Gestor diz que fundo do poço não está tão longe e que já dá para ver compras na Bovespa

Para Alexandre Póvoa, participação dos fundos de renda variável não cairá muito do patamar atual; gestor dá a dica dos melhores setores para se encontrar bons ativos hoje

Equipe InfoMoney

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SÃO PAULO – O pessimismo que tomou conta do mercado brasileiro nos últimos meses até se arrefeceu no fim de janeiro, mas ainda há muitos investidores preocupados com o destino da Bolsa. A maioria se pergunta se já atingimos o fundo do poço e temos caminho livre para aproveitar a recuperação no futuro. Para Alexandre Póvoa, presidente e sócio da Canepa Asset, o fundo ainda não chegou, mas não estamos tão longe dele. Contrariando o senso comum, Póvoa chamou Antônio Dupim da Modal Asset para ser sócio da Canepa e fazer parte de um grupo que fará a gestão de um fundo multimercado macro. 

“O que achamos é que o grande movimento de piora já veio. Os 5% de renda variável nos fundos não vão para zero. Temos um grande potencial de reentrada desse dinheiro”, disse Alexandre Póvoa em entrevista ao InfoMoney. Para ele, a maior crise a ser gerida pelo governo no momento atual é a política. Sem uma solução deste nó, ele acha difícil vermos reformas realmente relevantes na área fiscal que impeçam o crescimento desenfreado da dívida pública.

Ele ainda se disse a favor da tributação de LCI e LCA e afirma acreditar que o sistema tributário atual penaliza muito quem possui investimentos em renda variável, ao contrário do que deveria ocorrer em um mercado de capitais saudável. Confira a entrevista. 

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InfoMoney: Na carta mensa da Canepa vocês falam que são a favor da tributação de LCI (Letra de Crédito Imobiliário) e LCA (Letra de Crédito Agrícola). Gostaria de saber qual é a opinião de vocês sobre um imposto sobre dividendos e o fim dos juros sobre o capital próprio. Seria muito negativo porque faria as pessoas se afastarem da Bolsa?
Alexandre Póvoa: São coisas diferentes. Tributar LCI e LCA é para você ter uma isonomia para os diversos investimentos. Tentaram fazer um subsídio com LCI e LCA, mas eventualmente criou-se uma situação em que você já não tinha mais um lastro nos setores imobiliário ou agrícola. Tornou-se simplesmente um instrumento de captação barata para bancos em detrimento de todos os outros tipos de investimento.

Ao mesmo tempo, os fundos de investimento no Brasil são mais fáceis de tributar porque você tem os cotistas e é uma pessoa jurídica. Então é uma desvantagem muito grande que atrapalha o sistema e faz o dinheiro migrar para estes tipos de investimento que não pagam imposto.

Isso vai contra os três mantras que existem no mercado financeiro. O primeiro prevê que qualquer tributação de investimentos tem que envolver um máximo de isonomia. O segundo, que quanto maior o prazo, menos o investidor tem que pagar. E o terceiro mantra, muito pouco seguido no Brasil, é que investimentos de renda variável deveriam pagar menos imposto do que renda fixa. Na hora em que você deixa muito próximas as tributações de renda fixa e renda variável, você sinaliza para o investidor que ele não deve assumir risco.

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Sobre os juros sobre capital próprio, eu não vejo problema em acabar com eles, já que eles são frutos de outra época, a da hiperinflação, um contexto que já não existe mais. Só acho que é muito ruim a especulação em cima disso, porque move muito as ações de empresas que distribuem jcp. Tem que vir alguém logo trazer uma definição sobre isso. 

Já no caso dos dividendos, é um pouco diferente. Você estaria bitributando o capital. Você tributou o lucro líquido da empresa, então o bolo já é menor e aí tributa de novo o dividendo. Se você quiser fazer isso, você, no mínimo, tem que diminuir a alíquota do IR sobre o lucro. Então é mais uma tentativa de avanço sobre algo que não é correto.

