George Soros: a trajetória cercada de polêmicas do gestor de um dos fundos mais rentáveis do mundo

Conheça a história polêmica do bilionário pivô de teorias da conspiração que não é querido nem em seu país natal.

George Soros
Nome completo:George Soros
Ocupação:Investidor e filantropo
Local de Nascimento: Budapeste, Hungria
Data de Nascimento: 12 de agosto de 1930
Fortuna: US$ 8,3 bilhões (ranking da Forbes de 2020)

Quem é George Soros?

George Soros é um investidor e filantropo nascido em Budapeste, na Hungria, em 1930. O bilionário tem um patrimônio estimado em US$ 8 bilhões, mas já doou quatro vezes este valor para a sua organização não-governamental, a Open Society Foundation.

Sua trajetória é pontuada de fatos históricos e polêmicas envolvendo governos, teorias da conspiração e até a superlativa – em sua opinião – alcunha de ser o homem que quebrou o Banco da Inglaterra.

Como um dos mais conhecidos bilionários e filantropos do mundo, Soros apoiou causas que considera democráticas, começando no seu país de origem em 1980 e mantendo a prática até os dias atuais. Recentemente, na Inglaterra, financiou um grupo que apoiava um novo referendo sobre o Brexit.

Família e a história de um sobrenome

Hoje, o nome Soros é conhecido no mundo inteiro. Mas, até 1936, ele não existia. O bilionário conhecido como George Soros nasceu em Budapeste em 12 de agosto de 1930, só que sua certidão de nascimento registrava outro nome: György Schwartz. O sobrenome era de uma tradicional família judia; apesar disso, a religião não era levada à risca dentro de casa.

Seus pais eram Erzsébet, também chamada de Elizabeth, de uma família húngara rica que comercializava seda, e o advogado Tivadar, que, entre suas muitas características peculiares, era fluente em esperanto. O irmão mais velho de George, Paul, se formou em engenharia.

Tivadar conhecia bem os horrores da guerra. Ele fora prisioneiro da Rússia durante a Primeira Guerra Mundial e ficou em um campo de trabalhos forçados na Sibéria. Depois de conseguir escapar e se casar, em 1924, ficou atento às mudanças que aconteciam no mundo e notou o crescimento do antissemitismo. Para proteger a família, tomou a decisão de trocar o nome de todos para o que soassem “menos judeus”.

Mas a decisão não foi solitária. Tivadar debateu com toda a família, por vários dias sobre qual seria o melhor sobrenome. Acabou escolhendo Soros porque gostou do fato de o nome ser um palíndromo, fácil de falar em várias línguas e por significar o próximo na linha de sucessão em húngaro. Além disso, tinha um significado também em esperanto, algo que poderia ser traduzido como “soará”.

Durante a ascensão da Alemanha nazista, a família conseguiu permanecer praticamente indiferente aos horrores da Segunda Guerra mundial. Seu pai continuava tocando seus negócios e viajando pelo mundo.

George continuava um estudante mediano que gostava de jogar Kapital, um jogo de tabuleiro parecido com Banco Imobiliário. Ia muito mal em matemática mas compensava com o interesse por aprender línguas. Ainda menino, já falava alemão, latim e esperanto. E tinha professores particulares para aprender inglês e francês.

Mas, em março de 1944, a Hungria rompeu com a Alemanha e foi invadida.

Mais um nome

Naquele momento, o então adolescente George, com 13 anos, precisou se apresentar ao Conselho Judeu e recebeu uma lista com pessoas que ele deveria chamar a se apresentarem ao tal conselho. George conta que mostrou a lista ao seu pai, que reconheceu como uma lista de advogados judeus.

Seu pai o aconselhou a informar àqueles que estavam na lista que eles eram procurados para se apresentar ao conselho – mas que avisasse também que quem fizesse isso provavelmente seria deportado.

Desse episódio, surgiu o boato de que George Soros teria colaborado com os nazistas. Mas o jovem não voltou para esse trabalho. Poucos meses depois, ele foi enviado por seu pai para morar com um oficial húngaro, como se fosse seu afilhado, e ganhou mais um novo nome: Sandor Kiss. Toda a família recebeu novos nomes e foi morar em casas separadas, para aumentar suas chances de sobrevivência.

