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A antipolítica é antimercado

À direita do espectro político, as lideranças tradicionais do PSDB e do PMDB foram alvejadas pela operação Lava Jato, que desmoronou a popularidade delas
Por  Equipe InfoMoney
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Levantamento da XP Investimentos apontou o prefeito de São Paulo, Doria Jr., como um crescente querido do mercado, projetando que a Bolsa subiria a 80 mil pontos em caso de hipotética vitória.

Ocorre que ainda há muito chão para o chefe do executivo paulistano percorrer e, neste tempo, é muito provável que Jair Bolsonaro se cristalize na segunda colocação. À direita do espectro político, as lideranças tradicionais do PSDB e do PMDB foram alvejadas pela operação Lava Jato, que desmoronou a popularidade delas, conduzindo a maioria do eleitorado com este perfil a uma radicalização que mistura antipolítica e antipetismo.

Não era nada não era nada e Trump despacha na Casa Branca.

Mas, ainda que sonhe com um Emmanuel Macron tropical, o mercado tem que olhar  para Brasília e não para Paris. A escolha francesa no último sufrágio convergiu justamente para um outsider vindo do savoir faire. Lula é desta escola, o know how sempre foi um suporte para as habilidades negociais de, primeiro, sindicalista e, depois, de líder mundialmente reconhecido. E, muito bem tenha governado com o establishment entre 2003 e 2010, sua trajetória pessoal faz dele o maior outsider.

Tanto é que as classes C- (em mobilidade para baixo), D e E, ao invés de sucumbirem ao canto da Lawfare e sua narrativa que diz ser a corrupção a causa da desigualdade social, triplicam a aposta no líder que enxergam como um deles, bem sucedido para eles e representante do otimismo e orgulho brasileiro.

Ademais, Macron, ao ser posto, por exemplo, diante dos reclames empresariais quanto às barreiras à produtividade ocasionadas pela jornada de trabalho de 36 horas semanais, discutiu mediações, como 40 horas para os mais jovens, que acabariam por ganhar experiência, e manutenção das 36 horas para os mais velhos, que seguiriam estimulados, por isso, a trabalhar.

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A título de ilustração, novíssimos experimentos para um trabalho mais produtivo são realizados no mundo, como tempo para descanso e até sexo. Este tipo de benchmarking ou copycat deve estar na mesa também ao se pensar soluções aos impasses brasileiros.

Modernidade moderna
Também talvez seja a hora do mercado refletir sobre se só importa, num país com a importância do Brasil, um presidente afinado com os temas que lhe dizem respeito, ainda que mande o serviço de limpeza despertar homeless com água gelada na noite mais fria do ano.

Chamar grevista de “preguiçoso” é anacrônico, consiste apenas em erguer muros para desperdiçar a oportunidade de entendimentos para desatravancar a economia.

Numa escala de 200 milhões de habitantes, estas são uma péssima imagem para associar marcas. E o tom segregacionista e supremacista só alimenta o conflito político e social, com desastrosos efeitos sobre a economia, sobretudo num contexto de persistência da crise brasileira e divisão da sociedade.

Moderno parece mais Kenneth Frazier, presidente da Merck, demitir-se das funções de conselheiro económico de Donald Trump em protesto contra as declarações complacentes deste sobre as manifestações autodeclaradas nazistas em Charlottesville. Ou Sheryl Sandberg, Diretora de Operações do Facebook, ao anunciar o Online Civil Courage Iniciative contra o extremismo na Internet contra os refugiados.

Moderno é combinar estabilidade econômica, responsabilidade fiscal, crescimento e distribuição de renda como o ex-presidente conseguiu entre 2003 e 2010, que fez o autor do tweet mais popular da história, Barack Obama, consagrar o “That’s my man”, numa reverência ao South American Way do líder brasileiro.

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Moderno é instalar e prestigiar um Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social com o propósito de pactuar distintos interesses sócio-econômicos e pontos de vista políticos.