IM: Mudando um pouco de assunto, nós sabemos que o Brasil passa por uma situação econômica muito difícil, que fica evidente com essas revisões de perspectiva do FMI, para níveis piores do que os esperados no relatório Focus. E esperamos que essa situação tenha algum impacto no lucro das empresas, que passam a divulgar seus balanços no dia 27. Em um momento como esse seria realmente o ideal estabelecer um novo fundo multimercado como vocês estão fazendo? Por que vocês tomaram esta decisão agora?
AP: Na própria carta eu coloquei alguns números assustadores. Cinco anos anos atrás a proporção de produtos de renda variável nos fundos de investimento era de 11% no Brasil. Nos EUA esse número era perto de 50%. E isso era em 2010, uma época em que todo mundo queria investir aqui. O que as pessoas falavam era que esse número pularia de 11% para 20% devido à queda de juros e à vinda de mais dinheiro. No caso dos fundos multimercados, que já tinham na época uma indústria bem mais robusta, a participação da renda variável era de 24% e as pessoas esperavam que fosse para 30% ou 35%. O multimercados é uma ponte da renda fixa para a renda variável.

O problema é que de lá para cá a participação de fundos de renda variável, que já era pequena em 11%, caiu para 5%, e a participação de multimercados caiu de 24% para 19%, mostrando este ambiente pessimismo e de aversão a risco. A gente acha que, a partir de agora, podemos olhar para frente, mais otimistas, levando em conta que a participação dessas indústrias caiu muito no total, e os níveis dos ativos no Brasil piorou muito. O dólar saiu de R$ 2,00 para R$ 4,00. Pode subir mais? Até pode, mas achamos que o grosso da depreciação do real já passou.

A taxa de juros também saiu de 7,25% para 14,25%. Acho que o prêmio em alguns mercados de renda fixa vai começar a decair se o Brasil começar a melhorar. Você teve uma perda de quase R$ 100 bilhões nas duas indústrias. Se voltarem R$ 20 bilhões ou R$ 30 bilhões já será bastante coisa. Você montar um multimercado agora, é algo que demora um ano, um ano e meio para fazer. Acho que é o tempo necessário para você aproveitar no curto prazo os prêmios de alguns ativos brasileiros. Daqui a um ano e meio esperamos uma melhora na situação do Brasil. Nos anteciparmos a este movimento é a lógica de montarmos um fundo multimercado agora.

Mas que fique claro que eu não acho que chegamos ao fundo do poço ainda. O que achamos é que o grande movimento de piora já veio. Os 5% de renda variável nos fundos não vão para zero. Pode sair mais dinheiro dos multimercados? Pode sair, mas não vão para muito menos do que 15%. Temos um grande potencial de reentrada desse dinheiro.

IM: Quanto vocês possuem em gestão de ativos?
AP: Hoje temos R$ 200 milhões em fundos no Brasil. Somando carteiras em geral são aproximadamente US$ 100 milhões ou R$ 400 milhões.

IM: E o que vocês acham que vale a pena na Bovespa hoje?
AP: A gente gosta muito de papel e celulose. O setor financeiro a gente também gosta bastante, apesar dos dados de inadimplência, porque o preço dos papéis está bem descontado. Gostamos tanto de bancos como de seguradoras, especialmente BB Seguridade (BBSE3). Em energia também achamos que as ações foram muito castigadas e dentro do setor as melhores empresas são as envolvidas em transmissão e geração de energia. Gostamos bastante de Equatorial (EQTL3) e de Transmissão Paulista (TRPL4). Então são estes três setores que a gente gosta mais: energia, financeiro e papel e celulose. No caso de papel e celulose, as melhores são Fibria (FIBR3) e Suzano (SUZB5).

Acho que você também deve olhar para as empresas de fidelidade, que têm oportunidades boas, já que elas estão com muito caixa por conta do dólar.

