Otaviano Canuto fala como o Brasil pode sair da “armadilha da renda média”

Ex-vice-presidente do Banco Mundial explica também se priorização de investimentos em logística no País realmente valem a pena

Rodrigo Tolotti

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SÃO PAULO – Há anos o Brasil, assim como outros países, ganhou o rótulo de país em desenvolvimento, mas nunca foi colocado no grau de um país desenvolvido. Existe aí um desafio para estas nações conseguirem dar o próximo passo em seu crescimento, é a chamada “armadilha da renda média”. Esse é apenas um dos assunto que Otaviano Canuto, o senior advisor do Banco Mundial para os BRICS, falou em podcast gravado com a Rio Bravo Investimentos.

Canuto é doutor em economia pela Unicamp, foi vice-presidente do Banco Mundial e responsável pela Poverty Reduction Network, divisão do banco que lida com política econômica, redução da pobreza e igualdade de gêneros. Também foi diretor executivo do Banco Mundial entre 2004 e 2007 e foi secretário de assuntos internacionais do Ministério da Fazenda na gestão de Antonio Palocci.

Além da renda média, Canuto também dá sua opinião sobre a priorização do Brasil em investir em logística, além de falar sobre os grandes investimentos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) ao longo dos últimos anos. O economista ainda aborda temas como shadow banking na China e o crescimento do México. Veja abaixo a transcrição da entrevista completa:

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Rio BravoEu queria que o senhor começasse explicando o que é a chamada “armadilha da renda média”, e depois dizer como o Brasil pode sair dela. Qual a chave?

Otaviano Canuto – A armadilha da renda média é o risco de que um país, depois de transitar de níveis baixos de renda para níveis médios, não consiga manter o ritmo e ascender aos patamares de países desenvolvidos. Há coisas em comum em todos os casos de transição de renda baixa para renda média: a transferência de pessoas de atividades de subsistência para atividades modernas, em geral nas cidades, grandes aumentos na produtividade total, até porque os trabalhadores não precisam ganhar muita escolaridade, usasse tecnologias existentes, etc. e tal.

Pois bem, a partir daí, o quadro de políticas necessárias muda, porque se passa a se precisar de mais inovação interna e menos imitação, há necessidade de níveis de educação mais elevados da população, há necessidade de instituições que permitam o funcionamento da economia com baixos custos de transação, porque elas se tornam mais complexas… Grandes cadeias de produção… E aí a tarefa se torna, às vezes, muito difícil para alguns países transitar de uma fase para outra. A América Latina, de certa maneira, que tem países quase todos de renda média, alcançou esse estágio há algum tempo atrás, várias décadas atrás, e, no entanto, não conseguiu transitar para cima.

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O que aconteceu na América Latina, no Brasil dos anos 50, 60 e 70 é o que já havia acontecido no Japão, é o que aconteceu com os Tigres Asiáticos depois, e é o que aconteceu com a China recentemente. Eles têm todos em comum esse processo de transferência, só que a partir daí, o jogo muda. Por que a gente pode dizer que, de certa maneira, a América Latina, inclusive o Brasil, se tornou uma armadilha? Porque, na verdade, o dever de casa necessário para completar essa transição, para passar para outro estágio, não está completo.

RB – Ou seja, as instituições não estão aí para garantir custos de transação baixos e a tecnologia é faltante também.

OC – É, ela existe em segmentos em partes pequenas da economia como um todo. Uma economia como o Brasil.

RB – Pocket de tecnologia.

OC – O Brasil tem uma renda média, mas ele tem pedaços de renda baixa. Tem uma parcela da população com atividades de baixa produtividade, cada vez menos, felizmente, mas tem, e tem pedaços de economia avançada. Pense na agricultura sofisticada brasileira, é uma agricultura intensiva em tecnologia, intensiva em informação meteorológica, intensiva em insumos modernos e em maquinário. Pense na capacidade de produção de petróleo em águas profundas, ou a Embraer, que é também um excelente exemplo de uma cadeia de valor agregado global que está sob o comando por conta da capacidade de design dos aviões, etc. Mas esses pedaços, essa parcela da população ocupadas nessas atividades de alta renda, não é suficientemente grande para permitir a subida do nível de renda como um todo.

RB – Ou seja, a Bélgica da Belíndia tem tecnologia, a Índia da Belindia não tem. Mas como trazer tecnologia para a Índia? Ou seja, se desenvolve localmente ou você importa o que há no mundo?