Governo do gestor é risco de investimento na veia
A Ecole Nationale d’Administration (ENA), que forma gestores para governar, produziu um presidente que fracassou, François Hollande. Pelo menos aos olhos do mercado, a ideia de um gestor do Brasil não deu certo. Sobretudo, alega-se, porque a autossuficiência da gerência conflitou com a negociação política. Este risco não é exclusividade da esquerda, do centro, da direita ou de quem se acredita acima dos pólos.

Pior será sob a regência do “presidencialismo de cooptação”, substituto do de coalizão, como classificou o PSDB em seu programa de TV”, que resume a governança a meros acordos políticos.

Ainda mais incerto será se for aprovado o Distritão. Com ele em vigor, a bancada evangélica já traçou a meta de eleger 20% da Câmara dos Deputados. Com os 16,5% desta legislatura já tumultua a cena política à la Eduardo Cunha, imagine-se num patamar superior. Sem falar nas estrelas do mainstream favorecidas a se elegerem, preocupadas só com suas platéias, literalmente.

E recorde-se que o financiamento empresarial de campanhas foi julgado inconstitucional. Nada de Super PAC à brasileira, portanto.

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O Distritão também reforça o potencial de reeleição da maioria e do perfil dos atuais parlamentares, cuja demanda por presidencialismo de cooptação seria ainda maior.

No Brasil, a vitória de um presidente com mais de 50%+1 de dezenas milhões de votos não significa que ele tem força para governar a despeito de resistências no Congresso Nacional, mas o oposto: os parlamentares travam a agenda presidencial para negociar benesses legítimas ou não, apostando na deterioração da popularidade do presidente da República pela demora em cumprir as promessas de campanha.

Eleve-se isto exponencialmente após o calvário pelo qual o Legislativo atravessou em pé em virtude da operação Lava Jato, que destruiu a imagem do sistema político, mas, nem por isso, o derrubou.

Coisas que reforçariam o populismo parlamentar, que explode as despesas com benesses parlamentares.

Por outro lado, o gestor tende a se subsidiar de especialistas de sua preferência para a tomada de decisão, destacadamente quando o assunto é economia. Aos olhos do mercado, este modus operandi também não deu muito certo no Brasil. Que dirá agora quando os impasses exigem soluções exequíveis e não esta ou aquela escola de pensamento.

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Se uma das disputas de fundo que contribuiu para o Impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff é sobre a alocação e distribuição de recursos no orçamento, e o grau de regulação da economia para os grupos de interesse e stakeholders de diversas faixas de renda, o enforcement de CEOs e sindicalistas é um caminho para desbloquear o financiamento do desenvolvimento, num espaço-tempo seguro.

E o pior é que o governo do gestor só seria possível, no fim das contas, se predominasse o voto antipolítica, majoritariamente mobilizado como base social do populismo judicial (que aplica a lei conforme as notícias do dia), o que reduziria consideravelmente as chances da retomada da segurança jurídica e da estabilidade política relevantes ao ambiente de negócios. Ainda mais se o gestor vitorioso passasse pela janela eleitoral aberta pela Lawfare, incendiando as duas pontas do País.

Por isso, parece que o verdadeiro centro da situação política é Lula, capaz de liderar a travessia não com pinguela ou a nado, e sim com o seu conhecido transatlântico.

Por Leopoldo Vieira – Especialista em Administração Pública pelo Instituto de Educação Superior de Brasília (IESB), foi coordenador da accountability do Plano Plurianual Federal 2012-2015  e tem aperfeiçoamento em em Problem Solving in Public Policy: Eightfold Path Approach, pela University of California, Berkeley, e em Engaging Citizens: A Game Changer for Development, pelo Banco Mundial. Como diretor da Trajeto Inteligência Estratégica, organiza o ciclo de lightning talks Idealpolitik-Análise de Cenários.

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