IM: E de que setores vocês não gostam de jeito nenhum atualmente?
AP: Quando você fala em commodities, eu não gosto de petróleo, siderurgia e mineração. Nos dois primeiros, as empresas erraram muito durante a crise e acho que será muito difícil que se recuperem. Se você não tiver uma recuperação violenta no preço do petróleo e no preço do aço, o que é muito pouco provável que aconteça, as empresas ficam muito comprometidas. Então apesar de terem caído muito, a gente não gosta de Petrobras (PETR3; PETR4) e de siderúrgicas. A gente não compraria empresas com respingo da Lava Jato também.

Já no caso da Vale (VALE3; VALE5), apesar da queda do preço do minério, é uma empresa que sempre foi muito bem administrada. Poderia ser a hora de começar a olhar para comprar, embora bem devagar.

Setor de educação é outra coisa que a gente não gosta porque está muito dependente de Fies [Fundo de Financiamento Estudantil] e da canetada do governo. Tudo que dependa de subsídio do governo como setor imobiliário e de educação é muito perigoso. São setores a evitar, apesar das ações já terem caído muito.

IM: Sobre a crise econômica, você tem a impressão de que o governo atua em muitas frentes ao mesmo tempo? Nós sabemos que os problemas não serão resolvidos ao mesmo tempo, já que temos inflação alta, a atividade econômica em queda e o endividamento público beirando a insolvência no longo prazo. O governo está tentando resolver muitos problemas e acaba não resolvendo nenhum?
AP: A impressão, na verdade, é que os problemas vem porque o governo fez a nova matriz macroeconômica ao mesmo tempo em que teve um choque externo muito forte. O maior símbolo disso é que a Petrobras é a empresa com a gasolina mais cara do mundo e, ao mesmo é uma empresa com fortes dificuldades de caixa. Isso mostra como foi mal gerida a coisa. E o governo tentou fazer esse experimento de colocar os juros reais lá para baixo e expandir os instrumentos parafiscais em 2011, 2012 e 2013. Vamos ter que passar um momento digerindo esses problemas criados pelo governo e piorados pela situação externa.

Agora o governo tenta perseguir as metas, mas a gente sabe que tem que meter o dedo na ferida da previdência, tem que meter o dedo na ferida dos funcionários públicos, que são coisas que o governo se recusa a meter o dedo. Além disso, para passar esse tipo de coisa, o governo precisaria do apoio do Congresso. É como se a canoa tivesse furado e você tentasse tapar os furinhos o tempo todo sem fechar o rombo inteiro. Isso até o governo ficar um pouco mais forte.

Mas o que está acontecendo que é uma coisa boa é o ajuste na parte externa porque o dólar subiu muito e há uma recessão muito forte da demanda por aqui que faz com que as importações estejam caindo muito. Esse é o maior exemplo de como preço de mercado resolve um pouco as coisas. Já do lado interno tem um juro altíssimo e uma inflação com uma inércia.

Então tem que trabalhar por que a grande questão é que os índices de confiança do consumidor e do empresário estão nas mínimas históricas e o governo não consegue mudar isso. Quando você não consegue convencer o mercado de que há uma intenção de equilibrar a questão da inflação e da dívida, não há incentivo ao consumo e a gente vê desemprego aumentando. Dado que foi criada uma situação de desequilíbrio por conta da má gestão macroeconômica, é preciso trabalhar todo dia para mudar mudar isso.

IM: E qual você acha que será o maior desafio para o governo retomar esta confiança?
AP: O mais difícil sem dúvida nenhuma será resolver o lado fiscal. Principalmente para que o País aponte uma solvência de médio e longo prazo, que faça com que a relação dívida/PIB na parte bruta pare de subir. O investidor tem que olhar e ver que o Brasil é um País solvente. Com o dólar a R$ 4 já volta ao radar a possibilidade de investir aqui, mas é preciso saber que o País vai continuar solvente. Para isso, precisamos de novo resolver esse impasse na Câmara e no Senado para voltar a implementar medidas mais duras. Com o fiscal de curto prazo e o fiscal de médio e longo prazo resolvidos aí sim podemos começar a baixar juros e a trazer mais confiança na economia.

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