OC – Exatamente. Na verdade, ao invés da dicotomia entre importar ou produzir, o que vale é a solução criativa. Hoje em dia, e há muito tempo, as tecnologias são sistemas complexos que não tem que ser inteiramente geradas no mesmo local. A interação com o que acontece no resto do mundo é fundamental, porque ela permite a fertilização.

É preciso haver um esforço criativo de adaptação da tecnologia, porque a partir da adaptação criativa é que se cria outras inovações. Na verdade não há anteposição entre a imitação e a inovação, desde que se valendo do mero processo de utilizar tecnologias padronizadas sem agregar nada.

RB – Mas você pode dar um exemplo de como fazer essa absorção criativa em alguma cadeia ou indústria? 

OC – Eu acho que os exemplos que eu dei… Os três casos de exemplos que eu dei de pedaços de… Eles são todos exemplos disso.

RB – Embraer?

OC – Embraer, o petróleo, a capacidade de produção da Petrobras e a agricultura. 

RB – O Brasil hoje está abraçando com bastante atraso uma agenda de investimentos em infraestrutura, mas os economistas se dividem sobre o verdadeiro efeito destes investimentos sobre a produtividade. O senhor já se debruçou sobre este assunto. Qual a sua conclusão? Investir em infraestrutura aumenta a produtividade muito, pouco…?

OC – Eu estou do lado daqueles que acham que aumenta muito, e por quê? Primeiro que muitos dessas estimativas que os economistas fazem usando séries de tempo, usando os dados passados, carregam uma relação que diz respeito a um período em que os investimentos em infraestrutura têm sido muito baixos.

RB – Que é o passado. 

OC – Que é o passado. Na margem, nós sabemos a evidência espalhada de como hoje essa carência de infraestrutura é uma fonte de desperdícios e de gastos. Ora, então os efeitos… O exemplo, para mim óbvio, é um estudo do Banco Mundial de alguns anos atrás que estimou naquela época uma perda em torno de 30% da produção de soja na época no Brasil por conta da ausência de condições de armazenagem e transporte adequado. O ponto é o seguinte: põem a infraestrutura na hora que você leva em conta a diminuição desse desperdício por conta da infraestrutura estar no lugar, o ganho em termos de produtividade total é bem maior do que aquele associado a um investimento específico. Dada a carência e um estado precário de infraestrutura, na margem, os investimentos em infraestrutura podem permitir ganhos generalizados de produtividade para todos os setores.

RB – Então nós vamos estar vendo isso nos próximos anos com a execução da agenda de investimentos? 

OC – Na extensão que se tenha um “pipeline” de projetos de investimentos em infraestrutura que não sejam elefantes brancos, eu creio que… Essa é, para mim, uma das fontes óbvias de aumento de produtividade total dos fatores no país nos próximos anos.

RB – Vamos falar do papel dos bancos públicos… Devemos nos preocupar com as injeções de capital que o tesouro tem feito na Caixa e no BNDES ao longo dos últimos anos? Os bancos não deixaram de ser um instrumento anticíclico para ser uma ferramenta pró-cíclica?

OC – Eu acho que uma das lições que as economias emergentes todas obtiveram mais recentemente foi a de que aquilo que funcionou muito bem em todas elas, imediatamente após a eclosão da crise financeira, principalmente durante 2009, funcionou bem uma vez, mas também se aprendeu, e isso é algo que vai além do Brasil, que a repetição da dosagem já não deu os efeitos na segunda vez iguais aos primeiros. Quer dizer, não se tratava de um remédio permanente. De certa maneira, todas essas economias emergentes caíram em uma certa complacência, o que foi ajudado pela abundância de liquidez internacional, um pouco também ajudado por uma tendência de complacência de “Está tudo funcionando bem, por que vou mudar?”. Mas, o fato é que os resultados passaram a ser cada vez decrescentes. O México, por exemplo, conseguiu chamar a atenção favoravelmente dos mercados porque a mudança na retórica, no discurso, pareceu expressar uma percepção disso, algo. “Usei o anticíclico, funcionou, mas eu tenho consciência de que não dá para ficar só nisso. Eu tenho que encaminhar uma agenda de reformas estruturais.” Essa agenda é uma agenda que vai variar de país para país.

RB – O México é a abertura no setor de petróleo?

