Novo Mercado: blue chips resistem à adesão, seja por falta de vontade ou incentivo

Apesar do segmento ser atrativo para novas empresas, as mais antigas ainda resistem ao nível mais alto de governança da bolsa

Equipe InfoMoney

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SÃO PAULO – Nunca se falou tanto em governança corporativa como nos últimos anos. Com o crescimento do mercado de ações, cada vez mais empresas têm procurado fazer sua estreia já no Novo Mercado da BM&F Bovespa, buscando maior credibilidade e valor a seus ativos.

Para ilustrar tamanho interesse, é só observar os dados sobre número de empresas listadas no NM desde sua criação, em 2000. Segundo dados da BM&F Bovespa, somente em 2002 a CCR aderiu à legislação do Novo Mercado, marcando a estreia de empresas no segmento. Oito anos mais tarde, o nível já registra 105 empresas, sendo que 15 delas entraram no segmento em 2009.

Apesar do claro crescimento da adesão ao nível mais alto de governança corporativa da bolsa, muitas companhias – em especial as mais antigas e de grande porte – ainda encontram dificuldades para se adequar a regras mais exigentes.

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Preferenciais Vs Ordinárias
Para Luiz Rolla, presidente do conselho do Ibri (Instituto Brasileiro de Relações com Investidores), o problema principal dessas empresas são as características específicas exigidas pelo mercado brasileiro.

“Assuntos específicos impedem algumas empresas, principalmente as de grande porte, de atenderem a algumas das regras. É por isso que algumas blue chips ainda não estão no Novo Mercado, nos níveis mais altos, porque depende das características de cada uma”, comenta.

Rolla exemplifica falando que nos segmentos de alta governança corporativa de outros países não existe a prática da empresa ter somente ações ordinárias, ou seja, ações com direito a voto. 

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“Essa dicotomia [ações preferenciais e ordinárias] é irrelevante no mercado internacional, uma vez que os investidores estão focados muito mais nas ações com direito a votos, enquanto as ações preferenciais têm um papel muito menor do que têm aqui no Brasil”, argumenta.

Porém, ele explica que aqui no Brasil isso se disseminou de tal maneira que acabou se tornando um empecilho para algumas empresas conseguirem se adaptar a essa regra e aderir ao NM da BM&F Bovespa.

“Então, as grandes empresas que são comercializadas no mercado internacional, atendem às práticas que são exigidas no Novo Mercado de lá e não no brasileiro”, conclui.

Para Alexandre di Miceli, coordenador executivo do CEG (Centro de Estudos em Governança Corporativa) da Fipecafi, a exigência de negociações apenas com ONs também é vista como a principal dificuldade encontrada pelas blue chips.

“A conversão faz com que os controladores percam seu poder de decisão, ao reduzir o percentual de sua participação na empresa”, fala.

Pesando os prós e os contras
Segundo Miceli, este ponto pesa negativamente quando as empresas colocam na balança os prós e contras da adesão ao mais alto nível de governança corporativa. “Quando elas avaliam sua adesão ao Novo Mercado, elas não veem os benefícios compensando os custos e por isso acabam não entrando”, comenta.

Entre os principais pontos a favor da aderência, Miceli destaca o maior valor agregado à empresa. “O principal benefício que uma empresa espera ter ao aderir ao NM é o maior valor de mercado, com melhor apreciação e múltiplos maiores”, explica.

Porém, neste aspecto, Miceli explica que justamente por serem empresas grandes e tradicionais, suas ações já estão sendo precificadas pelo mercado independente de qual segmento ela participa. “Muitos investidores não ligam se a empresa está ou não no Novo Mercado, eles só olham liquidez, sem olhar a governança”, alerta.

Além da exigência da conversão de PNs em ONs, Miceli aponta também outros tópicos não vistos com bons olhos pelas empresas, como a obrigatoriedade da Câmara de Arbitragem para julgar as questões pertinentes ao mercado e o tag along de 100%.

Outra exigência que gera controvérsias é a questão do percentual mínimo de 20% de conselheiros independentes, sendo que a própria BM&F Bovespa estuda aumentar a fatia para 30%. “Muitas delas têm uma gestão tradicional, onde o Conselho é formado por pessoas de confiança dos dirigentes, uma cultura que é difícil mudar”, comenta.