Os cabelos naturalmente loiros e olhos claros do menino ajudavam no disfarce. No período em que permaneceu escondido, também foi levado por esse oficial para participar de inventários que o governo realizava dos bens confiscados de famílias judias.

Na contramão do que se esperaria de jovem judeu no meio do holocausto, Soros descreveu aquele como o ano mais feliz de sua vida. Havia uma razão para isso: foi o ano em que ele pode observar o heroísmo de seu pai, que, além de salvar a própria família, também ajudou muitas outras a conseguir novos documentos.

No final da guerra, a Hungria passaria por outra transformação: a invasão soviética. Por isso, em 1947, quando ele tinha 17 anos, mudou-se para Londres.

A filosofia de Soros

Como um estudante na London School of Economics, no final dos 1940, George Soros fez todo tipo de trabalho para conseguir dinheiro: de pintor e garçom a funcionário de uma fábrica de manequins.

Foi na faculdade que ele conheceria Karl Popper, autor do livro A Sociedade Aberta e seus Inimigos, que influenciaria a criação da Open Society Foundation, organização não-governamental fundada por Soros.

Em seus livros, Popper questionava as “certezas absolutas” e dissertava sobre como ideologias que afirmam serem as donas da verdade só poderiam ser impostas por força. Popper propunha uma forma diferente de organização social: uma sociedade aberta, com liberdade para as pessoas terem opiniões e visões de mundo diferentes, mas que, ainda assim, possam viver juntas e em paz.

Tendo vivido uma ocupação nazista e comunista em seu país natal, Soros afirmou que achou a ideia de uma sociedade aberta bastante atraente.

Soros se formou em filosofia em 1951 e, em 1954, conseguiu seu mestrado na mesma área de conhecimento. Seu objetivo depois da faculdade era escrever um livro, mas, percebendo que o projeto poderia levar bastante tempo, decidiu arrumar um emprego enquanto escrevia.

Assim, ele enviou cartas para todos os bancos de investimento de Londres e, eventualmente, conseguiu um trabalho no banco de investimentos Singer and Friedlander, em 1954, como atendente.

Mundo dos investimentos

Mas logo o jovem e poliglota Soros conseguiu transferência para a área de negociações de ativos. Dois anos depois, desembarcou em Wall Street. Mudou-se para Nova York, com US$ 5 mil, algo como US$ 50 mil em valores atuais.

Uma carta de recomendação de um ex-colega e sua especialização no mercado europeu garantiram uma vaga na gestora F. M. Mayer, onde ele trabalhou por três anos. Saiu de lá já com sua cidadania americana.

A próxima empresa no currículo de Soros foi a Wertheim and Co e, assim que entrou lá, estabeleceu uma meta ambiciosa: trabalhar ali por cinco anos, juntar US$ 500 mil e voltar para a Inglaterra para estudar filosofia.

Ele, de fato, voltou a estudar, mas não na Inglaterra. Fazia isso em seu “tempo livre” e aplicava a filosofia aos seus investimentos agora como vice-presidente na Arnhold and S. Bleichroeder. Ele também não parou quando atingiu a sua meta financeira.

Fundo próprio

Em 1966, quando já estava casado com Annaliese Witschak e era pai de seus dois primeiros filhos, Robert e Andrea, Soros começou seu primeiro fundo com US$ 100 mil da empresa, para colocar em prática sua filosofia de investimento.

Três anos depois, lançou o fundo Double Eagle na mesma gestora e, com a experiência bem-sucedida, resolveu criar uma gestora própria: a Soros Fund Management, junto o sócio Jim Rogers, que conheceu na Arnhold and S. Bleichroeder.

O primeiro fundo, que depois seria renomeado para Quantum – assim como gestora, que virou Quantum Group of Funds – começou com um patrimônio de US$ 12 milhões e acumulou cerca de US$ 44 bilhões em ganhos até 2011, quando virou um fundo de investimento exclusivo para gerir a fortuna da família de Soros.