OC – Isso, exatamente. Assim como… Mas eles também põem nessa campanha investir na educação. E a reforma tributária para tornar o governo menos dependente da taxação sobre o petróleo. A questão de entregar ou não essa reforma é outra história, mas a mudança de trajetória prometida pelo governo revelou uma percepção de mudança. Eu diria que nós estamos nessa. O país está nessa tensão. O Brasil, a partir de um certo momento, o governo começou a observar que, simplesmente, dar mais crédito, ou, simplesmente, seguir com a mesma política que tinha dado certo anteriormente, inclusive com resposta anticíclica, já não dava mais resposta e que há necessidade de transitar para um padrão mais independente de investimentos.

RB – Você acha que o governo começou a ver que essas políticas não davam mais resposta ou você acha que o governo viu que o dinheiro acabou?

OC – Não acho que seja que o dinheiro acabou…

RB – O dinheiro nunca acaba (risos).

RB – E, na verdade, como o ponto de partida não é de uma posição fiscal frágil, rigorosamente, se o governo quisesse ter continuado a insistir nessa trajetória, poderia fazê-lo ainda que sob pena de…

OC – Fragilização maior…

RB – Isso, exatamente. Eu acho que a percepção, por tudo que eu vi e escutei, decorreu do fato de que… “Olha, não adianta tentar dar mais crédito e consumo. Primeiro que as próprias famílias já estão parando de querer se endividar, segundo porque isso não está fazendo os agentes privados investirem mais, porque eles não acreditam que esses impulsos à demanda sejam sustentáveis.” E hoje, nós sabemos, todo o mundo, cada vez, mais tem a percepção disso, como os gargalos ao crescimento brasileiro estão principalmente no lado da oferta, estão decorrendo da ausência de investimentos nos patamares adequados, criando capacidade instalada, embutindo inovações tecnológicas e aumento de produtividade, e assim por diante.

RB – Ainda sobre o papel do BNDES, o Luciano Coutinho escreveu um prefácio para um livro seu, vocês são amigos. Qual a sua visão sobre política industrial, e a criação de campeões nacionais, que é uma coisa que o BNDES tem defendido na gestão do Luciano nos últimos anos? 

OC – Se não me falha a memória, o próprio Luciano já observou como essa política de campões nacionais já ficou para trás. O que ocorre… Lembrando daqueles dois critérios que mencionei… Na medida em que tem que exercitar a seletividade, na medida em que se tem que averiguar com certeza o que é adicional e o que não é, o fortalecimento de campeões nacionais em segmentos nos quais existem disponibilidade de financiamento, tem menor…

RB – Adicionabilidade… 

OC – Adicionabilidade, é. Eu acho que eu quero crer que a resposta inicial do BNDES foi ainda no conteúdo anticíclico, mas acho que já ficou para trás a ideia de campeões nacionais.

RB – Você mencionou a complacência das políticas econômicas nas economias emergentes de um modo geral. Você escreve nos EUA no site do Nouriel Roubini, um ótimo lugar para se monitorar crises. Na sua avaliação, o abandono da rigidez nas políticas está semeando alguma crise para frente ou esse risco ainda não está no radar?

OC – A única ressalva que eu faria no que eu próprio observei nas economias emergentes em geral é o caso da China, porque é fato que a China também foi complacente e todo mundo teve receio do abismo. De certa maneira, a China foi leniente com a ampliação via o seu “shadow banking” do financiamento imobiliário e da emergência de estruturas patrimoniais que hoje a gente sabe que estão fragilizadas. O receio com desaceleração foi tal, que o aparato público na China não fez vistas grossas.

RB – Vistas grossas para o “shadow banking”?

OC – É. Por outro lado, quando se olha o que o governo chinês, tanto o governo anterior como o atual, vem se propondo a fazer, em termos de mudanças estruturais com revisão de todo aparato regulatório que impede a migração plena, a extensão de benefícios previdenciários mais além do grupo restrito que se quer hoje, a perspectiva de poupar o sistema bancário a competir liberalização financeira, ele mostra que o governo chinês está bem antenado com a agenda de reformas estruturais que faz sentido à luz dos seus próprios riscos de armadilha de renda média. Mas também, como eu disse, isso não impediu a China de deixar de ser complacente no lado, como eu disse, de investimentos imobiliários. No caso dos outros…

