárias para analisar o fluxo do mercado, vale a pena investir em uma internet de boa qualidade e um bom computador com pelo menos duas telas.

5º: Diário de bordo: busque no começo anotar tudo que esteja acontecendo com o ativo que você está analisando: quem são os traders que movem esse ativo, quais os principais preços em que encontramos compradores e vendedores etc. Olhe este ativo o tempo todo para se tornar um especialista sobre ele.

6º: Quer começar? Então comece pequeno: no começo é recomendado até a utilização de simuladores para que você não coloque dinheiro de verdade em jogo. Mas após esse momento de aprendizado, comece pequeno, operando minicontratos (fração de um contrato cheio negociado no mercado futuro).

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Thiago Salomão

Idealizador e apresentador do canal Stock Pickers