A grande aposta

Em 1992, Soros fez a sua grande aposta. Ao longo do ano, junto com outros investidores, apostou contra a libra, acreditando que a moeda estava supervalorizada. Mas apostou alto: US$ 10 bilhões. Com a operação, lucrou US$ 1 bilhão no dia 16 de setembro de 1992, que ficou conhecido como a quarta-feira negra na Inglaterra.

O Banco Central da Inglaterra e outros bancos centrais de países europeus como França, Espanha, Alemanha e Bélgica compraram libras para tentar apoiar a moeda, mas a manobra não foi suficiente. A libra colapsou e precisou sair do sistema cambial europeu.

Soros descobriu pelos jornais do dia seguinte que era chamado de “o homem que quebrou o Banco da Inglaterra” e, apesar de gostar da alcunha e da fama que alcançou com ela, afirmou em diversas entrevistas que acha o apelido injusto, já que não foi “o homem”, mas um deles.

Com a mesma estratégia, de apostar alto naquilo em que acreditava, o fundo teve um retorno médio de 20% ao ano ao longo de suas décadas de história. Tornou-se, assim, um dos fundos mais rentáveis do mundo.

Segundo o próprio Soros, algumas de suas maiores qualidades são tentar se manter sempre muito bem informado, seguir a intuição, não se apegar a investimentos e conseguir aprender rapidamente com seus erros.

Em 2011, seus filhos Robert e Jonathan, nascido em 1970, afirmaram que o fundo devolveria o dinheiro dos investidores e explicaram que o fechamento do fundo iria acontecer por causa da nova regulamentação do mercado americano, que passou a exigir que os fundos registrassem seus investidores com os reguladores financeiros.

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Filantropia

Pai de cinco filhos, de dois casamentos, Soros começou seu projeto filantrópico em 1979, quando passou a oferecer bolsas de estudos para universitários da África do Sul, durante o Apartheid, e dissidentes da Europa Oriental.

Em 1984, fundou na Hungria a rede que depois se transformaria na Open Society Foundation que, entre outras ações, importou um grande número de copiadoras para que os dissidentes do governo pudessem espalhar sua mensagem.

Na Rússia, depois do colapso pós-comunista, financiou cientistas com bolsas de estudo e garantiu, com US$ 100 milhões, a infraestrutura necessária para conectar as universidades à internet.

Em 2017, a Open Society Foundation anunciou ter recebido mais de US$ 18 bilhões de Soros, o que elevou o total doado por ele para a fundação a mais de US$ 32 bilhões.

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Polêmicas e teorias

Existem muitas teorias da conspiração envolvendo George Soros. Segundo o próprio, a origem de tanta lenda é o fato de que as pessoas não lidam bem com o fato de alguém ter tido tanto sucesso sem fazer algo de errado.

As primeiras teorias que apontam Soros como o grande financiador da esquerda ganharam mais peso quando, em 2003, ele condenou a guerra no Iraque e passou a doar para o Partido Democrata americano. Mas foi depois da vitória de Donald Trump que o investidor se consolidou como “inimigo da direita”.

Entre outras coisas, ele é acusado de influenciar políticos e tentar inundar os Estados Unidos de imigrantes, financiando uma caravana que partiu de Honduras para entrar no país de maneira ilegal. Perguntado sobre o assunto, o próprio Trump afirmou que não ficaria surpreso se Soros financiasse a caravana. Nenhuma evidência sobre supostos pagamentos foi encontrada.

Uma bomba chegou a ser enviada para a casa do bilionário e, em outubro de 2018, um supremacista branco armado com um fuzil e três pistolas invadiu uma sinagoga e matou 11 judeus. Os posts nas redes do assassino mostravam que ele acreditava em uma obscura teoria da qual Soros seria o criador: o chamado genocídio branco, que pretendia “substituir” os americanos por imigrantes.

Os boatos a seu respeito se espalharam por diversos países, como a Itália, onde Soros foi acusado de encher o país de imigrantes, e na Turquia, onde a acusação foi de que o bilionário faz parte de uma conspiração para “repartir” o país.