RB – Nos outros, imagino você estar falando de Brasil, Rússia… 

OC – Brasil, Rússia, Índia e, aí vamos incluir porque não são BRIC’s, mas também são economias emergentes significativas, Turquia e Indonésia. Esses países passaram a pagar um preço… O que mudou de cena foi o cenário de super otimismo prevalecente logo após a crise, algo do tipo… Eu mesmo escrevi com um colega um livro meio que falando dessa hipótese das economias emergentes trocando posição na locomotiva da economia global. Aquele entusiasmo nos primeiros anos dá lugar a um pessimismo, também exagerado, a partir do ano passado, quando, visivelmente, a taxa de crescimento nessas economias declina por razões que a gente estava mencionando: os esquemas utilizados anteriormente já não estavam mais dando resultado, simplesmente aumentar crédito… Ao mesmo tempo, algumas dessas economias, por razões diversas, passam a exibir déficits em contas corrente crescentes. E o que não foi problema durante algum tempo, particularmente por conta do volume de liquidez global, por conta das políticas monetárias não convencionais nos Estados Unidos e depois no Japão e na Inglaterra. Pois bem, quando bastou esse ano a discussão aberta pelo… É uma história também já conhecida, não tem que se alongar aqui… Da possibilidade de começar a redução das compras mensais, não é nem desova do estoque de papéis na carteira do FED… Aí o mercado acordou e o que estava olhando desconfiado em uma ponta do olho para esse declínio na taxa de crescimento dessas economias, aquelas desse grupo, que tinham, ainda por cima, déficit em conta corrente, foram objeto desse ajuste preventivo de portfólios. Configurou uma crise não no sentido de uma crise clássica, mas o movimento de reajuste de portfólio foi intenso o suficiente para colocar na tela, de novo, a honestidade de esses países voltarem, ao mundo as reformas.

RB – Deixa eu só implicar contigo uma coisa. Você disse que o super otimismo original foi substituído por um pessimismo exagerado quando o crescimento de mercados emergentes despencou no ano passado e aí agora, esse ano, eles estão abrindo déficit de conta corrente “boca de jacaré”, não é?

OC – É, eles vinham abrindo… Eu creio que a tendência é diminuir porque, até por causa de desvalorização que aconteceu em todos eles…

RB – Isso ajuda…

OC – Isso ajuda.

RB – Mas a minha dúvida é: você acha que o pessimismo lá atrás foi exagerado, como você disse, ou, na verdade, ele foi um pessimismo que era, apenas, a profecia de que isso ia acontecer?

OC – Ele foi exagerado nos seguintes termos: a pletora de análises acabou a festa dos mercados emergentes, acabou a festa dos BRIC’s, meio que negando, ou esquecendo, que, na verdade, todas essas economias têm um potencial de crescimento, se a lição de casa é feita, que é bem maior do que aquele das economias avançadas.

RB – O problema é esse predicado aí, não é? 

OC – É, se a lição de casa é feita. Esse é o predicado. E aí, tenho a esperança… Eu mesmo escrevi várias coisas chamando o episódio desse verão de um wake up call. Se a gente observar o discurso, ou pelo menos a agenda colocada no sistema financeiro na Índia, a partir da entrada do Raghuram Rajan, isso já é parte do caminho. É um começo do caminho. Isso tem repercutido muito bem. Acho também.

RB – Só para quem não está acompanhando, o que a Índia está fazendo?

OC – A Índia vai abrir concorrência no sistema bancário.

RB – Que é uma vaca sagrada, igual no México é a indústria de petróleo. 

OC – Exatamente.

RB – O que seria equivalente isso no Brasil? 

OC – Eu acho que o equivalente disso é o que se está fazendo com a participação do setor privado na infraestrutura. É isso e uma revisão no conjunto de parâmetros de operação do setor privado, e eu vou dar alguns exemplos. O exemplo óbvio é o da complexidade de pagar tributos nesse Brasil. É impressionante, nós… Uma empresa brasileira gasta, em termos de tempo, quase seis vezes mais que os nossos vizinhos, isso para não comparar com os países da OCDE. Um outro exemplo, que eu gosto sempre de apontar, é o tempo médio necessário para se obter uma licença para construir aqui no Brasil, que é absurdamente maior do que os nossos vizinhos. Não estamos falando aqui de “Ah, isso é coisa de países avançados…” Não, basta comparar com nossos vizinhos, e não é só o Chile, não, os outros também. Ora, construção é um componente essencial do investimento, porque a formação bruta de capital fixo, quando ela é além de botar uma máquina nova, ou comprar um novo “blueprint” de produto, ou outros investimentos, ela envolve ampliação de escala, ela envolve construção. Construção, em qualquer parte do mundo, é um componente importante do investimento da formação bruta de capital fixo. Quando a construção é cara e toma tempo, isso não precisa dizer a nenhum brasileiro, ela chupa, ela desvia, ela reduz o resultado dos recursos disponíveis para as empresas investirem. E nós ainda temos, ainda há no Brasil, regulamentações… Submeter a um crivo, você não consegue nem entender porque elas existem. Elas estão lá porque alguém colocou, em algum tempo atrás, por alguma razão, às vezes, que já deixou de existir e deixou de ser relevante. Então, tem coisas absurdas. O custo de alugar um contêiner no Brasil, só a Rússia que tem batido o Brasil entre os países comparáveis. O Brasil hoje tem custos de manejo de contêiner superiores a todos os vizinhos, sem nenhum exceção.