Falta vontade?
Mesmo assim, Adriane Almeida, coordenadora do Centro de Conhecimento do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa), acredita que um pouco é falta de boa vontade. “Algumas empresas já oferecem a seus acionistas direitos do Novo Mercado sem precisarem estar listadas nele”.

Ela comenta que alguns bancos já oferecem tag along de 100% a seus acionistas e também possuem mais de 20% de conselheiros independentes, estando ainda no Nível 1. “A conversão de PNs em ONs não é impedimento para quem quer oferecer algo a mais a seus acionistas”, afirma. 

Também vale pressionar
Para Alexandre di Miceli, a única maneira de fazer com que estas companhias se adaptem às práticas do NM seria que a balança pesasse mais para o lado positivo. “Seria preciso uma mudança de postura por parte dos investidores e algumas ações do próprio governo, como maiores benefícios às empresas que estão listadas no Novo Mercado”, explicita.

Miceli exemplifica esses “benefícios” falando de uma situação em que o BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social) emprestaria dinheiro às empresas de segmentos mais avançados com custos mais baixos, movimento que poderia incentivar a que ainda não aderiram às melhores práticas a adentrar no NM.

O coordenador do CEG comenta que, no caso dos investidores, são os institucionais os principais players de pressão, uma vez que são eles que acompanham o dia-a-dia da empresa, participam no conselho, votam e discutem as políticas adotadas pelas companhias em que investem.

“Eles são os investidores de longo prazo, enquanto as pessoas físicas têm um distanciamento com relação à sua postura de acionistas por buscarem investimentos de curto prazo e não se sentirem sócios do negócio”, comenta.

Atratividade para as novas
Enquanto as empresas que já estão listadas encontram dificuldades para aderir a níveis mais altos de gestão corporativa, Adriane Almeida, do IBGC, afirma que para as novatas o NM é sim um diferencial importante.

“Para uma empresa nova é muito importante o Novo Mercado porque é como se ela viesse com pacote mínimo de garantias de boa governança”, comenta, destacando a confiança como o principal atrativo do segmento para essas empresas.

Ela explica que, por não terem uma gestão amplamente conhecida, muitas dessas empresas que estão abrindo capital agora veem o NM como um meio de passar aos investidores confiabilidade e segurança.

“Uma empresa nova quando entra no mercado não tem histórico. Ela pode ser conhecida pelo marketing, mas ninguém conhece sua gestão, se é confiável, se faz o que promete”, comenta.

Novo Mercado = preços maiores?
Com um diferencial de qualidade e confiabilidade, essas companhias acreditam que os investidores passarão a olhar com bons olhos seu case de investimento e, com isso, pagarão um prêmio pelas boas práticas.

“Isso também reflete no preço: o investidor tende a confiar mais nas ações da empresa, então ele tende a pagar um pouco mais pelos direitos adicionais”, fala Adriane.

Ela acrescenta que “o Novo Mercado é importante porque garante aos minoritários padrões mínimos de direitos societários, de transparência e de estrutura de governança”. Outro fator considerado atrativo para as empresas que aderem ao Novo Mercado é o marketing corporativo.

Segundo Adriane, com um selo e um contrato que ratificam a adesão às boas práticas de governança, há um ganho institucional por parte dessas empresas. “Ele reflete em ganhos de imagens perante funcionários, clientes, comunidade, governo, os stakeholders”, completa.

Atenção: nem todos são transparentes
Na visão de Miceli, do CEG da Fipecafi, o “selo” usado pelas companhias que aderem ao segmento não é sinônimo de qualidade e reais práticas de boa gestão. Ele cita o caso da incorporação da Tenda pela Gafisa em 2008.

Na ocasião, o mercado repercutiu negativamente a falta de preocupação da Tenda (que era listada no NM) com o direito de tag along – mecanismo de proteção a acionistas minoritários de uma companhia que garante a eles o direito de deixarem uma sociedade, caso o controle seja vendido a outro investidor.