Na Inglaterra, Nigel Farage, um dos líderes mais influentes do Partido de Independência do Reino Unido e defensor do Brexit, o chamou de o maior perigo ao mundo ocidental por influenciar pessoas a “inundar” a Europa.

Nem mesmo em seu país natal, onde sua fundação foi responsável, inclusive, pela criação de uma universidade, Soros está livre de ser visto como um inimigo. De acordo com premiê Viktor Orban que, ironicamente, teve seus estudos financiados pela fundação do próprio Soros, o investidor teria o mesmo plano secreto de “inundar” o país com imigrantes.

Sua vida amorosa também já foi parar nos jornais. Entre 2005 e 2010, depois de se divorciar de sua segunda esposa, Susan Weber, e antes de se casar com a terceira, Tamiko Bolton, o investidor teve um relacionamento com a atriz brasileira Adriana Ferreyr, que fez a novela Marisol, em 2002.

Durante o relacionamento, Adriana afirmou que Soros havia prometido que compraria um apartamento para ela. Ele de fato o fez, mas teria dado o apartamento para outra mulher. Depois de uma briga, Adriana alegou que Soros bateu nela e jogou uma luminária de vidro em sua direção, que teria machucado seu pé.

Alegando quebra de promessa e agressão, Adriana processou o investidor e pediu US$ 50 milhões. Soros ofereceu US$ 250 mil e entrou com um pedido de anulação do processo – que não foi atendido integralmente.

Soros foi alvo de outros processos. Num deles, foi acusado de insider trading em uma operação que envolveu a venda do banco Société Général. Investigações iniciais o inocentaram mas, anos depois, o caso foi reaberto, o que culminou em uma multa de €$ 2 milhões, posteriormente reduzida pela metade.

Novos inimigos

Em seus quase 90 anos de idade, Soros continua ativo. No último Fórum Econômico Mundial, que aconteceu em Davos, em janeiro de 2020, anunciou que investirá US$ 1 bilhão para criar uma rede acadêmica, batizada de Open Society University Network.

O projeto tem como missão conectar instituições de ensino superior pelo mundo, para oferecer cursos e programas de graduação que reúnam estudantes e professores de diferentes países. O objetivo é alcançar lugares que “necessitam de educação de alta qualidade e servir populações negligenciadas, como refugiados, pessoas encarceradas, ciganos e outros povos deslocados”.

Em seu discurso, Soros chamou o projeto de “o mais importante de sua vida” e explicou que todas as universidades do mundo podem participar. Ainda citou especificamente o presidente Jair Bolsonaro, criticando-o por não conseguir “impedir a destruição das florestas tropicais no Brasil, a fim de abri-las para a pecuária”.

Aproveitou também para lamentar que China, Estados Unidos e Rússia estejam nas mãos de ditadores atuais ou em gestação. Falou que o maior e mais aterrorizante retrocesso afeta a Índia, e chamou Trump de um golpista e um narcisista que teria superaquecido a economia americana.

Para aqueles que se declaram seu inimigo, Soros disse: “Quando vejo quem está me atacando, vejo que estou fazendo algo certo. Estou orgulhoso dos inimigos que estou fazendo”.

Para saber mais

Quer saber mais sobre George Soros e a sua trajetória? Confira a seleção do InfoMoney com livros, artigos e entrevistas.

Livros

A Alquimia das finanças (George Soros)
As Palestras de George Soros na Central European University (George Soros)
Soros. O Investidor Mais Influente do Mundo (Robert Slater)
Os grandes investidores (Glen Arnold)
O Novo Paradigma dos Mercados Financeiros: a Crise Financeira de 2008 e o seu Significado (George Soros)
George Soros (Peter Parish)
Em defesa da Sociedade Aberta (George Soros)
A era da insegurança (George Soros)
Os segredos de George Soros e Warren Buffet (Mark Tier)
Soros: A Vida de um Bilionário Messiânico (Michael Kaufman)

Artigo

Fallibility, reflexivity, and the human uncertainty principle (George Soros)

Podcast

Today in Focus, Episódio Meeting George Soros (The Guardian)