RB – Ou seja, é o serviço portuário que é caro, não é isso? 

OC – O serviço portuário é. O serviço portuário e há um componente também, e aí refletindo carência de investimentos e regulações que não são necessárias e que só… O custo aduaneiro no Brasil é muito além daquilo que seria compreensível por qualquer norma de segurança. Então tem essa agenda, que não é, digamos assim, midiática, charmosa, mas é hoje um fator negativo sobre a produtividade total de economia, porque na medida em que as empresas, e a economia como um todo, são obrigadas a desviar recursos humanos e materiais para executar essas tarefas que não agregam valor, isso retira a produtividade da economia. Enquanto persegue uma agenda de visitar isso, assim como os investimentos físicos em infraestrutura, essa pode ser também uma outra fonte, também extraordinária, de ganhos generalizados de produtividade. Tem o componente de hardware e tem o componente de software. Um outro exemplo do que seria equivalente às reformas estruturais que os outros países estão fazendo, é passar um crivo nos componentes da despesa pública. Um dos programas anteriores seus teve uma maravilhosa entrevista com o Marcos (Marcos Lisboa) e com a Zeina (Zeina Latif), em que eles discutiram o trabalho deles, que é uma questão relevante que trazem em cena, que talvez parte da rigidez do gasto público brasileiro não seja pura e simplesmente ineficiência, mas a expressão e manifestação de direitos adquiridos, de meia entradas que foram acumulando com o tempo e que depois são difíceis de tirar. Eu não vou entrar aqui em algum tipo de estimativa, que é um ou outro, o que é predominante, provavelmente é uma combinação dos dois. Tem lá as meias entradas do Marcos e da Zeina, mas tem também ineficiência, tem também a margem que se abre para malversação de recursos, certo? Uma revisão da natureza do gasto público, incluindo aí uma avaliação do impacto desses gastos, inclusive a quem beneficia, qual o impacto redistributivo, qual o impacto sobre a pobreza, qual o impacto sistêmico em termos de funcionalidade, em termos de adicionalidade e impacto em termos de movimento, pode, primeiro, abrir uma boa discussão e rever alguns desses gastos que não se justificariam por esses critérios. Ao mesmo tempo, também, aceitando-se que há um componente de ineficiência, hoje, a esperança do Banco Mundial é recorde no mundo inteiro, isso é mostrado, claro, como quanto mais a gente aprofundar os mecanismos de prestabilidade de contas, transparência e instituições e abertura de espaços de participação mais ampla, não se limitar apenas a grandes despesas, mas, inclusive, à suprimentos, aos gastos públicos de toda a natureza, há, certamente, margem de ganho também e deficiência aí. Se por um lado, digamos assim, cortando meias entradas de um lado e cortando desperdício do outro, abre-se um espaço para redução até de carga tributária e, portando, funcionar como reforma estrutural propícia ao crescimento.

RB – Vamos falar de Brasil e China. O senhor escreveu num artigo recente que para a China dar certo, a China tem que ser mais Brasil, e pro Brasil dar certo, ele tem que ser mais como a China. Está certo isso?

OC – Em grande medida sim, porque os chineses estão prometendo fazer um conjunto de reformar que aprofunda o capitalismo lá, enquanto que eles também vão precisar desenvolver um aparato de proteção social, um sistema de proteção social, de defesa da parte mais de baixo da pirâmide que eles não tem.

RB – Para estabilidade do regime.

OC – É. Se a China crescesse 7%, temo como componente maior o consumo doméstico, isso é mais socialmente estável do que crescer 10, mas com base em salário achatado, não é? Pois bem, então, nesse sentido, paradoxalmente… E eu não sou o criador da expressão, mas foi em um seminário no IBRE, em conjunto com think tank chinês, que assisti há alguns dias atrás, e eu citei a fonte, “bem que a China podia ensinar um pouquinho de capitalismo para o Brasil, e o Brasil podia ensinar um pouquinho de políticas sociais para a China”.

Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.